sexta-feira, 20 de março de 2015

Não, não amanhã, amanhã vou à cidade, deixar o meu cadáver para ser enviado para a Metrópole, uma ardósia no peito, 123768979/66,
Só isso, pai?
Só isso, quando chegamos,nada tínhamos, apenas um caixote de nada, um rio nas veias... e tu
O mar, pai?
Morreu, disseram-me..., não percebi, morte!!!!!
O que é a morte, pai?
Voar, 123768979/66... em combate, o silêncio do Grafanil, os sorrisos das mangueiras nos meus lábios,
E...
Pai?
Sim, filho, Margarida reaparece da escuridão, tinha como hábito brincar na areia branca da praia dos sonhos,
Mãe, o pai?
Ficção, tudo isto, nada, a dor, acordava de madrugada a gritar por granadas, G3 e literatura, literatura, mãe?
Poesia, textos, trazia na algibeira da farda...
Farda, mãe?
Poesia, textos, trazia na algibeira da farda... toda a sua estória, as canções de menino, os primeiros beijos,
Margarida?
Sim António...
Viste os meus livros de “AL Berto”?
Talvez no chão, a carta, o sorteio
Três milhões de mortos,
Mortos?
Não, mortos não, Euros
Três milhões de Euros, meu filho?
Sim, mãe, sim...


(Ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 20 de Março de 2015

O sono


Esta casa em alvorada sinfonia
o som das palavras contra os cubos de xisto
que habitam as montanhas da insónia
o sono
em suspenso
GREVE
hoje
em alvorada sinfonia
esta casa
velha
desabitada
triste e cansada...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 20 de Março de 2015

quinta-feira, 19 de março de 2015


Sem perceber que a vida é uma roldana em aço, a carta regressa,
Seu filho morto, em nome do... as minhas sentidas condolências morte ou glória pela pátria, pai
Sim, filho?
Hoje é o teu dia,
Beijo,
Pai,
Querido
Amanhã
Não, não amanhã, amanhã vou à cidade.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 19 de Março de 2015

Viagem ao poço da paixão


Viajo no teu olhar
disfarçado de flor
há nos teus lábios um jardim
com coração de pétala adormecida
uma criança brinca nos teus cabelos
baloiça na tua boca
sempre a sorrir
antes da minha despedida
viagem
ao fundo do poço da paixão
desço
despedida,

desço até encontrar o chão
lamacento
com odor a Primavera
a poesia é uma aldeia
sem palavras
sem livros
sem... sem casas
baloiça na tua boca
sempre a sorrir
a criança que existe em mim
mergulhada nos sonhos
quando o sono é uma prisão,

com grades de luar
e janelas de açúcar...
imagino o teu silêncio
quando te embrulhas no espelho da saudade...
saudade...
grades
janelas
uma aldeia
sem palavras
sem... sem... pessoas
e a criança invisível
grita... quando percebe a minha partida...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 19 de Março de 2015

quarta-feira, 18 de março de 2015

Margarida preferia o silêncio, Francisco fica-se pelas imagens de infância,
Lisboa, meu “Deus”,
Nasceu e cresceu na cidade das esplanadas e dos barcos, brincava na rua, durante a noite gritava
Angola...
Foi-se,
Morreu,
E à noite gritava pelos pássaros que durante o dia abraça invisivelmente como os cortinados da insónia,
Foi-se
Não quero pai, Angola, a guerra nas tuas veias, o Grafanil em baile de Carnaval, os nossos filhos
Já pensaste nisso?
A minha mãe chorava, acreditava que o filho mais velho teria o mesmo destino
Pai?
Que o mesmo destino do pai...
Foi-se, uma Sexta-feira partiu de mala aos ombros, lá dentro, quase nada, alguns livros, poucos, e o estojo da barba, impertinente, este homem, sempre aprumado,
Já pensaste nisso?
Pai?
Que o mesmo destino do pai... voar sobre as sanzalas de crista, STOP, ao fundo da rua, virava à esquerda
“Putas”
Livros,
Cigarros nos bolsos de Margarida,
Ainda fumas, minha querida?
Claro que sim, claro que sim...
STOP
Sem perceber que a vida é uma roldana em aço.



(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 18 de Março de 2015