domingo, 14 de julho de 2013

Sítios com sabor a ardósia da tarde

foto de: A&M ART and Photos

Um pouco de silêncio não faz mal a ninguém, segredavas-me quando nos sentávamos sobre a pedra de xisto junto ao rio, e ficávamos, apenas sós, e olhávamos um para o outro, inventávamos desenhos, porque são mais belos que as palavras, e assim, apenas nós, permanecíamos um em frente ao outro, de olhos verdes para olhos castanhos, sem palavras, sem cortinados de fumo, sem geometria descritiva, que às vezes, poucas, utilizávamos para transformarmos a solidão em pedacinhos de insónia, e lá vinha o eterno abraço... caía a noite sobre o teu doirado corpo, percebia-se pelos teus seios os socalcos íngremes descendo a montanha... até que os carris em aço entranhavam-se-te nas mãos tristes, tuas, ao longe, ouvíamos um sonolento comboio com rota para o Porto..., e adormecíamos como duas crianças no colo da inocência, não percebi que chorasses, e sabia que a tua tristeza era real, estava viva dentro de ti, eras como uma seara de trigo suspensa no vento vindo do mar, um pouco de silêncio, não, a ninguém como éramos espelhos côncavos dos jardins de Belém, ouvíamos o assobio do rio em todos os finais de tarde, hoje, o mesmo silêncio, o mesmo decalque do último final de tarde, o cheiro do teu corpo que sobejou e permanece intacto nos arbustos perto do rio, e recordamos os sítios com sabor a ardósia da tarde, a nossa tarde
Choviam-nos sílabas recheadas com marinheiros embriagados, dizias que amavas todos os peixes, percebi por não ser eu um peixe... que não me amavas,
Tu és diferente,
Porquê, perguntava-te,
Respondias-me que adormecíamos como duas crianças no colo da inocência, não percebi que chorasses, e sabia que a tua tristeza era real, estava viva dentro de ti, eras como uma seara de trigo suspensa no vento vindo do mar, um pouco de silêncio, não, e corações enublados avançavam pelas trincheiras do desejo, gemias quando lias os poemas de AL Berto, como se estivesses a ser penetrada por um vulcão de pétalas pintadas de encarnado,
Eu que era diferente,
Porquê?
AL Berto, sorria-nos enquanto inventávamos posições sobre o colchão manchado de tinta permanente de uma velha caneta de sexo,
Havia em nós,
O quê?
Havia em nós sítios de areias brancas, palmeiras, ao longe, machimbombos rosnavam quando o avô Domingos com um cordel os puxava pelas ruas, depois chegava a casa, cansado, abraçava-me e tombava sobre a cama, como um sonâmbulo depois de passear-se pelos rochosos sexos de sal que era cuspido pelo mar do Mussulo até que uma criança, ele, em pequenas rotações, cambaleava e experimentava o estado de embriaguez de algumas plantas, flores, pedras...
Que às vezes, poucas, utilizávamos para transformarmos a solidão em pedacinhos de insónia, e lá vinha o eterno abraço... caía a noite sobre o teu doirado corpo, percebia-se pelos teus seios os socalcos íngremes descendo a montanha... até que os carris em aço entranhavam-se-te nas mãos tristes, tuas, ao longe, ouvíamos um sonolento comboio com rota para o Porto..., e adormecíamos nos braços da tarde, éramos loucos, diziam-nos..., loucos porque amávamos os corpos nus que dormiam dentro dce nós,
Porquê?
O quê? Gemias quando lias os poemas de AL Berto, como se estivesses a ser penetrada por um vulcão de pétalas pintadas de encarnado,
Eu que era diferente,
Porquê?

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Fui crescendo

foto de: A&M ART and Photos

Fui crescendo como uma erva daninha
percorri oceanos invisíveis com bonecos de pedra
fui ouvindo vozes misturadas com débeis amanheceres
em lábios de gaivotas cansadas
fui crescendo
fui habitando o teu corpo de espuma
que dorme num cubo de vidro
fui teu
fui dele
fui...
vou sem regressar voando sobre os teus cabelos de amêndoa...
fui crescendo até que o amor me aprisionou aos teus abraços de água salgada,

Fui mendigo dormindo na calçada
fui poeta sem escrever
leitor
carcereiro onde havia livros em prisão perpétua...

Fui poeta
leitor desgovernado debaixo dos plátanos emagrecidos
fui banco de jardim onde te sentaste
e beijaste
a mim
crescendo,

Fui habitante do teu coração
onde brincávamos com as palavras das marés de Sábado à noite
fui crescendo
crescendo...
sem escrever no teu corpo versos de cacimbo
entre o som dos mabecos e os pobres telhados de zinco...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha