sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

árvore do amor

foto de: A&M ART and Photos

libertem-me
desamarrem-me todas as cordas imaginárias da velha cidade das insónias
dêem-me livros em drageias
palavras injectáveis
folhas de vidro com janelas em papel
libertem-me
digam-me como se habita no sótão da solidão
porque voam os pássaros sobre os teus cabelos
se...
se as palavras injectáveis dormem na tua mão
se...
se as drageias saboreiam os teus lábios de alecrim

(libertem-me
e desamarrem-me...
como fazem aos barcos antes de zarparem)

libertem-me
e deixem-me viver num banco de jardim
diz-me como são os tectos do desejo quando passeias junto ao mar
diz-me como são as gaivotas que poisam no peitoril dos teus seios de melancolia
libertem-me
digam-me
diz-me...
se vale a pena subir à árvore do amor...
… se o amor é apenas uma lareira cansada de arder
como lágrimas
como viver...
como ser o rosto daquela que chora e ama... e morre


(e morre sem sofrer...)



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 21 de Fevereiro de 2014

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Os pobres esqueletos de vento

foto de: A&M ART and Photos

O corpo roda e sofre
morre
evapora-se dentro das graníticas rochas do coração de água
límpida solidão caminha nas mãos da mulher apaixonada
ela vive
ela ama
ela... ela é a própria madrugada
e não sabe que dentro de mim habita uma triste palavra,

O corpo é como um livro disperso no cacimbo
e alicerça-se ao cais dos mendigos envergonhados
ela senta-se no dorso cansado que todas as quintas-feiras submerge na penumbra noite dos pobres esqueletos de vento
morre
ela vive
ela ama
ela... sente o pólen mergulhado no soalho da insónia
e dos lençóis do desejo... ela absorve o sémen do poema acabado de nascer...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 20 de Fevereiro de 2014

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Palavras magoadas

foto de: A&M ART and Photos

Sabíamos que a noite pertencia aos pilares de areia,
tínhamos nos nossos corações pedaços de papel,
algumas palavras incompreendidas,
palavras... palavras tristes, palavras magoadas,
e versos em construção no interior das nossas veias,

Sabíamos que existia o amanhecer,
que éramos só nós os únicos habitantes da cidade da solidão,
sabíamos que o mar nunca, que o mar nunca nos ia pertencer,
e mesmo assim, desconhecendo a madrugada e mesmo assim... sonhávamos,
como cigarros a arder,

Sabíamos que em todas as igrejas do nosso corpo poeirento uma nuvem de lágrimas brincava,
que nas nossas mãos existiam palavras e palavras magoadas,
corríamos como comboios desgovernados de encontro às portas do inferno,
tanto, tanto, tanto... tanto sofrimento no tecto do luar, tanto, tanto calor nos lençóis da esperança,
que um dia descobri que não te amava,

Tínhamos imagens negras suspensas nas paredes de gesso do nosso imaginário,
brincávamos às escondidas,
escrevíamos palavras, palavras magoadas, palavras tristes, palavras nuas das Cinderelas palavras,
palavras entre palavras,
… nas tuas palavras em mim corpo de geada procurando o busto lendário,

Pedaços de papel,
abelhas que desenhavam o céu nos nossos braços picados por... palavras magoadas,
e sonhávamos,
e... e tínhamos nas pálpebras coloridas do incenso os cristais do amor,
e sabíamos e tínhamos... e queríamos fugir para o infinito como duas rectas paralelas em alegre pastel, havia uma tela, uma velha tela... com sabor a mel.

(e a tela da vida arde como ardem os livros de poesia dentro do teu e do meu e deles... corpos de gel perdidos numa esquina de luz)


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 19 de Fevereiro de 2014