Voávamos dentro de uma
colmeia de vidro
Acorrentada ao silêncio;
Chovia torrencialmente e,
todas as abelhas
Com medo da morte,
Liam poemas floridos.
Dançavam as palavras
Nas mãos da noite quase a
acordar,
Como se fossem almas penadas,
Como se fossem almas de amar.
Voávamos do olhar menino,
Triste e, sem sorte.
Algum dia tinham que ler “os
poemas perdidos”
Como quem lê a oração de
mais um dia,
Ao deitar.
Tínhamos nos braços, a
solidão,
Tínhamos o pão em
migalhas,
Como um cadáver sem nome,
Que grita,
Que chora,
Que tem fome.
Tínhamos uma Nação,
Tínhamos um cão,
Um pássaro em combustão,
E tínhamos na mão,
Uma velha colmeia de
vidro.
Voávamos e tínhamos…
As pedras de matar,
E tínhamos as árvores de
morrer,
Ou de brincar.
Tínhamos vontade de
avançar,
Correr, correr atá ao
mar.
(Voávamos dentro de uma
colmeia de vidro
Acorrentada ao silêncio;
Chovia torrencialmente e,
todas as abelhas
Com medo da morte,
Liam poemas floridos.)
Poemas de matar,
Espingardas de escrever,
Poemas de amar,
Palavras de morrer.
Tínhamos na algibeira
As telhas de luz Luar,
Quando dançavam dentro de
uma bandeira,
Tínhamos fome, tínhamos
bombas e muitas palavras para disparar.
Morávamos numa velha
aldeia,
Poemas cansados,
Poemas em suicídio,
Poemas de nada,
Poemas viciados,
Ou poemas de uma Nação,
Que grita.
Que tem fome.
Que não tem pão.
Dentro de uma colmeia de
vidro,
Dois braços,
Dois corpos mutilados
pela inflação…
E escrevíamos
Cartas à Nação.
Dentro desta colmeia de
vidro,
Temos um corpo envenenado
Pelas canseiras da
madrugada,
Tínhamos vinho,
Tínhamos uma enxada;
Tínhamos tudo e, não tínhamos
nada.
Dentro desta colmeia de
vidro,
O Natal é em Julho
destino,
A Páscoa? A Páscoa
celebra-se em Setembro,
Quando as flores dormem,
Quando as flores vivem,
Dentro desta colmeia de
vidro…
Acreditando que amanhã,
Pela manhã,
Do teu corpo nasçam
palavras a sério,
Palavras com lábios de
abelha,
Palavras maradas,
Palavras desgovernadas
sem perceberem,
Sem entenderem,
Que dentro de uma colmeia
de vidro,
O silêncio é tudo;
E o poema é de borla;
como todas as flores do teu jardim.
Alijó, 29/01/2022
Francisco Luís Fontinha