sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Caligrafia

foto de: A&M ART and Photos

Desço da tua árvore em desejo como uma serpente sem veneno...
sou a tua caligrafia quando a noite se perde em ti
e tu
tu pareces um pedaço de papel sem palavras
paixões de areia que voam com a tempestade
amores de gelo que acordam entranhados em geada
saudades e saudades e saudades...
saudades de não ter saudade...
de ti...
… de ti quando eu era o teu corpo mergulhado no cacimbo desempregado
triste...
tão triste como os candeeiros da cidade do mendigo embriagado...

Desço da tua árvore
visto-me de caligrafia gaivota sobre os telhados da penumbra madrugada
oiço-te em gemidos vagabundos e das alegres naftalinas que o dia contempla... sofres
e finges que a Primavera inventou a caligrafia das tuas mãos envelhecidas,

Vai e sente a deslumbrante areia branca com janelas de xisto viradas para os socalcos da dor
e que em ti cresçam e se alimentem as ardósias tardes em literatura
não
não te revoltes
não
não tenhas medo das gaivotas em caligrafia desgovernada... quando das flores cardumes de abelhas
invadem os enxames de peixes que a manhã constrói depois dos pingados beijos descerem...
descerem da tua árvore em desejo
em silêncio
o medo
a boca que arde e em jeito de meia-caligrafia...
oiço-te em torradas e chás de menta... eis o desejo como uma serpente sem veneno...


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 24 de Janeiro de 2014

(por razões de ordem pessoal, nas próximas semanas, não publicarei... poesia, texto...)

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Verbos cinzentos


Tudo se perde nas profundas nádegas da saudade,
Se amanhã acordarem lágrimas nos teus olhos,
Não, não hesites em pegar na minha mão,
Se amanhã nos teus braços saltitarem gaivotas,
Não, não tenhas medo,
Sou eu, eu...
Eu... vestido de árvore em pedaços de sombra sobre ti...
Se amanhã na janela dos teus sonhos não entrar o sofrimento diáfano da sinfonia madrugada...
Não, não sou eu...
São as pedras da calçada,
São os verbos cinzentos nos lábios da sonâmbula enciclopédia desgovernada que esconde o teu fino rosto de amêndoa...


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 23 de Janeiro de 2014

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

... que acorde então a madrugada

foto de: A&M ART and Photos

As suas siglas perfumadas subindo as escadas do desejo
abraçando as singelas sílabas abandonadas que espreitam a madrugada entre o cortinado e a alvorada
sinto o bater das pérolas negras que caminham corredor abaixo... e na paragem do eléctrico
junto à porta que dá acesso à biblioteca
os teus seios mergulhados na argila manhã de triste neblina
criança ainda
perfumada
a sigla de ti acompanha as outras siglas deles até que acorde o Pôr-do-Sol
que venha a noite e traga muitos amigos
feiticeiros e feiticeiras
janelas e abrigos
bandeiras... portas e luares sem Janeiro...

As suas siglas perfumadas subindo... coitadas as derreadas canções de Abril
(Ora aí está... que acorde então a madrugada, que se abram todas as janelas, e que o dia finja ser um belo domingo, sol, muito sol... e ao longe... ao longe a praia, os coqueiros...)
os silêncios de mim entranhados nas tuas mãos
sentia-te saltitar sobre as finas areias da Baía...
os barcos nossos lançavam-se nos teus seios... e sabia-te sentada sobre as mangueiras do amanhecer...

O fogo permanece na tua alma inconstante
o fogo alicerça-se nos teus olhos de sincelo... e sem o saberes uma flor quadriculada dança nas pálpebras húmidas da paixão
dormes sem mim porque o infinito acontece todas as noites depois dos dispersos horários se debruçarem no varandim com telhados de prata
a tua pele fervilha e arde
e o fogo em ti é como as palavras em mim
nada de especial
o papel simples e informal...
sem gravata
sem... sem as apaixonadas mulheres nas borboletas de veludo que a luz ilumina
quero gritar não consigo
consigo gatinhar sobre a geada Aurora e não o quero
quero... e não percebo porque morrem todas as siglas perfumadas subindo as escadas do desejo.


@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 22 de Janeiro de 2014