quarta-feira, 9 de setembro de 2015


Francisco Luís Fontinha - Setembro/2015

Vampiros da noite escura



(desenho de Francisco Luís Fontinha – Setembro/2015)
 
 
Esta cadeira onde te recordo
Acorrenta-me aos sonhos da noite escura,
Sobre a mesa-de-cabeceira… o livro que emagrece o teu corpo nas lâmpadas incandescentes do desejo,
Minto-te, meu amor,
Como te minto quando digo que sou filho da noite…
 
Não, não meu amor,
 
Não,
Não existe noite
E tão pouco sou filho dela,
 
Sabes disso meu querido,
 
Sabes disso…
Que amanhã recordar-te-ei como um pedestal em movimento,
Uma orquestra vagueando sobre o balcão de um bar…
 
Sabes disso meu querido,
 
Algumas pedras e gelo…
E um beijo nas velas de um veleiro,
Esperam que esta cadeira se sente…
Que esta cadeira se sente no meu colo,
E me beije…
Como beijam os vampiros da noite escura.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 9 de Setembro de 2015
 


terça-feira, 8 de setembro de 2015

Uma equação qualquer sem tempo para amar


Regressa a noite,

Depois… depois acorda a saudade embrulhada num lençol de linho,

As fotografias suspensas na parede da sala…

Cerram as janelas,

Desligam os interruptores do silêncio,

Brincam as vozes dos tristes alicerces que sustentam o meu corpo,

Pareço uma bailarina em busca dos holofotes do desejo,

Entre círculos e espelhados momentos angulares,

Eu…

Eu… eu me perco nos teus braços,

Deixei de desenhar sorrisos na alvorada,

Deixei de escrever palavras nos muros invisíveis da minha aldeia,

 

Deixei…

Deixei de pertencer ao limo envenenado na madrugada,

Tenho uma bandeira na mão,

Tenho na outra mão… nada,

Uma pedra,

Uma enxada…

Calcinada

Pelos ventos trigonométricos do amor,

 

Regressa a noite

E não tenho tempo para embriagar sonhos,

Não me importo de não ter sonhos,

Nome,

Cidade para habitar…

Regressa

E traz com ela outra noite,

Outro momento angular que me sufoca,

E sinto na minha algibeira o mar

Encalhado nos rochedos dos teus seios…

Pego na equação das tuas coxas

E construo um foguetão…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 8 de Setembro de 2015

Francisco Luís Fontinha - Setembro/2015

A clepsidra do desejo


Sabíamos que o tempo se masturbava na clepsidra do desejo,

Sentávamo-nos num ferrugento colchão de pregos em aço,

Pegava no teu corpo e desenhava pequenos círculos,

Que rodopiavam à volta do luar,

Das frestas do gesso embriagado, um sorriso, o nosso, o teu e o meu,

Como dois pássaros poisados na escuridão,

Como dois corpos em combustão…

A velha pensão gemia como gemiam os teus lábios olhando a ruela,

Na cidade mergulhávamos como mergulham as gaivotas,

E as gaivotas

Entranhavam-se nos teus seios,

Sabíamos que seria o último orgasmo da tarde,

Sabíamos que seria o último desejo do corpo,

E no entanto…

Estavas lá, sobre mim, parecendo o inferno voando em direcção à janela da noite,

Sabíamos,

Sabíamos que o tempo se masturbava na clepsidra do desejo,

Sabíamos que os poemas se escreviam nas tuas coxas,

E mesmo assim, querias mais, e além, e depois, e ontem, e amanhã…

Diluídos nos fluidos do sémen,

Nós dois órfãos da madrugada,

Dois esqueletos em busca do prazer desenhado na idade,

Víamo-nos no espelho da saudade…

Sem percebermos o significado da paixão.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 8 de Setembro de 2015

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

O calcinado olhar

“Fodias-me” com todas as letras do alfabeto, espetavas-mas no meu corpo calcinado pela madrugada desalinhada, imprimias no meu olhar a poesia emagrecida do silêncio, e nunca ouvi de ti
- Amo-te,
E nunca ouvi de ti um único lamento, uma sílaba prisioneira nos meus tristes lábios, uma grade imaginária pertencendo ao terceiro esquerdo, amo-te,
- Nunca a ouvi de ti, pertencias aos míseros esqueletos da solidão, às flores fotografadas numa noite imaginária, algures em cinco de Setembro, e sabia que o dia nasceria contigo nos meus braços, não, não diria que…
- Amo-te,
Porque não, meu amor, se junto a nós habita a escuridão dos olhos pintados numa parede envelhecida pelo tempo, pelos insectos, pela paixão de
- “Fodias-me”,
Regressava o circo, embrulhava-me nos palhaços como uma criança se embrulhava no esqueleto cobertor, tinha frio, tinha fome e tinha a saudade duma terra esquecida sobre uma secretária, “fodias-me”
- Na noite, “foder ou não foder ou ser fodido”, tanto faz, neste mundo, neste Universo em pedaços de suicídio, escondia o cortinado do prazer, desenhava orgasmos nos teus seios
- Sem o saber, queria ser o paquete que me trouxe de Luanda, queria ser o capim em soluços derrubado pela fúria do sonho, amo-te, sem o saberes,
“Fodias-me” na Ponte para Eternidade, “fodias-me” enquanto eu lia Fernão Capelo Gaivota, sem nome, sem idade, sem casa ou paixão para abraçar, e no entanto, “fodias-me” com todas as letras do alfabeto, espetavas-mas no meu corpo calcinado pela madrugada desalinhada, imprimias no meu olhar a poesia emagrecida do silêncio, e nunca ouvi de ti, o sono, novamente o sono, o sonho, novamente o sonho…e o esquecimento, novamente o esquecimento…
 
(………………)

Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 7 de Setembro de 2015