domingo, 24 de setembro de 2023

Despedida dos teus olhos

 Cai a noite

Nos teus olhos

E pouco tempo disponho

Para olhar os teus olhos

Cai a noite nos teus olhos

E pouco tempo tenho de respiração

E pouco tempo tenho de vida

Quando cair a noite nos teus olhos

Todo o mar ficará à deriva

E nos meus braços

Ficarão todos os barcos

 

E as lágrimas dos teus olhos

Cai a noite

Cai a noite nos teus olhos

Pergaminho doirado

Silêncio endiabrado nas mãos de Deus

Quando cai a noite nos teus olhos

E pouco tempo tenho de vida

E quase não tenho tempo para me despedir

Dos teus olhos.

 

 

24/09/2023

Meia-noite no teu corpo

 Meia-noite

O teu corpo silencia-se nos meus lábios

Sinto medo

Tenho medo de que o teu corpo se vista de folha de papel

E voe para o mar

E fique eternamente no mar

 

Tenho medo que os meus lábios

Machuquem o teu corpo

Quando é meia-noite

E tenho nas mãos o desejo

Tenho medo

Tenho medo que seja meia-noite

 

E que o teu corpo se confunda com um beijo

Tela adormecida na parede do teu olhar

Não tem nome

Ele

Não tenho nome

Eu

 

Meia-noite no teu corpo

Meia-noite de prazer

Quando numa outra longínqua meia-noite

Te peguei devagarinho

Tão devagarinho que a Terra parou de girar…

E o teu corpo ficou eternamente meia-noite

 

 

24/09/2023

Cubo de silêncio

 Pego no teu cabelo

Sonâmbulo acordar da manhã

Pego no teu cabelo e lanço-o ao vento

Como se fosse uma semente

Ou um pedaço do meu pensamento

 

Como se fosse um corpo que não sente

Indolor dentro deste pequeno cubo de silêncio

Pego no teu cabelo e lanço-o ao vento

Primeira lágrima da manhã

Que me mente

 

E me diz que não habita o sofrimento

Nos teus olhos de mar

Neste velho jardim com sabor a mágoa

Pego no teu cabelo

Pedaço de vinho

 

Neste cálice doirado

Pego no teu cabelo abençoado

Que voa sobre o luar

Sem perceber que na minha mão

Brinca o Outono

 

Pego no teu cabelo

Sonâmbulo acordar da manhã

Janela virada para o mar

Quando as algas são as Princesas da preia-mar

Que no teu cabelo eram crianças… crianças de brincar.

 

 

24/09/2023

Meia-luz

 Meia-luz da luz que o dia consome

Na luz que o dia lança ao mar

Quando não tem fome

Meia-luz incendeia a tua mão

Na tua mão meia-luz

Da meia-luz do coração

 

Na meia-luz do teu olhar

Meia-luz que o dia abraça

Meia-luz de medo

Nas profundezas desta barcaça

Em meia-luz e contraluz da desgraça

Na meia-luz que não tem graça

 

Meia-luz que o dia consome

Na outra meia-luz que o dia vomita

Porque a cada meia-luz sem nome

É meia-luz em fome

Na meia-luz que não dorme

Na meia-luz que levita

 

Meia-luz no teu olhar

Do teu olhar meia-luz de mar

Mei luz que o dia consome

Da meia-luz que o dia come

Sem segredar à outra meia-luz

Que em cada meia-luz há uma outra meia-luz com fome

 

 

23/09/2023

sábado, 23 de setembro de 2023

Espingarda

 Às vezes éramos apedrejados pelo silêncio

Às vezes éramos escravos

Do silêncio

Às vezes gritávamos

Às vezes chorávamos

Às vezes tínhamos em nós toda a alegria

Às vezes sentíamo-nos os filhos do poema

Da poesia

Que às vezes atrapalhava o dia

 

Às vezes marchávamos em direcção ao mar

Às vezes fazíamos de mar

Quando o mar

Às vezes

Se disfarçava de um outro mar

 

Às vezes ouvíamos o apito do comboio

Na algibeira de transeuntes aflitos

Com fome

Que às vezes sentíamos enquanto o sono não regressava

Das vezes que se despedia

E nós sem saber o significado de manhã

Quando às vezes

Se perde um sorriso no meu olhar

 

E lá se vai a manhã

De apenas algumas vezes

Às vezes fugíamos

E às vezes pegávamos nas espingardas da insónia

Disparávamos incenso contra o sol

E sal contra a lua

 

E de todas as vezes

Regressavam sempre a nós as outras vezes

Dos dias de às vezes

Meio-escondidos na rua

Meia-lua dos teus olhos

Que às vezes ofusca

Que às vezes me chama

E lamenta

Esta espingarda de corda.

 

 

23/09/2023

Lágrimas de amar

 Vieram as primeiras chuvas

E levaram-no para o mar

E levaram-no num abraço

Vieram as primeiras chuvas

Veio o cansaço

E o abraçaram

E o levaram

Para o mar

 

Vieram as primeiras chuvas

E levaram-no para o mar

E levaram-no para os teus olhos de mar

Perdidos nas primeiras chuvas

À procura do mar

 

Vieram as primeiras chuvas

E levaram-no para o mar

E levaram-no para os teus braços de embalar

Vieram as primeiras chuvas

As primeiras lágrimas de amar

 

 

23/09/2023

Caminho

 Dá-me a mão

Entrelaça os teus dedos nos meus dedos

E vamos

Vamos á procura do mar

 

Vamos abraçar

O mar

Dá-me a mão

Entrelaça os teus dedos nos meus dedos…

E vamos

Vamos à procura do luar

 

Dá-me a mão

Entrelaça os teus dedos nos meus dedos

E vamos

Vamos à procura do teu olhar

Vamos à procura do mar

Ou… ou simplesmente caminhar

 

 

23/09/2023