sábado, 17 de junho de 2023

 


Estou muito desiludido contigo,

Mãe,

Lamento,

Estou muito desiludido contigo.

Estou muito desiludido contigo…

Estou muito desiludido comigo…

Lamento…

 

 

 

Francisco

17/06/2023

sexta-feira, 16 de junho de 2023

Baloiço

 Sem mim

De mim

Sem mim este baloiço se suicida

Quando cair a noite

Junto ao rio

 

Sem min

Este baloiço de espuma

Que se despede a cada madrugada

Da outra madrugada

 

Este baloiço

No baloiço de nada…

Este baloiço de espuma

Sem nada

Entre mim

Da morte e outras coisas…

 

Que sorte

Se ele morresse

Se ele se matasse…

Sobre o baloiço da noite

Do baloiço da sorte

Enquanto a noite…

Baloiça nas mãos de Deus…

 

Sem mim

De mim

Outro baloiço

De corda ao pescoço…

No baloiço da morte

A sorte

De morrer…

Quando cair a noite junto ao rio.

 

 

 

Francisco

16/06/2023

Barco de espuma


 Deste barco

Deste barco de espuma

Da espuma que se revolta

E de porta em porta

De morte em morte

Desce sobre ti o sol

E ergue-se sobre mim

A morte

 

Dessa triste montanha

Onde tenho escondidas todas as minhas palavras

Outras palavras

Outros medos

A morte brinca no límpido pano da ausência

Ergue-se

Abre a porta da sala…

E a triste montanha

Na triste planície

Em ti do sol misericordioso

 

Neste barco

Deste barco me escondo

Enquanto do nada

Espero tudo

Quando o tudo…

Quando tudo deixou de ser o nada

 

Hoje é o meu aniversário

Mais um ano

E do tudo

Regressa a mim o nada

Entre a morte

E a má-sorte

No forno do desejo

Nas coxas da madrugada

 

A tabela periódica

Ainda dorme

E certamente…

Dormirá…

Como dormem todas as sílabas deste inferno

Que morre na escravidão do sexo

Acorrentado a uma pequena sombra…

Onde os gatos

O abraçam…

Teu barco de espuma

Enquanto o inferno

Morre

E da chuva acorda

A morte do tudo

Quando hoje é o nada.

 

 

 

Luís

16/06/2023

Sistema solar

 Se o Pacheco soubesse

Se o Pacheco soubesse morria de inveja

A única diferença…

A única diferença é que nunca me masturbei na casa de banho de um qualquer bar,

Numa qualquer cidade,

De um qualquer planeta do nosso sistema solar,

 

Se o Pacheco soubesse…

Se o Pacheco soubesse como é a minha vida…

Coitado

Morria de inveja,

Duas vezes por dia,

E uma pequena drageia ao deitar…

 

Se o Pacheco soubesse

O quão é difícil viver

Vestir todos os círculos da geometria

E quando ele se senta em frente à nossa senhora…

Em vez de rezar…

Não...

Escreve poesia…

E ele,

Ele masturba-se numa qualquer casa de banho de um qualquer bar desta pobre cidade…

 

A noite traz a sombra de espuma deste barco de insónia

E se o Pacheco soubesse

Ou se ele sonhasse....

Não queria ser marinheiro

Doutor

Engenheiro…

Não...

Queria ser…

Masturbador de insectos,

 

Se o Pacheco soubesse

De todos estes gatos anónimos

De todos estes cadáveres de sono

Que não falam comigo

Que me ignoram…

Coitado do Pacheco

Não sabe

Não imagina

Que dentro de um pequeno silêncio

Esconde-se a primeira equação do destino,

 

Sei lá se o Pacheco percebia de equações…

Eu,

Eu dou-lhe um pequeno jeito…

Vou fazendo

Vou lançando sobre o mar

Tudo aquilo que o Pacheco…

Que o Pacheco deveria saber,

 

Mas não,

Não sabe,

Não se interessa…

Nada.

 

Se o Pacheco soubesse

Como são tristes as lâmpadas da minha vida

Como são distantes

Longínquas

Todas as estrelas…

Todas as estrelas da minha vida…

 

Se o Pacheco soubesse!

Certamente morria de inveja,

Certamente,

Nada de muito certo…

Morria de inveja…

Porque eu,

Porque eu ainda consigo ser mais miserável de que o Pacheco,

Se o Pacheco soubesse…

Só não me masturbo na casa de banho de um qualquer bar de uma qualquer cidade…

De todo,

De todo o sistema solar.

 

 

 

Francisco

16/06/2023

Menino sem destino do destino menino

Somos tão poucos

Somos tão poucos aqueles que pertencem ao destino

Sem destino

Tão poucos

Tão quase anda

Este pobre menino

Neste pobre destino

E sem madrugada.

 

Do quase anda

Ao quase tudo

Grita este menino

E desenha o mar…

Nos lábios da tristeza

Da tristeza

Deste menino…

Sem destino

Este pobre menino,

 

Tão quase nada

Tão quase tudo

Este pobre menino

Sem destino

Diga-se

Que foi quase tudo

Do pouco que podemos considerar…

Tudo,

E hoje,

Hoje é um quase anda.

 

Somos tão poucos

Somos tão poucos aqueles que pertencem ao destino

Sem destino

Tão poucos

Nos poucos de nada

Quando tudo

Quando tudo é uma maçada…

E é quase nada.

 

 

 

Francisco

16/06/2023


 

quinta-feira, 15 de junho de 2023

Das tantas vezes, as minhas vezes

 (aos meus pais)

 

 

Às vezes,

Às vezes não tínhamos nada,

Às vezes…

Às vezes tínhamos tudo…

Tudo que até sobrava,

Às vezes olhávamos o sol

Outras vezes nem por isso…

Mas éramos tão felizes,

 

Às vezes,

Às vezes me lamentava

E quase que chorava

E não acreditava…

E claro…

Sonhava,

 

Às vezes não comia

Outras vezes…

Comia pequeninas sombras de nada

E inventava…

Meu Deus… tanta coisa que eu inventava,

Mas a vida é assim,

Claro que sim…

Uns morrem…

Outros,

Outros tal como eu…

Voam…

E não se cansam de voar,

Sonham…

E não se cansam de sonhar,

 

 

Aos mortos,

Que hei-de eu dizer aos mortos…

 

Às vezes,

Sentia medo do silêncio da minha casa,

Tantas vezes,

Tantas vezes… meu Deus…

Tantas vezes que eu chorava…

E fingia

A cada novo dia...

Que sim…

Que estava tudo bem,

E claro que não…

Como poderia estar tudo bem…

Se o meu pai tinha morrido,

E a minha mãe…

Coitada da minha mãe…

Lutava,

Rezava…

E acreditava…

Que de cancro não morria também,

 

E as minhas tantas vezes,

Aos poucos…

Começaram a ser menos vezes…

(porque o poeta nunca morre,

Mesmo que tenha fome)

E aqui estou eu…

O poeta,

O artista plástico,

Talvez um pouco de louco,

Talvez um pouco de nada…

E claro…

Quase engenheiro…

Como o meu pai gostava.

 

 

 

Do vosso filho,

Francisco

15/06/2023