quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Ruelas e calçadas


Come-me noite vadia
dos silêncios torturados,
come-me mar doentio
dos abraços forçados,
das ribeiras apaixonadas,
come-me...
noite vadia
das ruelas e calçadas,
filho da cidade em chamas,
come-me sanzala recheada de sombras,
aranhas,
e...
come-me,
come-me como se eu fosse um pedaço de erva seca
voando na seara do adeus,
come-me,
come-me... feiticeiro das nocturnas avenidas,
dos bares embriagados de meninas...
come-me,
come-me... luar desenhado na alvorada,
come-me noite vadia
dos silêncios torturados,
das tristes palavras em agonia,
come-me... rochedo de vento dançando no teu nome.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 24 de Dezembro de 2014

Tardes de Dezembro


Tínhamos no olhar o silêncio da noite
caminhávamos desordenadamente como dois pontos perdidos no espaço
procurávamos o invisível cansaço
que só as tardes de Dezembro conseguem alimentar
e no entanto
pegando na tua mão...
não havia luar
nem palavras na ardósia dos teus cabelos...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 24 de Dezembro de 2014

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

O que sinto...


O que me diz a morte
quando te entranhas em mim
e me alimentas com o teu calor...!

São as horas em cio
dos teus medos, das tuas recordações,
são as palavras em habitáculos de silêncio...
o que me diz a morte
quando te entranhas em mim
e me alimentas com o teu calor...!

O que penso,
sinto,
aquilo que não quero pensar...
nos meus sonhos em labaredas de nylon.

Prontas para amar...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 23 de Dezembro de 2014

Os finais de tarde junto ao Tejo


(recordações de 1987/1988)


Deixei de te ouvir,
cessaram os lamentos dos teus lábios
que brincavam nos finais de tarde junto ao Tejo,
desenhávamos barcos no sorriso do pôr-do-sol...
e havia sempre uma bandeira poisada nos nossos ombros de granito,
deixei de te ouvir,
encostei a cabeça ao teu peito...
e juro... e juro que desde então oiço todas as manhãs o mar dentro de mim.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 23 de Dezembro de 2014

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Tâmaras


Caminhas sobre as tâmaras apaixonadas do deserto,
inventas-me num sorriso de areia húmida,
alicerças-te ao meu corpo quando o vento invade os teus seios...
e mesmo assim, para ti, sou apenas um desanimado,
um louco passeando no invisível,
o esqueleto que todos fotografam... e ninguém observa a fotografia que há em mim,
a desfocada imagem, sem olhar, com medo da paixão imensurável,
e dos peixes comestíveis,
caminhas sobre os meus ossos pérfidos,
sem inscrições,
apenas alguns algarismos vagueando nos meus lábios,
sem inscrições...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 22 de Dezembro de 2014

Lágrima de fogo

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Um tentáculo de gelo beija os teus lábios
desce do teu olhar a lágrima de fogo
que vai incendiar o meu peito...
há vozes desorganizadas em revolta
há crianças que esperam o regresso do circo
e a cidade se transforma num manicómio com paredes de vidro,

O sino da Igreja grita
chora...
o vento despede-se dos cabelos brancos em desalinho
são horas da cidade adormecer
correr os cortinados do destino...
e talvez amanhã, alguém... consiga destruir o manicómio com paredes de vidro.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 22 de Dezembro de 2014

domingo, 21 de dezembro de 2014

Porta de entrada


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Esta porta
morta
infeliz aquele que deseja entrar
e a sombra o acorrenta
aos velhos telhados de cartão
esta porta
sem acesso ao coração
em vidro
de pedra
o xisto desfeito em lágrimas de papel...
e há sempre um corpo esperando pelo regresso da tempestade
sem vaidade,
sem... sem amizade
esta porta encerrada para obras de restauro
lapidações em trinta e seis prestações...
a vida se perde neste labirinto de palavras
e madeira apodrecida
esta porta
sem entrada para o casebre da mendicidade
e elas em guerra por um punhado de areia
ou... ou por um poema em decomposição
os braços achatados
e sobre os ombros... a fugitivo da madrugada...
de cidade em cidade... de corpo em corpo... de nada em nada.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 21 de Dezembro de 2014