Nuas não verdadeiras doce tua vida de cidade sem
rio, não verdadeiras, todas as falsas janelas com vidros de linho,
falsas portas em falsa madeira das árvores que tombaram com o sono
e o vento deixava-as como serpentinas de aço enroladas em arbustos
com vista para o rio, havia lua, encharcadas de melodias e palavras
poeticamente afáveis, belas, nuas
Nas horas de sentido único de uma rua sem saída,
ao fundo, um edifício de chocolate com braços de prata, e nos
olhos, pequenas pérolas em drageias para combater a insónia, tua
Doce tua,
Inventava-te histórias
Não verdadeiras,
Histórias de crianças que nasceram em Luanda,
histórias de crianças que brincavam em Luanda com papagaios de
papel e nas sombras ínfimas das mangueiras escondia a solidão do
silêncio, inventava-te histórias, inventava-te laranjas com sumo de
tomate, inventava-te o amor, e todas as palavras escritas nos muros
da paixão
(e confesso que detesto conversar e inventar
histórias sobre crianças que nasceram em Luanda, recordo-me das
ruas, do mar, dos machimbombos, recordo-me do todos os cheiros, e das
cores que a terra húmida construía nos corpos de veludo, e
confesso, que detesto)
Os muros da paixão, as mãos dos muros da paixão
(e confesso)
Que detesto os lábios, a boca, os olhos
(e confesso)
Que todas as histórias que te inventei não
verdadeiras, falsas, que detesto
(e confesso)
Que a primeira vez que vi socalcos, chorei, como
choravam as meninas das minhas histórias de açúcar quando um fino
tímido fio de chuva descia e descia, descia os socalcos e
entranhava-se no Douro, e chorei
(e confesso)
A primeira vez que vi socalcos.
(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó