Família - Acrílico/óleo s/tela – 90cm x 120cm – Francisco Luís Fontinha – Alijó.
segunda-feira, 15 de maio de 2023
domingo, 14 de maio de 2023
O inferno das palavras
Sabes, meu amor,
Dos sonâmbulos dias,
Os nossos dias,
Dos nossos outros dias,
E sabes, meu amor,
Em cada dia,
Nasce um poema,
Beijam-se as flores em
poesia,
E tudo,
Tudo meu amor…
Num só dia.
Nasce-se num determinado
dia,
Nasce um filho, num
qualquer dia,
Morre-se a cada dia,
Que passa,
Enquanto a Terra roda a
trinta quilómetros por segundo…
Deixa lá a Terra, meu
amor…
(roda sobre um eixo
imaginário)
Imagina tu, meu amor,
imagina…
O Sol quando acorda,
Todas as plantas abrem os
olhinhos…
E todos em uníssono,
Bom dia…
E tudo, meu amor…
Tudo antes de morrer o
dia,
Ao começar o dia.
Todos temos um dia,
Eu tenho muitos dias,
Dias, dias…
Morreu, morreu, morreu…
Tudo apenas num só dia.
Sabes, meu amor,
Dos sonâmbulos dias,
Os nossos dias,
E sabes meu amor,
Enerva-me este inferno
das palavras,
Em todos os dias,
A cada dia.
E um dia não são dias.
Ouvi-o tantas vezes
quando se escondia ma escuridão…
E eu, imaginava os teus
olhos quando se despede a noite do luar…
Abraçam-se,
Beijam-se loucamente,
E depois temos de levar
com a Noiluar,
Que é o resultado do
produto da despedida da noite… com o luar.
Hoje não há mar, meu
amor.
E hoje também não há
marinheiros dentro de mim…
Hoje diria que…
E sei lá o que dizer
Ou o que diria,
Ou não diria,
Se em cada dia,
A todo o dia…
Este inferno das palavras…
Não morre um dia.
A cada dia.
Do outro dia…
Quem diria…
Que ele,
Que ela…
Quem diria…
Diria eu,
Não.
Alijó, 14/05/2023
Francisco Luís Fontinha
Do sono
Um quilograma de sono, será sempre um quilograma…
E se eu dispensar um
quilograma do meu sono,
Certamente,
Não será por isso que
fico mais pobre,
Decidido; vendo um
quilograma do meu sono.
Um quilograma a menos,
talvez dê para começar uma tela…
Ou…
Simplesmente para olhar o
pôr-do-sol.
Um quilograma do meu
sono, vendo-o…
Ou quem quiser,
Troco um quilograma de meu
sono por um dos livros de Luiz Pacheco…
Que ainda não tenha,
Um quilograma do meu
sono,
Vendido
Ou trocado,
Tanto faz,
Será apenas um quilograma
do meu sono.
Vendo ou troco um
quilograma do meu sono…
Enquanto faço negócio,
penso…
Tudo o que poderei fazer com
um quilograma do meu sono a menos…
Um quilograma do meu
sono;
Vendo-o,
Troco-o…
Dou-o.
Alijó, 14/05/2023
Francisco Luís Fontinha
Às vezes, meu amor, às vezes penso e sonho…
Às vezes, penso,
Penso muito, meu amor, às
vezes penso de onde vêm estas imagens que semeio nas telas e em pequenas
folhas,
Às vezes, penso,
Penso muito, meu amor,
De onde vêm todas estas
palavras que escrevo,
De onde vêm todas estas imagens
e todas as palavras,
Às vezes, meu amor, às
vezes sinto o medo…
O medo de que estas
imagens se abracem a mim
E algum idiota me diga
que estou louco…
Mas não será essa loucura
com que nos apelidam…, a melhor forma de sonhar o mundo?
