francisco luís fontinha
Pego no teu cabelo
Sonâmbulo acordar da
manhã
Pego no teu cabelo e
lanço-o ao vento
Como se fosse uma semente
Ou um pedaço do meu
pensamento
Como se fosse um corpo
que não sente
Indolor dentro deste
pequeno cubo de silêncio
Pego no teu cabelo e lanço-o
ao vento
Primeira lágrima da manhã
Que me mente
E me diz que não habita o
sofrimento
Nos teus olhos de mar
Neste velho jardim com
sabor a mágoa
Pego no teu cabelo
Pedaço de vinho
Neste cálice doirado
Pego no teu cabelo
abençoado
Que voa sobre o luar
Sem perceber que na minha
mão
Brinca o Outono
Pego no teu cabelo
Sonâmbulo acordar da manhã
Janela virada para o mar
Quando as algas são as
Princesas da preia-mar
Que no teu cabelo eram
crianças… crianças de brincar.
24/09/2023
Amo-te
Cabeça dura
Planície alentejana
Figura
Estátua granítica
Como o teu coração
Em tristes grãos de pedra
Montanha em despedida,
Amo-te
Cabeça dura
Noite perdida,
Amo-te
Invisível silêncio
Quando se ergue a manhã
em teus olhos de mar…
E uma amêndoa poisa
docemente nos teus lábios,
E dos teus lábios… acorda
o luar,
Amo-te
Cabeça dura
Planície alentejana
Montanha
Noite perdida
Na noite dos embriões de
papel
Em teus lábios de mel
Do mel da boca fugida…
Alijó, 19/08/2023
Francisco Luís Fontinha
(desenho de Francisco
Luís Fontinha)
Nos teus olhos de mar
Nascem as púrpuras manhãs
de incenso,
Dos olhos de mar
Acordam as madrugadas
E adormecem
Nos teus olhos de mar
As manhãs cansadas,
Aos teus olhos de mar
Regressam as gaivotas em
papel
E as primeiras palavras
do amanhecer,
Nos teus olhos de mar
Esconde-se a paixão,
O beijo…
E o desejo de beijar os
teus lábios de mel.
17/08/2023
Francisco Luís Fontinha
Perco-me neste labirinto
Procurando a sombra da
tua mão
Na tua mão que sinto
Que sinto a tua mão
Perco-me dentro deste
livro de poesia
Procuro neste livro os
teus olhos de mar
Procuro neste livro o
sorriso do dia
E as lágrimas do luar
Procuro neste labirinto
de insónia adormecer
As primeiras palavras da
madrugada
E sem querer
E sem o desejar
Procuro neste labirinto o
teu rosto de cansada…
Quando este labirinto é
os teus olhos de mar.
Alijó, 15/08/2023
Francisco Luís Fontinha
Esqueço os teus olhos de
mar
Em mar teus lábios de mel
Esqueço os teus olhos em
luar
Do luar que assombra este
papel
Esqueço a tua boca e o
teu cabelo de vento
Esqueço o domingo
inventando
Espadas no meu pensamento
Do lamento esquecer os
teus olhos que fui sonhando
Esqueço que este poema
não te pertence
Que este poema morreu
junto ao rio
Esqueço a força que me
vence
Quando a noite se esconde
na madrugada
Esqueço que este navio
É uma lágrima assombrada.
13/08/2023
Francisco
(desenho de Francisco
Luís Fontinha)
Escondo-me da cidade
Desta cidade invisível
Que me assassina ao acordar
Escondo-me da cidade
Nesta cidade
Quando aparece a manhã no
espelho da insónia.
Levanto-me
E escondo-me nesta cidade
Nesta cidade de enganos
Nos enganos de cidade.
Escondo-me da cidade
Dentro da máscara da
cidade
Escondo-me do rio
Desta cidade
Neste gueto
De cidade
Escondo-me da cidade
Na cidade
Enquanto esta cidade…
Arde no meu peito.
13/08/2023
Francisco
(desenho de Francisco Luís
Fontinha)
Aos olhos da lua,
Sou.
Sou qualquer coisa comestível
Que apenas a noite,
E só a noite,
Consegue mastigar.
Sou
Aos olhos da lua
Uma pequena lágrima de
sono,
E abatato-me neste
silêncio
E suicido-me nos teus
lábios.
Aos olhos da lua
Sou.
Sou lágrima em flor,
Sou poeta,
Sou pastor.
Aos olhos da lua
Sou um miserável,
Poeta miserável,
Poeta…
O morto poeta
Quando as mãos da poesia,
Lentamente,
Masturbam a noite.
Aos olhos da lua,
Sou.
Sou.
Sou o quê, aos olhos da
lua?
Se a lua não tem olhos
E eu,
E eu não sou nada.
Aos olhos da lua,
Sou.
Sou canção que se abraça
ao rio,
Sou o poema que brota do mar,
Sou a fome,
O fastio,
Aos olhos da lua,
Sou.
Sou trombone na
filarmónica,
Sou equação nas mãos
dele,
Aos olhos da lua,
Sou.
Aos olhos da lua sou
gaveta de armário,
Papel higiénico…
Aos olhos da lua,
Sou…
13/08/2023
Francisco
(desenho de Francisco
Luís Fontinha)
Madrugada sem destino
Madrugada das almas
aprisionadas
Madrugada do pobre menino
Menino das cidades
amordaçadas
Mestre canónico do
silêncio ardor
Que nesta mão se revolta
Que assassina uma flor
E tudo aquilo que está à
sua volta
Madrugada sem destino
Em teu doce olhar
Madrugada deste pobre
menino
Do menino sem lar
Madruga em teu olhar
O mar.
12/08/2023
Francisco