terça-feira, 14 de agosto de 2012


Estrelas sem coração

Este meu destino
de sobriamente abandonado pelas aves das trevas
quando do relógio das pálpebras
emergem as candeias e
e deus desce pelas escadas de cartão
e o meu corpo transforma-se em vento ensanguentado
entre papeis
e mulheres de porcelana

amores risíveis
mas não
ou então

das ruas miseráveis da plenitude madrugada
um homem sem cabeça
apaixonadamente ama
ama verdadeiramente o quê?
Se o céu é de fogo
e da terra
oiço as frestas cansadas das estrelas sem coração
o amor?

E da terra
se o céu é de fogo
ama verdadeiramente o quê?
o amor?

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

As noites sem paixão

O amor
é uma coisa defecada
numa esplanada
junto ao rio,

sem palavras
entre coisas loucas
e poucas loiças coisas apaixonadas

sem cabeça
as flores do amor defecado

as malditas flores
dos coisos
coisos amores loucos
poucos em ti
as noites sem paixão

O amor
é uma coisa defecada
numa esplanada
junto ao rio,

(um rio que nunca foi rio
numa cidade com prédios de plasticina
e amêndoas doces
um rio construído na amargura
sem barcos
nome
ou um simples número de polícia
um barco sem braços e sem pernas devorado pelos livros da aldeia em ruínas
sem cabeça
as flores do amor defecado
poucos em ti
as noites sem paixão)

só existe uma forma de ser feliz;
voar como os pássaros
e ser louco como os poetas
e ser livre
livre dentro da noite
como todos os travestis invisíveis da cidade.
http://cachimbodeagua.blogs.sapo.ao

Nuvens de vidro


Uma nuvem de vidro
em lábios amores
à procura de palavras
e tenras flores

uma nuvem sem sentido
de vidro cansado e triste
às palavras sem sorriso
na maré que resiste

uma nuvem de vidro
à janela da madrugada
em lábios amores
amores de nada.

domingo, 12 de agosto de 2012

Eternamente belas as flores de papel

Eternamente belas
as flores de papel
que pintei no tecto do bairro (Madame Berman, Luanda)
entre as mangueiras solitárias
e o triciclo de madeira
suspenso nas frestas da saudade
e todas as noites regresso
e do portão de entrada
oiço as garças em silêncio no estuário do Tejo
e os barcos de xisto em desassossego para me encontrarem
e não percebem que morri
porque desisti das flores de papel

desisti do tecto do céu
e das esquinas onde me sento na cidade sem nome

desisti das portas invisíveis
onde todas as noites
construo milhares de flores de papel

desisti dos cigarros
e das garrafas de vodka
e vivo numa seara de livros
velho
entre quatro paredes em ruínas
nas crateras dos quintais do bairro sem sossego
das noites de abelhas sem desejo
nas clarabóias da insónia...