segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Porta de entrada – cessaram as fechaduras do teu coração de vidro

foto de: A&M ART and Photos

há tanto silêncio nos lábios de um rio
há dor insignificante nos braços de um drogado
há pétalas cansadas nos guindastes dos teus olhos
pérfidas madrugadas
poemas e velhas canções
há janelas de onde nada consegue sobreviver como as ratazanas de esgoto
escadas sem corrimão de acesso ao sótão da insónia
há poetas e aprendizes de poetas
e eu
eu nem uma porta de entrada consigo ser
nem uma simples fechadura consigo abrir
e este coração é louco entre palavras e sensações

memórias
histórias
canções perdidas nos teus seios de capim...
há tanto silêncio nos lábios de um rio
que sinto medo de morrer
partir
morrer e não saber como são os socalcos depois de a chuva cair
partir
sem o saber
livremente voando sobre ti em desenhos quadrados de um colorido beijo
há tanto silêncio
sobre o caixão invisível que embrulha a minha paixão de esferovite...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 23 de Setembro de 2013

domingo, 22 de setembro de 2013

Eras mármore gratinado nas doces tristes algas da solidão

foto de: A&M ART and Photos

Eras mármore gratinado nas doces tristes algas da solidão, havíamos de terminar a noite entre resmas de papel, cinzeiro recheado de beatas, neblina ensurdecedora que os cigarros vomitavam sobre a mesa decorada com objectos insignificantes, eras mármore sobre um piano coberto por um cobertor de areia, regressavam no final do dia...
Pombas, gaivotas e barcos enjoados devido à forte ondulação que as horas incompletas e mortas, pelas finas espumas que os marinheiros traziam no pulmão alcatroado por um empreiteiro de algibeiras encurraladas das tempestades que o medo, de vez em quando, deixava cair sobre o silêncio, os olhos, os olhos
Fingiam que nada viam, adormeciam como embriagados homens de cabelo comprido,
Cumprido o teu desejo sublime, desfazem-se as pétalas em sorrisos amargurados, oiço-os
Aos olhos?
Os olhos dormem,
Comprido como a fome, as andorinhas regressavam ao local do crime, e as janelas de cristal sempre lá, suspensas nas árvores com ventoinhas eléctricas, do tecto, a chuva do teu cheiro, a catinga mergulhava na sombra nocturna do cinzento púbis que embebia a madrugada em despedidas ao Verão, regressado de longe, vêem-se as superfícies lisas das coloridas faces com lábios de amanhecer, ao longe
Aos olhos?
Vêem-se-lhe as pernas arqueadas e poisadas sobre o parapeito virado para as traseiras onde brincava um robusto quintal, velho, barbudo, atulhado de lixo, lixo... e aqui e além
O cheiro a catinga,
Os caixotes de lixos até não aguentarem mais alimento, vomitavam-se e sujavam as laminadas passadeiras em pura lã virgem, o pastor reclamava o preço a que lhe pagavam a lã, as ovelhas gritavam
Gatunos, gatunos...
O preço da água é um roubo,
Gatunos, gatunos... e o coitado do chibo endiabrado, correndo de leira em leira... até encontrar um rio com peixes voadores, até encontrar a mulher mais bela do cinzeiro onde ardiam algumas das beatas... e o lacrimante púbis enjoado devido às difíceis encostas cobertas por placas de xisto, e mármore gratinado nas doces tristes algas da solidão, havíamos de terminar a noite entre resmas de papel, cinzeiro recheado de beatas, neblina ensurdecedora que os cigarros vomitavam sobre a mesa decorada com objectos insignificantes, eras mármore sobre um piano coberto por um cobertor de areia, regressavam no final do dia...
Gatunos, gatunos...
O preço da água é um roubo,
Aos olhos?
A catinga absorvia o ranger
Oiço-os... meu querido
O quê?
A catinga absorvia o ranger que ela ouvia dos cornos em migalhas, depois do desgraçado do chibo, tombar como uma borboleta sobre a lápide do amor, recordava-se ainda do fumo embrulhado em fina prata de alumínio, e fingiam que nada viam, adormeciam como embriagados homens de cabelo comprido,
Cumprido o teu desejo sublime, desfazem-se as pétalas em sorrisos amargurados, oiço-os
Aos olhos?
Os olhos dormem,
E choram as tuas lágrimas
Fingiam que nada viam, adormeciam como embriagados homens de cabelo comprido,
Cumprido o teu desejo sublime, desfazem-se as pétalas em sorrisos amargurados, oiço-os
Aos olhos?
Os olhos dormem,
Dormem... e dormem... e dormem... e ele gritava
“Povo desta aldeia... andastes quarenta e oito anos a dormir... e agora, agora comei do sono”
Aos olhos?
Os olhos dormem,
Dormem... e dormem... e dormem...
E onde está a lã das minhas ovelhas?
Ouvíamos-o chorando como uma criança empoleirada em calções e sandálias de couro, sentava-se no triciclo...
E dormem,
E onde está a lã das minhas ovelhas?
Dormem...

(Não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha - Alijó
Domingo, 22 de Setembro de 2013