domingo, 14 de junho de 2020

A rocha envenenada


Sou uma rocha,

Que dispensa o sono,

Plantam-se rosas no seu sorriso,

Gritam-se silêncios de revolta,

Entre paredes amarelas e sem juízo,

Sentado no trono,

Correndo pela seara,

Sem ninguém à volta,

Sem ninguém no terreno,

Sou uma rocha,

Aquela palavra proibida,

Suspensa no livro sereno.

Sou tudo aquilo que possam imaginar,

Desde pedra a foguetão,

Desde verso a palavra envenenada,

Desde o mar,

À triste canção.

Sou.

Muros de xisto olhando o rio,

Cansaço,

O frio,

Sou socalco maltratado,

Corpo,

Ferro,

Enxada calcinada na sombra do Senhor,

Sou. Sou pedra.

Palavra desejada.

Enxada,

Veneno da madrugada,

Sou rocha,

Sou tudo,

Não sou nada.

 

 

Francisco Luís Fontinha

14/06/2020

sábado, 30 de maio de 2020

A terra


A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é ula lágrima,

Nos lábios do mar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é silencio,

Que não se cansa de trabalhar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é amor,

É desejo no ar,

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é a cidade,

A cidade do madrugar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

Ai terra meu amor,

Amor de amar.

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra são palavras,

Palavras de falar,

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra na madrugada,

A terra do Luar,

A terra gira e volta a girar,

Corre, corre, sem parar,

A terra é ula lágrima,

Nos lábios do mar.







Francisco Luís Fontinha

Alijó, 30-05-2020

sexta-feira, 22 de maio de 2020

A sanzala do adeus

Os poemas da morte,
Palavras tristes no nevoeiro da manhã,
Cancelas à sorte,
Abertas, campestres sentimentos de partir,
Regressar sem regresso,
Fugir,
Cansaço premeditado que apenas os livros vivem,
Palavras,
Ditados,
Nos poisos sonolentos das montanhas.
As flores negras que a tarde come,
Que alimenta o silêncio da sombra,
Tem nos olhos uma lágrima de vidro,
Quando se levanta sobre o capim,
A sanzala do adeus.
Uma finíssima porta de luz,
Uma janela pincelada pelo desejo,
Um nome escrito na sombra,
Que incendeia a noite.
A melancolia,
Com fome de matar,
Uma enxada carregada sobre os ombros,
A terra, húmida vaidade,
Nas flores dos rochedos cinzentos.
Vive na sanzala do adeus,
O menino dos calções invisíveis,
Livros, papel cansado de sonhar,
Nos lábios de uma laranja.
Salto, grito, deito-me na água do rio,
Morro e, levo comigo a mensagem,
Trazem-me a toalha da poesia,
Porque neste caminhar,
Não caminho,
Apenas durmo,
Ou sonho que dormia.



Francisco Luís Fontinha
Alijó, 22-05-2020