Escondíamo-nos dos
tristes candeeiros nocturnos
Quando a paixão espiava o
acordar da noite,
Sabíamos que dentro
daquele rio,
Envenenado até à foz,
Escondia-se o inferno de
amar,
E cada palavra que
semeávamos na árida terra de ninguém…
Uma gaivota de luz poisava-nos
sobre os ombros estonteantes,
Éramos novos,
Passávamos a tarde a
contar cacilheiros,
Linhas rectas traçadas no
olhar…
E só acordávamos do outro
lado do rio,
Quando ouvíamos os apitos
em despedida…
A despedida,
A eterna despedida,
A ausência do corpo…
Quando o corpo pede o silêncio,
E da boca,
Chegava-nos o desejo…
E um longo beijo se
erguia na alvorada,
Era triste o teu olhar,
Madrugada da simplicidade…
Eram tristes as manhãs
junto às tuas mãos,
Quando do teu rosto,
As lágrimas se despediam
da tua sombra,
Eram tristes as nossas
tardes,
Como eram tristes todas
as nossas bebedeiras e voos frenéticos junto ao mar…
Como ainda são tristes as
tuas palavras,
Que escondo dentro de
mim,
Como se pertencessem a
uma lápide de luz…
Invisível,
Que apenas eu tenho
acesso,
Eram tristes os poemas
que te escrevia,
Como tristes se sentiam as
minhas esferográficas…
Quando percebiam que te
ia escrever,
E no entanto,
Escrevia-te…
Sem saber se junto ao
rio,
O teu rosto de gaivota,
Ainda brinca com as
crianças…
Ou se também ele já
partiu,
Éramos tristes,
Éramos a ausência de uma
cidade que constantemente vomitava silêncios…
E sempre que um de nós
tombava no pavimento do medo,
Sentíamos a presença das
estrelas que nos davam a mão…
E nos levantava…
Ora a mim,
Depois…
Depois,
Partiram todos os
milhafres do nosso olhar,
Caravela quinhentista,
Gavião da minha tristeza,
Partiram todos…
Partiram sem se despedirem
de nós…
Assim…
Como partem as andorinhas
quando termina a Primavera,
Nunca se despedem,
Partem.
Alijó, 14/04/2023
Francisco Luís Fontinha