domingo, 7 de outubro de 2018

365 de cabeça perdida


Morro.

Sinto o silêncio do vento alicerçado aos meus calcanhares,

Preciso de voar nos teus olhos embriagados pela noite,

Mas, não o faço; alimento-me dos teus lábios lunares.

Morro.

O caixão embebido em pura lã virgem,

As ovelhas silenciadas nas planícies dos teus seios,

A vertigem do pensamento, completamente desalinhado, ferido…

Morro.

365 de cabeça perdida,

Soltam-se os parafusos dos alicerces da minha morada,

E lá longe, a montanha da minha última namorada,

Sinto-a na sombra da velha casa abandonada,

No radio oiço os palhaços vestidos de negro,

E uma janela perdida em lágrimas,

Completamente, só.

Morro.

A paixão são pedaços de vidro pincelados de orvalho,

E hoje, e amanhã, o cansaço dos livros,

O papel queimado,

As lágrimas do desejo quando a fogueira se senta na escuridão,

Louco.

Morro.

E quem ficará com o meu coração?

Um sem-abrigo?

Um lunático cobertor envelhecido?

Morro.

As estátuas sob o tampo invisível de uma pindérica secretária em madeira ceruminosa,

E um barco morre no Tejo.

Também, eu, como ele;

Morro.

Lâmpadas de néon acompanham o meu pobre caixão, até nisso não tive sorte…

Quatro tábuas, frágeis, cuidado,

Com o tempo das armaduras de ferro,

Quero a noite só para mim,

Como os amigos, alguns bons, outros, fingidos, filhos da puta…

E eu morro.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 06/10/2018

domingo, 16 de setembro de 2018

O louco


É noite, meu amor!

Sinto os teus braços entrelaçados no meu peito,

Um rochedo de saudade fundeado em mim,

Onde o peso da tristeza voa sobre o meu quarto abandonado pelas flores,

Sofrimento, a dor da fórmula matemática sem resolução,

Como a morte,

Ao final da tarde,

Os insectos poisados no teu corpo espelhado pelo nascer do sol…

É noite, meu amor!

Todos os dias são dias de insónia,

Tortura,

Desespero sombrio das cavernas habitadas por húmidas ardósias de espuma,

Desço o rio,

Mergulho nos teus lábios de poema adormecido,

O louco,

Adormecido,

É noite, meu amor!

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 16/09/2018

domingo, 9 de setembro de 2018

As palavras do amor


Das janelas não se viam as transeuntes folhas caducas,

A rua imunda, suja, recheada de sombras invisíveis,

E um corpo putrefacto mergulha na minha mão…

Que faço eu com ele?

Alimento-o,

Enterro-o…

Ou escrevo nele a minha raiva.

As espadas da saudade, cravadas no peito húmido do esqueleto de vidro,

As pedras perfurantes alicerçadas nos lábios do abismo,

Sinto-me tudo isto, ao adormecer…

Sem perceber as palavras do amor.

 

 

Francisco Luís Fontinha

09-09-2018