domingo, 11 de janeiro de 2015

Acorrentado

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Habito este cubículo de areia doirada
sem porta
sem janelas
sem jardim nem palavras
habito este cubículo iluminado pelo sofrimento
a cidade lá fora fervilha
e vomita pedaços de vento
… e melancolia
lágrimas de papel
encaixotadas num círculo com olhos verdes
lápides escondidas nas sombreadas avenidas
dos poemas envenenados pelos seios da saudade
a liberdade
habita
neste cubículo sem poesia
sem... sem noite
sem dia
habito
e vivo
acorrentado aos braços de um marinheiro faminto
descendo calçadas
subindo montanhas de algodão
habito neste cubículo de solidão
e desenho nas paredes do meu quarto...
o meu rosto envelhecido
e espelhos negros
sem corpo
sem coração.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 11 de Janeiro de 2015


Corpos de Luz


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Esse teu corpo de luz
algures no espaço da solidão
ouvindo as lágrimas sem nome
que anoitecem na minha mão
esse teu corpo de vulcão
descendo a montanha do vento
depois... alicerça-se nas árvores negras da tua boca
sílabas estonteantes
e loucas
na ardósia tarde da melancolia
a eira em ferida
o trigo em chamas
salivadas pelo silêncio das palavras
e das vergonhosas gaivotas sem asas
esse teu corpo de luz
dançando na alvorada meus lábios
demoradamente sós...
perdidas
esquecidas
mortas...
como todos os corpos de luz
como todas as palavras...
murmuradas
… e amadas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 11 de Janeiro de 2015

Equações sem nexo


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


O sangue comenda o amor
um mecanismo complexo
matrizes
equações sem nexo
integrais
equações trigonométricas
em solidariedade com a geometria das coxas em silêncio
dentro das tuas cuecas...


Francisco Luís Fontinha
Domingo, 11 de Janeiro de 2015