domingo, 13 de agosto de 2023

Miserável

 

Aos olhos da lua,

Sou.

Sou qualquer coisa comestível

Que apenas a noite,

E só a noite,

Consegue mastigar.

Sou

Aos olhos da lua

Uma pequena lágrima de sono,

E abatato-me neste silêncio

E suicido-me nos teus lábios.

 

Aos olhos da lua

Sou.

Sou lágrima em flor,

Sou poeta,

Sou pastor.

Aos olhos da lua

Sou um miserável,

Poeta miserável,

Poeta…

O morto poeta

Quando as mãos da poesia,

Lentamente,

Masturbam a noite.

 

Aos olhos da lua,

Sou.

Sou.

Sou o quê, aos olhos da lua?

Se a lua não tem olhos

E eu,

E eu não sou nada.

 

Aos olhos da lua,

Sou.

Sou canção que se abraça ao rio,

Sou o poema que brota do mar,

Sou a fome,

O fastio,

Aos olhos da lua,

Sou.

Sou trombone na filarmónica,

Sou equação nas mãos dele,

Aos olhos da lua,

Sou.

Aos olhos da lua sou gaveta de armário,

Papel higiénico…

Aos olhos da lua,

Sou…

 

 

13/08/2023

Francisco

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

sábado, 12 de agosto de 2023

Madrugada em teu olhar

Madrugada sem destino

Madrugada das almas aprisionadas

Madrugada do pobre menino

Menino das cidades amordaçadas

 

Mestre canónico do silêncio ardor

Que nesta mão se revolta

Que assassina uma flor

E tudo aquilo que está à sua volta

 

Madrugada sem destino

Em teu doce olhar

Madrugada deste pobre menino

 

Do menino sem lar

Madruga em teu olhar

O mar.

 

 

12/08/2023

Francisco

 

Noite de mim

 

Sobre o meu peito

Dança a espada que me vai matar

Lâmina da paixão em desassossego

Como os chocolates que sobejaram da noite passada,

E sobre o meu peito

Esta triste espada

Pesada,

Sobre o meu peito

As cancelas da alvorada se abrem

Sem que do outro lado do rio

Os transeuntes percebam se estou morto

Ou vivo,

 

Sobre o meu peito

A aceleração deste foguete que habita em mim

E em direcção à lua

Parte à descoberta da madrugada,

 

Ergue-se a manhã no meu peito

Da manhã desta espada

Desta espada silenciada

Pelos olhos do mar

Que voam de árvore em árvore,

Sobre o meu peito

A jangada em despedida

Deixa a terra e caminha…

Deixa a terra

E também ela

Como eu

Morre às mãos desta espada,

 

Sobre o meu peito

Dança a espada que me vai matar

Lâmina da paixão em desassossego

Como os chocolates que sobejaram da noite passada,

 

Chocolates da manhã submersa no teu cabelo

Que olha esta espada

E nada faz

E nada faz

Para que esta espada

Que dança sobre o meu peito…

Me mate

E grite;

Está morto.

 

 

12/08/2023

Francisco

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

 


O teu poema

 

Do teu poema

Flor que se esquece de acordar

Flor do teu poema

No teu poema de amar

 

Do teu poema de sonhar

Esta flor que cresce

E se ergue no teu olhar

Como uma fogueira branda e que aquece

 

As sílabas da madrugada

Do teu poema

Ouve-se a canção da ribeira brava

 

O teu poema que lanças contra mim

Quando no teu poema

Aos poucos acorda um jardim.

 

 

 

12/08/2023

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

Cair da noite

 

Ao cair da noite

Pego na tua mão

Beijo-a como Deus me beijou.

Ao cair da noite

Pego no teu cabelo

E acaricio como Deus me acariciou

Junto ao rio

 

Quando eu procurava aquele navio

Que me transportaria para o desconhecido.

Ao cair da noite

Afugento o mar dos teus olhos

E dou às abelhas que brincam nos teus lábios

O doce mel da madrugada.

 

Ao cair noite

Beijo-te como Deus me beijou,

Como Deus escreveu no meu corpo

Os silêncios da noite,

Como Deus desenhou no meu corpo

O cair da noite.

 

Ao cair da noite

Pego na tua mão

E beijo-a como Deus me beijou

Enquanto cai a noite

No teu cabelo de Cinderela adormecida.

Ao cair da noite

Quando desisto da despedida

Vou em busca da noite

E vou à procura da tua mão

E de uma nova partida.

 

 

 

12/08/2023

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

sexta-feira, 11 de agosto de 2023

A quinta força

 Descubro a quinta força do Universo

E escondo-a nos teus lábios de mel.

Ainda não sei o seu nome

Como se comporta em relação às outras quatro forças

(a força gravitacional, a força electromagnética, a força nuclear forte e a força nuclear fraca)

Mas se fosse eu a apelidá-la

Apelidava-a de DESEJO.

 

E do caos esconderijo dos meus braços e das minhas mãos

Acorda o silêncio

Desperta a alvorada em mim,

Libertam-se as gaivotas do meu jardim,

E batem-me à porta as árvores dos teus olhos de mar,

 

Como são lindas as janelas do teu olhar

Quando a quinta força do Universo te beija a face

E lentamente escreve ao teu ouvido…

As primeiras leis da madrugada,

 

Descubro a quinta força do Universo

E escondo-a nos teus lábios de mel.

Ainda não sei o seu nome

Ainda não sei nada…

Mas se fosse eu a apelidá-la…

Apelidava-a de DESEJO.

 

 

 

11/08/2023