sábado, 20 de novembro de 2021

O amor é um verso

 

Se me imagino sentado nas tuas coxas de incenso?

Imagino-o enquanto as palavras envenenadas pelo desejo,

Quando se suicida a tarde junto ao mar,

E oiço o silêncio de um beijo,

Um beijo de amar.

Pode ser também um beijo de beijar,

Pois no meu jardim,

Junto a mim,

Habitam flores em delírio,

Flores com sombra de Luar.

Se me imagino?

Imagino-me sentado

Nas sílabas imbecis do poema escrito por mim,

Quando na minha mão,

Números e equações de miséria,

Acreditam que as palavras de uma canção,

A minha canção,

São apenas nadas, artéria

Ensanguentada dentro desta cidade,

Dentro deste cubo de vidro martelado.

Sinto-me prisioneiro às árvores da madrugada,

Árvores habitadas por pássaros que infelizmente, não sabem nada,

Não sabem que as pedras amam outras pedras,

Que outras pedras podem amar as flores,

E estas, amar outras flores,

E outras flores, amarem outras manhãs,

Manhãs que amam outras noites,

Noites que amam as pedras:

Poemas meus, que não amam,

Desenhos que me amam,

E,

Palavras que me odeiam.

Que todos amam a Lua e o Luar,

Que a Lua não ama nada,

Ninguém,

Nem ao primeiro astronauta que lá poisou,

As flores também amam a Lua e o Luar,

Os pássaros amam a noite,

Porque dormem e sonham,

Porque o amor é um verso,

Um poema enorme,

Que vive junto ao mar.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 20/11/2021

terça-feira, 16 de novembro de 2021

Equação das paixões

 

Sentimos e sentamo-nos

Sobre a equação das paixões.

Percebemos que depois de uma equação morrer,

Tal como as palavras do poema,

Apenas permanece a sombra,

E a saudade.

Da saudade,

Tenho saudade,

Do poema, das palavras do poema,

Odeio-os,

Como odeio os pássaros no Inverno,

Que podiam estar recolhidos, junto à lareira e,

Voam estupidamente junto às árvores.

Dos rios,

Tenho a saudade do vento junto à ponte pedonal,

Quando eu criança,

Brincava com um papagaio em papel;

A minha mãe,

Desenhava e construía papagaios em papel,

Que voavam sobre uma Luanda longínqua,

Sombria hoje,

Sombria, para mim, ontem.

O poema posso assassinar diariamente,

Quanto à saudade,

Essa,

É impossível de assassinar.

Na equação das paixões,

Pareço um sonâmbulo quando brinca

Com uma nuvem adormecida,

Que o professor,

Por falta de tempo,

Esqueceu na ardósia da manhã.

Quanto à saudade,

Essa,

Nunca se esquece,

Nunca se apaga na memória do poema;

Dorme, às vezes,

Revolta-se, outras vezes,

Mas é impossível de apagar,

Assassinar,

Ou mesmo ela,

Se suicidar contra a janela do silêncio.

A saudade, tenho-a,

Muitas.

A saudade é uma roda dentada,

Que nunca se esquece do mar.

E no mar,

Vive a saudade.

E no mar,

Habitam todos os poemas de ninguém.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

ESTiG, Bragança, 16/11/2021

sábado, 13 de novembro de 2021

Os sonhos sonhados

 

São montanhas e vales

Despidos de palavras de escrever,

São rosas, são árvores e pássaros,

São poemas a correr,

São água a ferver,

São rochas a brincar

Nas ribeiras a saltar,

São palavras,

São palavras de amar.

São luar

Nas planícies em solidão,

São carros desgovernados,

São carros em contramão,

Na contramão dos sonhos sonhados.

São as brincadeiras ao nascer do sol

Quando acorda a madrugada,

São rosas, são árvores,

São canção…

São tudo e não são nada.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 13/11/2021