Galgavas os travessões inclinados do texto, mudavas
de linha, colocavas uma vírgula aqui, outra ali, e mais outra acolá,
e ainda outra
Para aquela senhora de encarnado,
Três por um, tudo a cinco euros ouvíamos do
megafone da cigana com seios de prata transparentes quando quase no
final do texto aparece um ponto de interrogação, o autor,
atormentado e sem saber onde o colocar
Grita,
E a cigana, por apenas dez euros, juro pelos meus
dois olhinhos que a terra há-de comer que as peúgas são de pura lã
virgem, calçam-se a primeira vez, depois decrescem até chegarem a
zero, isto quando o limite do seno de X sobre X é um quando o X
tende para zero, a cigana embaraçada, não deseja saber, ela
recusa-se a perceber os limites dos terrenos baldios, onde cabras
soltas caminham sobre os pontos de exclamação que o parvalhão do
autor deste texto coloca,
Grita!
E as cabras saltitam, saltitam como cordéis de
Inverno no pescoço da querida Maria Torrão de Azeméis, mulher de
peito longo, cabelos à tangente de três quartos de pi radianos, e
ao pescoço, sem qualquer pontuação, uma frase invertida, sem nexo,
suspensa numa árvore, haviam três agulhas e um dedal, haviam nuvens
esféricas que assustavam a pobrezinha da cigana às voltas com a
trigonometria, e haviam
Cabras? Não, ovelhas com pintinhas amarelas, vespas
com asas de milho e
Ponto de interrogação? Não,
Final, ponto, intermitente como as luzes dos barcos
de papel que ela deixou nas almofadas dos sofás de granito,
encardidos com a tempestade de areia, depois do solstício de Inverno
se suicidar contra uma locomotiva desgovernada em passos apressados
entre dois carris paralelo à espera do infinito para se encontrarem,
A cigana, coitadinha, pobrezinha
Ai minhas caabrinhaaas,
E a saudosa dona Maria Torrão de Azeméis gritava
Quero lá saber das ovelhas,
Precisa-se de uma palavra começada por T e
terminada em I, a cigana desconfiava do vigarista Miguel Hoje Sem
Casa, apenas sabia contar até cinco e que às vezes a vida dele
parecia um hipercubo, como a minha, respondia-lhe eu,
(Trabalhadori)
O cabrão acertou, cabrão dum raio, pelintra, como
eu, entalado nos carris, de um lado a puta das cabras, e do outros,
os cabrões das ovelhas, não,
De um lado os cabrões das cabras e do outro a puta
das ovelhas, também não,
E se o limite quando o X tende para mais infinito de
seno de X sobre X? Coitada da cigana, e coitado de mim, miserável de
profissão, analfabeto complexo, iletrado, e ainda por cima
Mordomo da senhora dona Maria Torrão de Azeméis,
senhora distintíssima com porcelanas nas orelhas e proprietária do
Grandioso Cabaré da Escova de Dentes, onde artistas conceituadas e
conceituados voam entre pilares de sémen e papagaios de papel...,
nunca tive medo de tropeçar nos parêntesis rectos, curvos, e
linearmente gosto dos hipercubos, porque são complexos, porque me
recordam madrugadas sem dormir a imaginar como construí-lo sem
recorrer a sofisticados sistemas computacionais, e via-o, e sentia-o,
dentro da minha empobrecida cabeça com migalhas de pão de milho que
a tia Clementina fazia nas férias em Carvalhais, uma delícia
perdida, como tantas outras, como algumas palavras que ficaram na
latrina do quinteiro, ao longe um rato com tracção às quatro patas
subia regaladamente a montanha do sono, e quando chegava à esplanada
das nuvens curvilíneas,
Sentava-se,
Ouviam-se-lhe
O quê?
As faces do hipercubo agachadas no milho húmido das
manhãs despidas de pontuação, de palavras, de literatura e poesia,
e depois de todos morrerem,
O quê?
Ela ainda teve coragem de pegar no megafone e
sibilar
Cabrões que me roubaram os sonhos,
E juro, juro
Vi-os, vi-os nas castanhas bancas de madeira.
(FICÇÃO NÃO REVISTO)
P.S.
Se há quem não gosta do que escrevo, paciência.
Se há quem se incomoda com algumas fotografias que eu publico no meu
mural (que confesso, não é com a intenção de ofender ninguém e
considero-as arte, paciência. E já agora, não obrigo, nunca
obriguei, seja quem for, a ser meu amigo; no Facebook ou na vida
real. E como diz o nosso querido povo... Quem não está bem que se
mude. A porta de entrada é a serventia da casa. (UMA COISA POSSO
GARANTIR; OS DESTAQUES DO MEU BLOGUE CACHIMBO DE ÁGUA, QUASE
DIARIAMENTE NO SAPO ANGOLA, NÃO SÃO, E NUNCA FORAM, POR CUNHA OU
POR PEDIDOS, MAS SIM, E SEMPRE, POR MÉRITO PRÓPRIO). Os amigos que
restarem são certamente os verdadeiros.
(NÃO FICÇÃO)
Galgavas os travessões inclinados do texto, mudavas
de linha, colocavas uma vírgula aqui, outra ali, e mais outra acolá,
e ainda outra
Para aquela senhora de encarnado, com sandálias às
bolinhas e meias de chocolate, e mais um para o senhor do cachimbo
com saudades a cigarros, outra
Tudo, perdi a cabeça, grita a cigana, tudo a um
euro,
Uma para nós, gritam as cabrinhas amestradas...
E nós e nós e nós
Também o desejam, as ovelhas loucas com cristais de
azoto na ponta da língua,
E mesmo assim, ainda sobraram algumas letras, alguns
pontos, e umas tantas vírgulas, porra...
A vida está mesmo difícil; muito difícil.
(FICÇÃO NÃO REVISTO)
Francisco Luís Fontinha