Às vezes, meu amor, às
vezes penso e sonho…
Penso que estou a sonhar,
Muitas vezes sonho que
estou a pensar,
Às vezes penso,
Penso e dizem-me que não
devia pensar, tanto…
Mas penso,
Mas sonho,
Sonho que penso que
nenhuma criança terá fome,
Penso que sonho que
nenhuma mulher será espancada…
E penso, penso muito, meu
amor…
Penso e imagino a
alvorada,
Sonho e penso, quando se
despede de mim o luar…
Penso, meu amor, penso
muito,
Que não devia pensar
tanto,
Penso por que razão todas
estas imagens e palavras fizeram parte das minhas brincadeiras em criança,
Penso, meu amor,
Penso muito, penso que se
despede o dia… e uma infinita madrugada está para regressar,
E abraço a noite, como te
abraço… lentamente…
E penso, e sonho…
E muito lentamente
olho-te e percebo que tens uns olhos lindos…
Gosto de olhar os olhos e
deles receber as estrelas da manhã…
E penso, muito, que não
devia pensar,
Mas penso,
E sonho,
Sonho que penso,
Penso no que sonho…
E alguns dirão; está
louco,
Às vezes, penso,
Penso muito, meu amor, às
vezes penso de onde vêm estas imagens que semeio nas telas e em pequenas
folhas,
Às vezes, penso,
Penso muito meu amor…
Penso que às vezes a
escuridão é uma óptima companhia,
Depois, meu amor, penso…
O que dirá o gladíolo
para a tulipa!
Ou será que estão ambos
quase abraçados…
E nada dizem,
Ou será que dizem?
E eu, penso, penso muito,
meu amor…
Penso que há dias de
chuva loucamente felizes,
E que há dias de sol que
são uma autêntica merda,
E uma criança fica
encantada com um brinquedo…,
Mesmo que não tenha
qualquer valor comercial…
Porque ainda há crianças
que não sabem o significado de brinquedo,
Tive-os, muitos.
Destruía-os…
(dizem que saí ao tio
António, mal recebia um brinquedo destruía-o imediatamente…
E quando lhe perguntavam,
era para ver como era por dentro)
Eu fazia o mesmo,
Tive-os,
Muitos…
Mas muitos não os
tiveram,
E alguns que os tiveram…
Viviam em casas
assombradas;
Felizmente a minha casa
nunca foi assombrada,
E penso.
E sonho,
Sonho muito, meu amor,
Sonho e penso, que fazer
com todas estas imagens…
E sonho que penso,
Quando depois de pensar o
que sonhei…
Nada;
Fecho a janela e hoje não
me apetece mais olhar o mar.
Cansei-me, hoje, meu amor…
cansei-me do mar.
E penso,
E dou comigo a pensar,
Que sonho,
Mas não,
Só poderei estar a
sonhar.
Alijó, 14/05/2023
Francisco Luís Fontinha
sábado, 13 de maio de 2023
Cálice
Imagino este cálice de vinho
Só
Sozinho,
Imagino o teu corpo nas
pétalas do vento
Quando junto ao mar,
Dorme o meu filho barco,
Sento-me,
E imagino-o voando sobre
os quintais de Luanda,
Imagino este cálice de
vinho
Só
Sozinho,
Imagino os teus olhos
quando dormem,
Dos teus olhos onde
brincam as acácias da minha infância…
E dos teus cabelos em
vento silêncio,
O mar da minha infância,
Poisa-me nos lábios…
E beija-me loucamente,
Imagino este cálice de
vinho
Só
Sozinho,
Imagino a lua poisada nos
teus seios de desejo…
Imagino o silêncio…
poisado nos teus doces lábios,
Imagino a luz do teu
olhar…
A trezentos mil
quilometro por segundo…
E eu…
Imagino este cálice de
vinho
Só
Sozinho,
Imagino o vento dançando
nos teus cabelos,
Nuvens dos pincelados
desejos,
Na tela teu corpo,
Teu corpo livro,
Matemática,
Equação diferencial…
Imagino este cálice de
vinho
Só
Sozinho,
Imagino as sílabas do teu
ventre
Em maternidade luz,
Dançam os pássaros em
mim,
E eu,
Imagino este cálice de
vinho,
Só
Sozinho,
Imagino a nossa galáxia
em espiral teu sorriso…
Imagino as tempestades de
medo
Dentro deste cálice de
vinho
Só
Sozinho,
Imagino o beijo do
silêncio,
Em alegres coloridos
lábios
Em marés de sono,
E eu,
Imagino este cálice de
vinho
Só
Sozinho,
E podia ser cada um de
nós…
Eu,
Tu,
Vós…
Todos,
Todos um dia podemos ser
um cálice de vinho
Só
Sozinho.
Alijó, 13/05/2023
Francisco Luís Fontinha