sábado, 24 de janeiro de 2015

Hoje... a noite...


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Não tenho tempo para te amar, meu amor, flutuo nas ombreiras madrugadas travestido de dor, navego no teu corpo como um transeunte mendigo, sem-abrigo, poeta insignificante das palavras sem nome, e navego
Amanhã vou chorar,
E navego no teu corpo esculpido...
E na solidão do abrigo, as espátulas da insónia, o sexo embriagado, os teus seios crismados na fogueira da mendicidade,
Hoje?
Hoje vou amar-te, prometo, meu amor...
Tínhamos na algibeira o fio invisível, a luz o desejo
Amanhã?
De penetrar em ti como uma agulha de aço, um poema clandestino das
ruas de Lisboa,
Amanhã?
O sol, a noite, o teu ventre pergaminho saboreando os meus dedos, e amanhã?
Tínhamos,
Na algibeira os candeeiros da saudades,
Os beijos,
A geometria do teu olhar inseminado na madrugada, os beijos fluem como amêndoas de chocolate em brasa...
O teu corpo,
Os teus lábios...

(…)


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 24 de Janeiro de2015

Círculos de papel


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


sentíamos o peso do clítoris amanhecer
suspenso nas telhas de vidro do silêncio
tínhamos nos braços o suor das palavras
consumidas pelo fogo da paixão
havia um abraço de luz
nas verdejantes lápides da solidão
e apenas um finíssimo orgasmo de iões brincavam nas pálpebras da escuridão
havia o medo de não regressar
estávamos em círculos de papel
quando do espelho corpo em evaporação
uma gaivota soletrava os gemidos da maré...
os barcos arrependidos choravam como choram as crianças em flor.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 24 de Janeiro de 2015

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Gladíolo adormecido


As imagens tridimensionais da fotografia a preto e branco
há no seu rosto a melancolia da cúbica equação
as sílabas castanhas do primeiro amor
a equação em dor
a metáfora linhagem do sangue embriagado
cintilando
amar
não tenho vida
sou um desabitado eterno apaixonado...
pelas palavras
sorrisos
e riscos

havia outro comboio para regressar aos teus lábios
perdi-o passivamente
como um gladíolo adormecido
derrubei muros invisíveis
palhotas de silencio
antes de nascer o dia
fui habitante da cidade dos mabecos
menino desenhando círculos
na húmida saudade
que só a chuva consegue abraçar...
e hoje
hoje pertenço às imagens tridimensionais da fotografia a preto e branco.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 23 de Janeiro de 2015