quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Fingindo crescer brincando não brincar

foto de: A&M ART and Photos

Uma tímida mão de porcelana
entranha-se no teu olhar vigilante como as nuvens sem nome
finge-se tudo
até a vida de viver quando se deixou de amar...
finge-se a riqueza
e os silêncios em alto-mar
uma tímida mão
de dedos longos
extintos como a fogueira do teu corpo
fingindo o amor
construindo mentiras sem alicerces
ou sepulturas
uma tímida mão de porcelana
entranha-se
e fingi-se tudo
do orgasmo
à chuva miudinha...
aos barcos que se dizem cansados
apodrecidos
enferrujados...
tudo
mesmo tudo
fingido como o miúdo...
fingindo crescer brincando não brincar.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Tristes Domingos sem literatura

foto de: A&M ART and Photos

Tu persegues a escuridão vadia dos tristes Domingos sem literatura
há uma janela onde habita o quebra-corações
escrevem-se-lhe palavras no corpo difuso como música suave
vagueando sobre os móveis trôpegos sem asas
e ouvem-se as gaivotas
o piano
os barcos loucos quando entram casa adentro
e o sexo acontece antes de ancorarem ao cais do medo,

A menina sorri
e ao de leve
pega na chávena levando-a aos lábios de diamante onde poisam favos de mel
pétalas de rosa e alguns versos desajeitados
que nasceram da mão do quebra-corações
que nasceram numa tarde de Domingo
sujo e vagabundo
como as flores do teu jardim,

Sento-me sobre ti e esqueço-me da vida
do amanhã
oiço os sons teus em teus dedos que de um piano de infância brota
como fluidos dentro do vácuo
perdidos
apaixonados
como lâmpadas de silêncio procurando os teus beijos
que vivem nas tuas mãos com dedos longos e imaginários,

Tu
tu persegues a minha escuridão
retiras as sombras
e semeias sobre o meu corpo
fios de nylon embebidos em azevinho
tu
tu libertas-me da noite e fazes-me regressar à vida dos vivos
tu o teu piano e os teus dedos perdidamente esquecidos nos meus cabelos fazem de mim o quebra-corações sisudo e envelhecido...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Não Slave to love

