segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Corpo sentido


O meu corpo sente

Os teus lábios carnívoros

Desenhando marés de medo

E palavras de silêncio,

O meu corpo sente

As tuas mãos de xisto

Transportando um rio no sorriso

Antes de terminar o dia,

O meu corpo sente

A noite menina

Deitada na praia…

Deitada na ria…

O meu corpo sente

A despedida

De um relógio de bolso…

Quando a cidade adormece,

O meu corpo sente

E estremece

Quando o teu cabelo aprisiona o luar…

E nada pertence à saudade…

O meu corpo sente

As sílabas do poema

Quando a madrugada se despede da cama…

E o meu corpo,

Ausente

 

Sente.

 

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 1 de Agosto de 2016

sábado, 30 de julho de 2016

As pedras de sofrer


As pedras

Onde nos sentamos e descansamos

Onde alicerçamos as mãos

E escrevamos

As palavras de sofrer…

 

As pedras

Do xisto madrugar

Que o príncipe depois de se deitar

Sonha com as pedras de amar,

 

As pedras

De ler…

 

As pedras de morrer

Sufocadas pelos beijos

As pedras

Meu amor

Dançando desejos

Nas janelas de acordar,

 

As pedras

De fumar

Nas searas cansadas pelos vento…

Não sentindo o mar

Nas pedras do pensamento,

 

(As pedras

Onde nos sentamos e descansamos

Onde alicerçamos as mãos

E escrevamos

As palavras de sofrer…)

 

Das pedras do saber…

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 30 de Julho de 2016

quarta-feira, 27 de julho de 2016

A noite sem rumo a noite sem vela


O vento a leva

O traz o vento depois da geada

Nos lábios da cegonha

As tuas palavras ofendidas

Nos miseráveis finais de tarde

Junto ao rio…

O silêncio do mar

Encastrado nos teus seios de espuma

O branco da tela

Sobre os lençóis da despedida

O vento a leva

O traz o vento…

Os socalcos do douro dançando numa velha esplanada…

E dos teus braços

As minhas mãos ensanguentadas

Putrefactas nos jazigos de pedra

O vento

Meu amor

O traz

A leva

Até ao pôr-do-sol

Se deitar no teu cabelo

O vento a leva…

O traz o vento…

A noite sem rumo

A noite sem vela.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Quarta-feira, 27 de Julho de 2016

domingo, 24 de julho de 2016

menino rabelo


menino rabelo

galgado o rio até ao mar,

traz nos lábios a saudade

e nas mãos palavras de amar,

desembarca na cidade

com dois caixotes em madeira…

menino rabelo

que se deita junto à ribeira…

descalço e sem vaidade

o menino abraça-se à madrugada

como uma barcaça assombrando a alvorada,

menino rabelo

galgando socalcos de papel

e rochedos de cartão…

menino sem destino

que transporta no coração

um livro de mel,

menino rabelo

menino sem medo

das falanges de poeira…

menino que acorda cedo

o menino rabelo

menino que brinca na eira.

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 24 de Julho de 2016

quinta-feira, 21 de julho de 2016

pobreza


vadios lábios

que a porcelana inventa

nas manhãs sem madrugada,

minha garganta degolada

pelas lâminas do xisto amanhecer…

o meu corpo lamenta

o silêncio de envelhecer

sem acreditar nas palavras de escrever,

vadios lábios

filhos da noite envenenada…

a corda suspensa numa árvore abandonada

alicerça-se ao meu pescoço…

 

e sou fatiado pela alvorada…

 

na tua boca enrolada

a língua artificial da pobreza

que vive e alimenta o meu olhar,

o orvalho sobre a mesa…

e dos pratos vazios… a sopa que traz o mar

e os barcos da tarde magoada…

 

e sou fatiado pela alvorada…

 

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 21 de Julho de 2016

terça-feira, 19 de julho de 2016

vamos…


sossega…

vamos semear sonhos na alvorada

vamos pintar o céu de beijos

e de madrugadas... doces e belas

belas e desenhadas na tua tranquila mão de prata

sossega…

vamos plantar beijos nas searas

cobertas de películas de suor

que só a tua pele sabe escrever no fim de cada tarde…

sossega…

e vamos

adormecer no infinito.

 

Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 19 de Julho de 2016

domingo, 17 de julho de 2016

o dependurado


o homem da guitarra inventando sons na noite envergonhada

algumas moedas

alguns sorrisos

e mais nada,

 

o artista pintava aplausos na tela nocturna do silêncio

mas os transeuntes pareciam estátuas encapuçadas

escondidas na penumbra

regressavam as sombras

regressavam as lamentações em pequenas orações

e mais nada…

 

o dependurado senhor…

de guitarra em punho

disparando balas contra o coração das pessoas…

 

o amor frequentava a rua

alguns sem-abrigo

e desapaixonados

como pedaços de sucata

enferrujada

barcos de brincar

praias de sonhar…

e o dependurado

solitário

cansado de chorar

e mais anda

e algumas moedas.

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 17 de Julho de 2016