sábado, 28 de março de 2020

Necrologia


O tempo que passa,
Desassossega o desespero,
Finto a vaidade,
Perco o emprego,
Vagueio na distância,
Ilumino-me,
E, perco-me no cansaço dia.
Tenho pena,
Daqueles que por lá passaram,
E, desavergonhadamente,
Lá continuam,
Esperando as pedras que caiem do silêncio,
Aos poucos,
Em cio,
Os pássaros loucos,
No desvaneio da solidão.
O tempo passa,
A fome aperta,
Neste desespero acontecimento,
Dos novos marinheiros,
Entre sexos e chapas de zinco,
O rio, comem-me,
Quando a maré se abraça ao cansaço.
Todas as vezes, algumas, o tempo passa,
O mar envaidece-se de sonolências madrugadas,
Calcárias manhãs de Primavera,
Ao deitar,
Sobre o travesseiro da insónia,
Esqueço-me de acordar,
Tomo café, todos os dias,
E, vejo no jornal, a minha foto,
Necrologia,
Perdidos e achados,
Despeço-me,
Até logo,
Abraços.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
28/03/2020

sábado, 21 de março de 2020

A laranja assassina


Conheci a puta de uma laranja assassina.
O gesto de coçar os testículos,
Quando o Rossio entre orgasmos e gemidos,
Traz o cansaço,
Os berros,
E, os cubículos.
O restaurante, encerrado.
As putas em delírio,
Sem clientes,
Passam fome,
Deveras,
Quando a aldeia acorda.
E eu, aqui sentado,
Fumando cigarros de haxixe, toco clarinete,
Bombo,
Punhetas a grilos,
E, afins.
Se te podes revoltar, revolta-te,
Come tremoços,
Mija contra os postes de electricidade,
Vem-te,
Vai-te,
E fode-te,
Ao pequeno almoço.
As laranjas assassinas,
Na marmita do tesão,
O foda-se,
Então?
Ai Senhor,
As putas em delírio,
O cansaço delas,
Nas mãos calejadas do centro de massa…
A equação do caralho,
Lacrimejado,
Entre paredes,
E dias de desassossego.
Por isso não esqueço,
A maldade,
O sumo da laranja,
Quando assassina o sexo.
Morre o tesão;
Fodam, fodam, que agora é de graça,
E não digam a ninguém,
Contra os rochedos,
Marchar, marchar…
E, depois,
Não se esqueçam de encerrar a janela,
A fechadura,
Porque às vezes, parece,
Mas não o é,
Sempre, às escuras.
Faltou a luz,
Esqueci-me de pagar a electricidade,
Foda-se,
Vou mijar contra o poste,
E se não gostarem,
Acabou.
Fim.
Fodi-me.
Fui assassinado por uma laranja.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
21/03/2020