quarta-feira, 1 de setembro de 2021

As rosas do meu jardim

 

Todos os nomes

Possíveis

E imaginados,

Que me apelidam,

São rosas do meu jardim.

São as árvores

Do meu jardim,

As palavras que escrevo,

Sitiadas em mim.

Todas as pedras

Que me atiram,

São as sombras do meu jardim,

São versos,

São canções,

São sílabas de cetim.

Todas as ruas da minha cidade,

Que circundam o meu jardim,

E dos nomes que me apelidam,

São cores,

Rosas,

São poesia de mim.

São memórias,

São saudade,

E mesmo assim,

As rosas do meu jardim,

São cores,

São cinema,

São o toque do clarim;

Acordar

Para amar!

Todas as nuvens que brincam

No meu jardim,

São a beleza do poema,

Deitado na cama,

São o papel onde escrevo,

Amo,

E me deito;

Todas as nuvens que brincam

No meu jardim,

São versos sem jeito.

Todos os desenhos que pinto

No meu jardim,

São imagens transparentes do amanhecer,

São homens,

São mulheres a sofrer.

Todos os nomes

Possíveis

E imaginados,

Que me apelidam,

São rosas do meu jardim,

São o incenso a arder,

São memórias de mim.

Todas as fotografias do meu jardim,

São a saudade pincelada de madrugada,

São pedras em construção,

São tudo,

E não são nada.

Todas as rosas do meu jardim,

São as janelas do meu coração,

São todos os nomes

Que me apelidam,

São nomes que esqueço,

Nas sombras do meu jardim.

E não sei se mereço

As rosas do meu jardim;

Porque elas, as rosas do meu jardim,

São equações de fé.

Todas as pedras

Que me atiram,

São as sombras do meu jardim,

São os versos,

São as canções,

São as lágrimas de mim.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 01/09/2021

domingo, 29 de agosto de 2021

As cinco pedras do destino

 

O que faz esta janela encerrada na minha mão?

Pergunta-se ele, pensando que alguém o ouve. Sempre que puxa de um livro, a poesia nasce,

Dorme,

Morre,

Nas palavras que escreve.

É tarde, meu amor, ouvem-se os apitos gemidos do teu corpo e, dentro dos gonzos da solidão, oiço os pássaros rio acima.

O corpo sofrido, amar-te antes que adormeça o dia, morra a noite

E,

Se escreva na tua mão o esplendor da inocência adormecida. Pensando melhor, amanhã, deixarei de semear as palavras da saudade,

Nunca.

Esquecerei aquele rio embriagado,

Cansado,

Triste de mim.

Há na tua sombra, o retracto da menina envenenada pelo desejo, num qualquer quarto de hotel, de terra em terra, de circo em circo, de mar em mar,

Amar-te; depois das doze horas,

O lençol espreguiça-se contra nós e, sentimos o peso das carícias que só os poetas sentem e, percebem. O palhaço rico, o palhaço pobre e o defunto, todos aos gritos de encontro à enxada da vaidade. Esqueço-me de acordar, levanto e vou de encontro ao cortinado ainda sonâmbulo e, aos nocturnos esqueletos, a luz que apaga a imagem que durante a noite,

Ela,

À noite o que é da noite.

As sílabas estonteantes, os gritos deste palhaço à muito embebido no éter málico das tempestades de Agosto,

Sinto-o,

Diz-me ela.

Tem quatro relógios, nenhum deles escreve as horas, faltam-lhes a fome que antes tinham e sentiam e, que hoje quase nada podem comer. Segundo a lâmpada do escritório deverão ser qualquer coisa como depois das vinte e três,

Horas,

Minutos,

Segundos de vida.

(Se escreva na tua mão o esplendor da inocência adormecida. Pensando melhor, amanhã, deixarei de semear as palavras da saudade,

Nunca.

Esquecerei aquele rio embriagado,

Cansado,

Triste de mim).

Os barcos, meu senhor, são para venda?

Para comer não serão eles, responde-lhe,

E muito bem, quem neste reino se alimenta de barcos?

O velho, o macaco e a tia.

O velho pensava que fodia,

O macaco,

Da tia,

Abram-se os alicerces da memória, escrevam-se as escrituras da terra adormecida, levantem-se os esqueletos da prefeitura,

E

Não!

Ninguém sobrevirá a este tremendo castigo; escrever

Depois da morte

E, viver.

Vive-se de quê?

Da sorte.

Envenenado pelo silêncio, ou

Sempre que quero

Foge.

Amanhã,

Hoje,

As cinco pedras do destino.

 

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À noite o que é da noite.

As sílabas estonteantes, os gritos deste palhaço à muito embebido no éter málico das tempestades de Agosto,

Sinto-o,

 

Neste Agosto perdido.

Neste Agosto sofrido.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 29/08/2021

O homem invisível

 

Nesta cadeira se senta,

Enquanto lá fora,

Nas salgadas planícies do Infinito,

O homem invisível,

Agradece o pão

E o vinho.

Semeia na madrugada

As palavras de alento,

Os versos envenenados pela tempestade e,

Chora;

Incha-lhe o corpo a cada verso vomitado.

O silêncio entranha-se-lhe

Como o miolo do pão oferecido,

Vai à guerra,

Leva na algibeira as lágrimas

Que uma espingarda lança sobre a madrugada;

A cada palavra escrita,

Oferta de um cigarro embrulhado no veneno

Das viagens sem comandante.

