segunda-feira, 11 de abril de 2022

Oceanos de luz

 

E se despede de ti como se fosses uma lágrima de luz,

 

 

Desce a tempestade sobre a solidão dos dias, em poucas horas, depois do entardecer, a ribeira desparece da imensidão dos socalcos laminados do desejo; todos somos pedaços de nada, quando o nada se enforca no triste silêncio da alvorada.

Amar-te, como se fosses o oiro da manhã.

À hora da despedida, como sempre, a alvorada embainhada no perfume envenenado das sanzalas de prata, a voz das árvores corria montanha abaixo e, pequeníssimos orvalhos adormeciam na tua mão.

Tínhamos no sorriso dois Oceanos de luz e, depois da espera, víamos o cansaço dos triângulos assassinos que se despediam do luar, depois, alguém nos trazia as últimas nuvens de Março, ao fundo o rio fundia-se com as palavras não escritas.

Ouviam-se os gritos melancólicos das esplanadas de prata, o beijo alicerçava-se na tua mão depois de percorrer todas as ruas da cidade, o uivo cansaço impregnado num simples telegrama; morreu de quê, questionava ela.

Luzes clandestinas, telhas de vidro, abstractos farrapos nos teus braços, como sempre,

nas aguarentas planícies do prazer. E sabíamos que um dia tínhamos o mar encurralado como se encurralam os pássaros nas gaiolas de sombra.

Um dia, outro dia, ontem, hoje, a vaidade abraça-se nos lábios do lírio, o poema enforca-se nos lábios do poeta, enquanto o poeta desaparece no cacimbo da vergonha. Que da lareira emerja um pedaço ti, como emergiram os pássaros dos quarteis sitiados depois do toque da alvorada. Depois disso, afagávamos os loiros cabelos do poema que brincava no parque-infantil da aldeia. Escrevo-te;

Escrevo-te nas mãos envenenadas que escondes na algibeira, saltitavas de pedra em pedra, de sorriso em sorriso, escrevo-te recordando as lágrimas das mangueiras que voavam sobre as lápides da saudade, enquanto lá fora, debaixo das sílabas lunares, as palavras mergulhavam nos teus seios poéticos.

Ai a lareira, meu amor!

À hora da despedida, como sempre, sabíamos quando os pássaros adormeciam, como sempre, sabíamos que depois das árvores, os sítios se tornariam frios e escuros.

Sabíamos.

Como sabíamos quando descia a noite.

Como sempre.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 11/04/2022

domingo, 10 de abril de 2022

Querido imbecil

 

Quando um imbecil cortas as asas a um pássaro,

Ele,

Não voa,

Mas um pássaro sem asas, sonha e,

Voa.

 

Quando um imbecil corta o sorriso às tuas flores,

Elas, choram, elas ficam tristes,

Mas uma flor sem sorriso,

Sonha e,

Alegra o dia de uma criança…

 

Quando um imbecil diz que as tuas palavras são nadas,

Que as tuas palavras são asas cortadas,

Quando as tuas palavras são tempestades…

Quando um imbecil diz que és apenas uma montanha,

Um pássaro de asas cansadas.

 

 

Alijó, 10/04/2022

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 6 de abril de 2022

Aos pássaros que desistiram da Primavera

 

Não desistas,

Enquanto o vento te leva para o mar,

Não desistas e,

Não te deixes ofuscar pelo luar,

Não desistas de voar,

Amar,

Brincar,

Beijar…

 

Não desistas das palavras

Que escreves no céu nocturno do sonho,

Não desistas das canções de embalar e,

Que os teus pais te ensinaram…

Não desistas das tardes límpidas junto ao rio,

Não desistas de observar as montanhas e,

Todas as pedras.

Não desistas, não desistas de sonhar.

 

 

Alijó, 06/04/2022

Francisco Luís Fontinha