domingo, 17 de fevereiro de 2019

Infância


Se eu soubesse que os teus olhos eram de chocolate, comia-os, como comia as mangas na minha infância,

Se eu soubesse que o teu cabelo era o mar da minha infância, acariciava-o, como acariciava as estrelas na madrugada,

Se eu soubesse, meu amor, que os teus lábios fossem de amêndoa, beijava-os, como beijava a tempestade na minha infância…

Mas nada sei, se és comestível, desenhável ou papel pergaminho onde escrever este poema…

Se eu soubesse que a tua boca fosse o pôr-do-sol de Luanda, levava-a comigo para as montanhas do sono…

Ficava por lá, adormecia nos teus braços… e comia-os, como comia na minha infância todos os sonhos da noite.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 17/02/2019

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019


(…)

 

 

A Poesia,

E eu igual ao espelho que vive no meu quarto e me acompanha nas manhãs de Primavera,

O teu corpo sempre igual, escultura abstracta da caligrafia envenenada pelo sexo embainhado nas canções de viver,

A Poesia...!

Morreu,

E o poeta...

Partíamos sem regresso, ouvia dos pulmões do paquete a respiração ofegante, a cidade desembrulhava-se do silêncio do mar como um rebuçado acabado de atracar ao cais da infância, só tínhamos um caixote com algumas recordações, retractos, poucos, e roupas...

E o poeta?

Trapos, restos de ossos, nas mãos o cansaço das sombras da aldeia acabada de se esconder dentro da eira granítica da solidão,

Partíamos...

Sem regresso, inventava a “mulher clitóris” e percebia que os Mão Morta pertenciam ao meu futuro, e que um dia

O Poeta?

Morreu, e que um dia mataria as horas e os minutos...

 

 

(…)

 

Francisco Luís Fontinha