O homem invisível

Padece de grandeza,

Pouco talento e,

Alguma subtileza.

Os gritos de ti

Nos gemidos de mim.

No espelho da maré

Desenha o mar

Envolto de laranjas e,

Ribeiras adormecidas.

Fodeu-se o boneco.

Em cada rua

Habita um boneco de trapos,

Filho do homem invisível.

Na garganta

O tumor que o vai matar,

Na solidão,

Na dor.

Tristes aqueles

Que pensam que o homem invisível

Dorme na alvorada,

Vive no jardim das pilas mortas e,

Avança com uma pedra

Contra a multidão que o apedreja com olhares.

Sofre com esta cidade,

Com a sujidade desta cidade,

O homem invisível,

Traz a morte tatuada

Na mão,

Também ela,

Invisível.

É fodido por todos,

Condenado por alguns e,

No Arremesso das palavras,

Às cinco em ponto,

A esplanada da vida silencia-se.

Se o coitado uiva,

É porque perdeu o sorriso

Nas ruas de uma Lisboa…

Há muito morta.

(morreu de quê?)

O telegrama diz que pelas dezassete horas,

Do dia que vai nascer,

Deixou de escrever palavras,

Pegou nos ossos,

Levantou freio e,

Regressou ao anonimato.

Pois é, meu amigo,

A cinza das tuas lágrimas,

Serão um dia,

A luz do meu amanhecer.

É parvo,

Quando pensam que ele,

O homem invisível,

Agradece o pão envenenado,

Não. Não.

A noite.

A sífilis esperança

De acordar um dia

Junto ao Rio.

Avança contra tudo. Todos.

As abelhas são eternas.

Os camuflados da insónia,

São um belo presente de aniversário;

Escura, maldita noite de dormir.

Outro gajo se ajoelhou

Na sombra que era sua,

Cansado,

Triste,

Este homem invisível

Resiste,

Ao desalento,

Ao infortúnio de viver.

Escreve canções

Nas janelas do abismo,

Sendo homem invisível,

Ouve as melodias do passado,

Como se fossem pedaços de pão

Descendo a calçada da saudade.

Pintou o mar

Na janela, também ela, invisível,

Melódica,

Triste,

Arrogante,

Pois o mar,

Salgado,

Vive-se de quê?

Do sono,

As chaves da despensa

Onde se escondem os duzentos e seis ossos

Das trezentas e vinte palavras.

Doce.

Amargo, silêncio.

A árvore,

Desce a calçada,

Levanta-se contra o lixo

Acumulado e,

Sem o saber,

Cansa-se da cidade onde habita.

O fim.

O princípio do fim,

Quando dois corpos balançam no baloiço

Do desejo.

Fodeu-se o boneco.

Fodeu-se o poeta,

Dono do boneco e,

Do homem invisível.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 29/08/2021

Sete rosas

 

Tenho sete rosas na minha mão

Entre palavras e gemidos,

Palavras ao vento,

Palavras nos socalcos erguidos,

Palavras de alimento

Alimento dos corpos esquecidos.

Dos teus seios

Nasce uma canção,

São palavras então,

São palavras do coração.

Ao púbis do desejo

Lancem as feras da savana,

Acaricio-te nas palavras,

As palavras da cama.

E os beijos?

O beijo silêncio

Que nasce no teu olhar,

Palavras,

Palavras de amar.

Sete rosas na minha mão,

Sete pecados no meu peito,

São palavras então,

São palavras sem jeito.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 29/08/2021

sábado, 28 de agosto de 2021

As palavras de amar

 

Tenho dias.

Todos os dias

Todas as horas

Todas as manhãs,

Onde moras,

Habitas,

Descansas

E dormes.

O amor.

As palavras

Nos livros da paixão

Do corpo

Na mão

Do silêncio

Que vive neste mar;

Os olhos descansam

Nas montanhas sem ninguém

Debaixo

Acima

Entre linhas

O desejo.

Amar

As nuvens do teu sorriso

Numa imagem

Sem juízo

A ira

O grito

Às gaivotas dos teus seios;

Nenhum pássaro

Estúpido

Se deita em ti,

Como assim?

Em ti,

Planície congelada

Do corpo que jaz na minha mão

Ao de leve

Levemente

Entre nós.

Um copo.

Quase ninguém presente

Ausente

De mim

Neste esconderijo branco.

O nojo.

A morte em forma de nojo.

O amor de ti

Em mim

Nesta gaivota sem nome;

Ontem

Uma criança

Hoje

Um livro de poesia.

Assim

Serei

Não sei

Talvez o número de polícia mais estranho do meu bairro.

Sobre as pálpebras

As imagens de quatro cantos

Numa tigela

A sopa dorme

E suicida-se

Contra a colher da saudade.

Depois.

Vem a noite

Atira-se para cima da cama,

Pronto

Sempre

Nesta casa de ninguém.

A janela

À janela

Há janela;

Todas.

Em minha casa.

Sempre

Que há o amor.

Desejar

Não desejar

Que um dia deseje a morte;

E no entanto

Não me canso

Nem durmo

Sempre que a tua boca absorve o meu corpo.

Caso contrário

Limito-me a escrever

Em ti

As palavras de amar.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 28/08/2021