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Porque só tenho duas...
Subiam, desciam, e vias-me
E vias-me partir de barco debaixo do braço, chapéu
na cabeça, e com as sandálias na outra mão por causa da areia, não
a reia dos teus lábios, mas a areia fina e fútil da praia, pousava
as sandálias, despia-me e colocava a roupa sobre elas, estava nu, e
quando tinha o barco em posição para a partida, entrava,
sentava-me, sorria ao olhar os restos mortais que tinham sobejado de
mim
As sandálias, os calções, e um ou outro parafuso
que à partida eu achava que não seriam necessários, e se o fossem,
paciência, depois de estar em alto mar, nada a fazer, nada, a não
ser, mergulhar profundamente nos oleados maciços das marés
aldrabadas pela voz de um solitário, coitadinho, coitados
Dos satélites vestidos de mulher às voltas de um
planeta a que toda a gente apelidava de árvore fantasma, esqueleto
vagabundo, sentinela sonâmbulo das noite embriagadas com óleo
vegetal e sardinhas de conserva, Vou-me a ela
Coitadinho dos coitados plásticos da marmita onde
os restos de comida serviam para alimentar um regimento inteiro,
muitos, entre a Calçada e os Jardins junto ao rio, os automóveis
estacionavam-se e abriam-se as portas de porcelana das bonecas das
meninas
Vou-me a ela
A quem o colhe, nem mais, tenho pena das tuas
sílabas suspensas nos teus lábios de areia branca, tenho pena das
malditas luzes e das rodas-dentas esquecidas na mesinha-de-cabeceira,
e à tardinha, dizia-te simplesmente que as meninas eram falsas,
nunca existiram, e tal como as bonecas de porcelana e os automóveis
de cerâmica, e tal como as meninas e os meninos da Calçada
Vou-me
Adormeciam como os fósforos cansados dos finais de
tarde, quando entravas em casa de barco debaixo do braço e dizias-me
Olá amor, regressei,
E eu sabia que tu não regressavas, e eu sabia que
continuavas em alto mar à procuras das coisas impossíveis,
Olá amor, regressei,
Atiravas os chinelos para debaixo do sofá, poisavas
o barco em cima da mesinha da sala de visitas, despias a camisola e
os calções, e mergulhavas nos lençóis de seda da nossa montanha
de Primaveras nocturnas que o mar desenhava nas estrelas dos meus
seios de papel mata-borrão, e eu via a caneta de tinta permanente em
lágrimas azul-cansado que nas moribundas nuvens espetavam no peito
nu da melancolia noite,
Olá amor, regressei
Às sandálias, aos calções, e um ou outro
parafuso que à partida eu achava que não seriam necessários, e se
o fossem, paciência, depois de estar em alto mar, nada a fazer,
nada, a não ser, mergulhar profundamente nos oleados maciços das
marés aldrabadas pela voz de um solitário, coitadinho, coitados
Amor
Olá regressei,
E eu sabia que tu não regressavas.
(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó