Meu amor, hoje pertenço-te, absorves-me, alimentas-te das minhas palavras
esquecidas num qualquer engate, é tarde, meu amor, a noite rebenta no meu
peito, sinto o peso das estrelas nas minhas pálpebras inacabadas, o pintor
adormeceu sobre o seu próprio corpo, é inerte, invisível na paleta das cores
diluídas na alma, a morte, meu querido, o fantasma clandestino do abismo
descendo a Calçada, e ao fundo
- O rio reflectido nos teus lábios, meu amor, a vaidade da folha de papel
esquecida sobre a pobre secretária de pinho, o caruncho, a ferrugem das
ardósias iluminando a noite,
E ao fundo, os barcos adolescentes brincando na sonolência da inocência,
- Tenho medo, meu amor, alicerças-te ao meu cansaço, o Francisco partiu
hoje para o desconhecido, sabes, meu amor, gostava dele, amava-o… e amo-o, e
tenho medo, meu amor, dos pássaros que voam, das flores que choram, das abelhas
que incendeiam a manhã dos silêncios de Oiro, sabes, meu amor, tenho medo
- De ti, de mim, de estar vivo inventando a vida em quadriculados poemas,
mais nada, meu amor, mais nada, apenas o medo, a alegria de amar-te, sem saber
que o amor habita neste caixão de enxofre,
Oxalá
- As portas, os tristes alicates da escuridão vestidos de mendicidade, a
tua boca na minha, o beijo, a orgia matinal da poesia, gemes
Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii,
E nada quer de mim o que tu desejas…
Francisco Luís
Fontinha – Alijó