quarta-feira, 24 de junho de 2015

Entre poemas e poemas de ninguém


Não tenho pressa de voar nos teus olhos,

Meu amor,

Sei que nas tuas lágrimas existem diamantes invisíveis,

Um silêncio de noite

Cobre a tua pele,

Não tinha tempo para o amor,

Amar,

Ser amado,

Escrever no teu corpo os meus frágeis dedos,

Amo-te,

Amo-te sem perceber porque amo a noite,

Amo-te sem perceber porque hoje é noite,

Construída num quadrado de vidro,

Hoje ouvi os primeiros dos últimos sussurros dos pássaros daquele jardim envenenado,

Não sei, meu amor, escrevo-te sem saber se existes nesta Galáxia de alegria,

Amar,

Ser amado,

Amo-te sem perceber as palavras do teu corpo,

O poema,

A paixão,

A caricia das tuas mãos escondidas num caixote de sonhos,

Os desenhos, também eles te amam,

Meu amor,

Os barcos,

Os livros,

Cobrem a tua pele…

Sentado em ti,

Embrulhado nos teus beijos,

E mesmo assim,

Não quero regressar a uma Lisboa iluminada por Cacilheiros

E soldados de papel,

Ouvíamos os comboios em direcção a Cascais,

Belém brincava nos nossos braços,

E havia sempre uma esplanada para aportarmos,

Éramos âncoras de luz

Olhando as geométricas quadrículas do sexo,

Gemias,

Meu amor,

Entre poemas e poemas de ninguém,

Éramos odiados pelas serpentes dos eléctricos,

E pelos insectos da madrugada,

Fumávamos todos as estrelas,

Ignorávamos todas as pontes

E todos os abutres de aço,

Felizes eles,

E elas,

E eles,

Meu amor,

Fugíamos das noites com cortinados de desejo,

Tínhamos na nossa cama a solidão,

Os barcos de há pouco recordados,

Os acentos acorrentados à maré inseminada pelo pôr-do-sol.

Não o quero,

Meu amor,

Não o quero no meu corpo,

Na minha alma,

E nas minhas raízes…

Só elas conseguem aprisionar-me ao amanhecer,

E só tu consegues libertar-me desta cidade a arder…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 24 de Junho de 2015

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Amanhecer


A paixão do homem

No homem camuflado,

Salto os muros da infância,

Perco-me nas arcadas dos alicerces cinzentos,

Sei que hoje o meu destino,

É saltar,

Voar sobre os fios de seda dos teus lábios,

Tenho beijos na palma da mão,

Sou um clandestino silêncio à procura do amanhecer,

Palpita no meu peito

O cansaço dos sonhos adormecidos num qualquer Oceano,

Aqui,

Não sou ninguém,

Pareço as ruínas de um edifício de ossos,

O pó poisa nos meus ombros em cartolina solitária,

Como um lápis de carvão,

Deitado na eira…

Os dedos enterrados no chocolate teu corpo,

Os comboios imaginários entranhados nas tuas coxas de marfim,

A paixão do homem…

No homem…

O camuflado cinzeiro das noites sem dormir,

No homem,

O homem,

Sempre na esperança de partir…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 22 de Junho de 2015

Era Setembro


(durante uns tempos não escrever; peço desculpa)

 

Não

Não tenhas pressa de partir,

Imagina no teu olhar

As sonâmbulas asas do mar,

A gaivota desesperada,

Triste,

Tão triste que não dá por nada…

Levanto as mãos,

Passo-as no teu cabelo,

Imagino os teus lábios alicerçados à montanha do Adeus,

Desenhos geométricos no teu peito,

Os teus beijos camuflados pela noite da insónia colorida de prata,

E eu aqui…

Sem nada nas mãos,

Falta-me a última palavra,

E de tantas que escrevo,

Não tenho nada,

Torna-se invisível o teu corpo na alvorada,

Pareces um comboio descarrilhado,

Enferrujado,

Sem maquinista nas curvas do Douro amado,

O poço da tua voz sangrento entre iões e protões,

A lâmina do teu cansaço poisada nos meus braços,

Encerro a janela,

Pego num livro de “AL Berto”…

E não vejo o mar a entrar pela janela…

Ausente,

A partida sem destino na cidade dos Cacilheiros,

O amor dos corpos em sofrimento amor,

Eles amam-se…

Eu.. eu amo-os,

Espalho a saliva do pensamento numa avenida sem nome,

O engate em Cais do Sodré,

O vento emagrecido,

Descendo a “Calçada da Ajuda”,

Eu parecia um cigarro em sentido,

Numa parada imaginária,

Um soldado,

Eu,

Imaginem eu um soldado,

Com uma espingarda de sémen

Disparando palavras contra a ponte 25 de Abril,

Era noite,

Ela lindíssima… vestida de luz

E carros em papel,

Deitava-me debaixo das estrelas,

Escrevia o teu rosto nas minhas lágrimas,

Embriagada cidade das águas sem nome,

Queria ser uma guilhotina,

Uma pistola em chocolate,

Comia a guilhotina…

E oferecia-te o chocolate,

Brincávamos,

Brincávamos entrelaçando as mãos na luz aérea do silêncio,

Emagreço,

Sonho com as tuas fotografias,

Acredito nos caixotes em madeira amarrotados no convés de um paquete,

Era Setembro,

Lembro-me do cheiro das videiras

E das ruas sem transeuntes,

Ouvia o suor das manhãs clandestinas,

O dia,

Anoite,

E o medo…

O medo que tenhas pressa em partir.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 22 de Junho de 2015

domingo, 21 de junho de 2015

Incógnita de uma equação sem solução


Tenho medo de me sentar na esplanada

Junto ao mar,

Tenho medo de me apaixonar,

Pelo mar,

Pela madrugada vestida de mar,

Tenho medo dos sorrisos

E do luar,

Da noite,

Do dia vestido de noite,

Medo,

Medo de caminhar sobre as ervas daninhas e belas,

Medo das ervas menos belas,

E das estrelas

Em forma de velas,

Os barcos cruzam-se nas minhas veias,

Não têm marinheiros,

Mulheres a bordo,

Imagens de cadáveres espelhados

Na sombra da tarde,

Preparo-me,

Sem saber do que tenho medo,

Mas tenho medo do teu olhar…

Vestido de saudade.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 21 de Junho de 2015

São horas de matar o mar...


São horas de a cidade adormecer nos teus castrados lábios,

São momentos de esquecer

Os veleiros embriagados,

Sós no Tejo envenenado,

Sós no Tejo… desesperado,

São horas de te amar

Sabendo que és uma equação sem solução,

Um círculo de luz…

Desce a noite,

E

E esconde-se num qualquer coração de areia,

Entra na veia,

A saudade,

O silêncio desmedido depois de acordar,

São horas,

São horas de matar

O mar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 21 de Junho de 2015