sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

A voz melódica da manhã

 

(Dois mil e quinze, foi uma merda; dois mil de dezanove, foi uma merda e, dois mil e vinte, contra tudo e todos, foi maravilhoso).

 

A alvorada voz da manhã,

Quando a terra se encosta ao Douro e, descansa.

Descansa a alma,

Descansa a mão inanimada da esperança,

Descansa o menino,

Descansa,

Descansa a criança.

Descansa o raio que o parta,

Quando subo à montanha e,

Uma fotografia, que descansa,

Descansa a vida malvada.

Ai, menino,

As suas mãos são de oiro,

São castanhas, são cinzentas manhãs em Paris,

Descansa,

Descansa corpo santo,

À voz de quem o diz.

São palavras,

São desenhos,

Descansa mão do artista…

Descansa, descansa mundo,

Na voz melódica da manhã,

Que descansa sem se ver,

Descansam as palavras,

Descansam todos os versos;

Descansa sua beleza,

Nos cadernos de escrever.

 

 

Francisco Luís Fontinha, 01/01/2021

quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

O beijo é uma fotografia

 

Uma casa cansada despede-se da saudade.

Todas as portas e,

Todas as janelas,

Dormem docemente na umbria da tarde.

O beijo louco das árvores,

Quando o louco amor,

Desce a calçada,

Quando a boca, da casa, beija a tarde em despedida.

E essa mesma casa,

Cansada,

Dorme docemente na tua mão.

Sabes, amor? Todas as flores do teu jardim e,

Todas as árvores do teu jardim,

Alimentam-me quando o sono desaparece na alvorada,

Uma pomba, voa entre pedaços de papel,

Até à claridade do dia,

Uma casa,

O amor da casa pelo pobre jardineiro,

Uma carta escrita entre parênteses e,

Fica sempre aquém um simples ponto final.

O rio foge das suas margens,

Os peixes agradecem todos os rochedos que encontram,

Todos os dias,

Ao meio-dia.

O café encerrado,

A esplanada entre pontas de cigarro e,

Lâmpadas de néon…

Tristes, como a aldeia dos chocolates.

Sabes, amor?

O beijo é uma fotografia,

Como a casa,

Cansada da saudade.

 

 

Francisco Luís Fontinha, Alijó 31/12/2020