foto de: A&M ART and Photos

Sinto-me verdadeiramente encaixotado nos aranha-céus que o teu querido pai me prometeu, entre um deles e um qualquer livro, escolho um qualquer livro, e entre um qualquer livro e um copo de vodka, escolho obviamente...
Um qualquer vodka, porque dispenso o livro, porque dispenso um qualquer poema, porque dispenso o copo, sinto-o e sinto-me encaixotado nas tuas mãos vendadas pelo sono, cerras os olhos dos ténues pulsos de areia, pertences aos corpos clandestino como os pequenos grãos e as distintas óbvias gotículas do suor tua pela, cerras os olhos que jazem nos teus pulsos, suicidadas-te como uma menina mimada, singela, como uma flor vagabunda num qualquer palco, onde se ouve, uma qualquer banda, o piano melódico, e da voz poética, ela, ele, transformam
“Demito-o obviamente”,
E demiti-me,
Deixei se ser o amantes nocturno das noites de Verão, deixei de ser o clandestino mendigo passeando-se pela Avenida ribeiro das Naus, enquanto escrevo, oiço a melódica voz de “Joana Gomes” e dos “Fingertips”, e obviamente
Recordo, as saudades, de Carvalhais, e de S. Pedro do Sul, e dizem-me que o rio ainda corre como corria, e dizem-me que a eira ainda é a eira de ontem, pouca coisa mudo, apenas que o avô Domingo deixou de passear-se de bengala e dorme debaixo da lápide granítica onde alguém escreveu
“Eterna saudade”,
E demiti-me,
Hoje, hoje não amante, hoje, hoje não escravo do amor “Slave to love”, STOP, e na primeira rotunda a segunda saída, a respectiva plana de sinalização
“Precisa-de amor”,
Penso, devo estar perto, ao que tudo indica... uns míseros oito quilómetros, estrada sinuosa, encurvada, subo a serra como um caracol mal disposto, paro, peço um café mal tirado, por dificilmente encontrarei um bom café, e fico especado a ouvir a voz melódica do piano, debaixo da mesa, uma criança traiçoeiramente apanha um chupa-chupa, lembro-me de quando ainda era eu, muito antes de me demitir, lembro-me do Baleizão, lembro-me dos palhaços e dos malabaristas, lembro da tenda do circo dançar sobre a minha cabeça de menino
Mimada, tu
Eu, eu mimado, filho único, tinha um cavalo em madeira, saltava o portão de entrada e entrava cidade adentro, a cada machimbombo que encontrava gritava
Avô Domingos?
Nada
Avô Domingos?
Nada, nada de nada
Outra vez... Avô Domingos?
E encontrava-o numa transversal em Luanda com um cordel na mão a puxar um machimbombo com olhos azuis e missangas no pulso esquerdo, no direito
Machimbombo? Outra vez... Avô Domingos?
Penso, devo estar perto, ao que tudo indica... uns míseros oito quilómetros, estrada sinuosa, encurvada, subo a serra como um caracol mal disposto, paro, peço um café mal tirado, por dificilmente encontrarei um bom café, e fico especado a ouvir a voz melódica do piano, debaixo da mesa, uma criança traiçoeiramente
Triste,
Penso, devo estar perto, ao que tudo indica... uns míseros oito quilómetros, estrada sinuosa, encurvada, subo a serra como um caracol mal disposto, paro, peço um café mal tirado, por dificilmente encontrarei um bom café, e fico especado a ouvir a voz melódica do piano, debaixo da mesa, uma criança traiçoeiramente
Infeliz,
Penso, devo estar perto, ao que tudo indica... uns míseros oito quilómetros, estrada sinuosa, encurvada, subo a serra como um caracol mal disposto, paro, peço um café mal tirado, por dificilmente encontrarei um bom café, e fico especado a ouvir a voz melódica do piano, debaixo da mesa, uma criança traiçoeiramente
Cansada de ti,
E obviamente... demito-me.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Olhos de água

foto de: A&M ART and Photos

São frágeis os teus olhos de água
Transparentes como a noite
Em cio
São castanhos, azuis, verdes… são olhos demónio
Tamanhos verdejantes dos abraços de um rio
São frágeis
Como a noite sincera de ti quando entras dentro do espelho
São teus os teus pseudónimos olhos vagueando na paisagem
Destino
Viagem
São eles
Tão frágeis…

E tão lindos quando as palavras se escrevem
E vivem
E crescem
Neles, os teus frágeis olhos de água,

Mágoa
A alvorada em travestidos sorrisos
A menina tem lume?
Juízo?
A menina ama?
É amada?
A menina… é tão linda
Como os seus olhos de água…

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Os musseques imaginários de uma Lisboa travestida

foto de: A&M ART and Photos

Sumias-te nas fendas cansadas das noites sem dormir
misturavas-te com a bruma espuma do infinito amanhecer
lias-me folheando-me como se eu fosse um livro inacabado
sujo
imundo deixado esquecido num banco em madeira,

Tínhamos frio
e sentíamos os ossos mergulharem no silêncio das pratas em construção
havia um poema que líamos todas as noites antes de adormecermos
e não dormíamos
e não tínhamos vontade de voar naquela noite de Novembro,

Ardíamos como lareiras de vidro
suspensas na insónia
ardíamos debaixo de mil cobertores
e de alguns invisíveis...
havíamos descoberto o abraço em prestações,

Trinta e cinco suaves
como janelas pigmentadas nas faces rosadas do Inverno
tínhamos um barco que esperava por nós
e todas as noites
habitávamos os musseques imaginários de uma Lisboa travestida de felicidade...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó