sexta-feira, 24 de abril de 2015

O corredor


Solidifica-se o corredor da esperança

Sinto as vergastadas palavras

Do sofrimento

Alimento-me de poemas

Meu amor

(meu amor inventado)

Vê tu

Poemas

Sei que todas as tempestades

Morrem

Como o amor

Solidifica-se o corredor

Sento-me

E durmo

Não sonho meu amor

Imagino transeuntes brincando na areia

Folheando peles cintilantes

E namorados invulgares

Tanto sofrimento

Meu amor

Perceber que a vida

É a vida

Um segundo apenas

No teu relógio

A madrugada sobressai nas límpidas telas dos beijos encarnados

Imaginava-te penumbra como a noite

Com asas

E voavas…

O infinito adeus

Quando tu

Sentado

Me abraças

Gosto de ti

Gosto de ti como se fosses o meu preferido livro de infância

Aquele com desenhos de estanho

As curvas

Uma pulseira nos teus lábios

O marfim

A morfina andorinha pregada ao teu texto

Escrevo com odor

Sem pensar

Que tu

Meu amor

És inventada

Inventada

Uma boneca de sorrisos

Um cortinado em linho

Suspendido

Crucificado ao amanhecer

Existes

Meu amor?

Porque são desertas as ruas da nossa cidade

Do nosso bairro

Da nossa infância

Os primeiros beijos desenhados num velho Castanheiro

As castanhas entranhavam-se nos teus seios minúsculos

A morte

Meu amor

És inventada

Uma carta nunca escrita

Secreta

Anónima…

… Amo-te

Meu amor…

Adormecida cancela da escuridão

Sei que tu…

Partirás para o Inverno

Não importam os teus álbuns fotográficos

Porque

Meu amor…

Perdi a paciência para te amar

Meu querido

Como é o sofrimento?

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 24 de Abril de 2015

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Barcos de espuma


Estou cansado da esperança

Deixei de acreditar no sorriso fictício da madrugada

Sinto o teu sofrer

No meu sofrimento

De te perder

De não conseguir achar-te

Nas ruas desertas da minha cidade

Estou triste

Meu querido

Sofreres

E eu

Impávido

Escrevendo palavras

Inventando amores

Para esquecer a tua dor

Desenhando flores…

Flores… meu querido

Que vão alimentar a tua lápide

Não tenho coragem de desiludir-te

Invento estórias

Para adormeceres

E acreditares que existe madrugada

E que amanhã estarás vivo

Mas percebo o quanto é difícil

Mentir-te

Escrevo-te

Meu querido

Sabendo que amanhã é outro dia

Sem endereço no calendário

O oculto desejo de caminhares sobre os rochedos da insónia

Sabes que não aguento mais este sofrimento inválido

Nos cigarros fumados num jardim com odor a morte

Nunca tive sorte

Nem vontade de lutar

Sou fraco

Meu querido

Choro em silêncio

E pareço uma estátua em granito

Finjo

E minto-te

Mas não acredito

Deixei de acreditar

Quando vejo a tua vida

Escoar-se numa conduta sem saída

Às vezes

Sinto as tuas mãos nas minhas mãos

Víamos os barcos no porto de Luanda

E hoje

Não Luanda

E hoje

Não barcos

Estou cansado da esperança

E das esquinas sombrias da melancolia

Estou cansado do meu corpo envolto de abelhas

E do pólen envenenado pelas madrugadas de sofrer

Não me ouves

Meu querido

O dia deixou de pertencer aos Luares nocturnos dos visitantes sem nome

Nunca me esqueço

Dos sonhos alicerçados nos teus cabelos

Caducos

Inexistentes

E hoje

Percebi a tua agonia

Nas vagas de espuma do silêncio

Que o mar engole em cada amanhecer…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 22 de Abril de 2015

terça-feira, 21 de abril de 2015

Conversas


Nossas palavras

Voando nas linhas curvilíneas do abismo

Sabes meu amor?

Sinto-me sem esperança

Vontade de acreditar

Não

Meu amor

Deixei de acreditar

Sinto-me um afluente

Em busca do silêncio

Sinto-me a montanha

Acorrentada ao amanhecer

Sou uma árvore caduca

Sem saber o verdadeiro preço da paixão

Não

A paixão não se vende

Transacciona

Ou colecciona

Não é facturada

Com IVA

Sem IVA

A paixão se sente

Quando acorda o dia

Visto as calças do avesso

Troco a camisa pelo pijama

E durmo

Sabendo que nos teus lábios

Habitam narcisos

Orquídeas

E sombras

A paixão é como a tempestade

Liberta-se do corpo

Voa

Voa nos finíssimos fios da saudade

Não penso

Nas tuas palavras indigestas

Traiçoeiras

Circunferências de tristeza

Que apenas o teu corpo conhece

Ama

E sente

Todas as noites

Tinham inventado as cartas de amor

Desenhavas tão mal

Meu amor

Os corações pareciam rochas embriagadas

E as setinhas…

Uma serpente venenosa

Enrolada

Nos Sábados sem nada fazer

Sabes

Meu amor

Não existe amor nenhum

Invento-te para esquecer a solidão

E as noites em frente ao espelho

A… a pedir perdão

Perdão porque errei

Sempre erro

Sempre

É o meu destino

Amar

As folhas de papel pinceladas pelos teus cabelos

Escrever no teu perfume

“Esqueci-te”

Nem os teus ossos

Existem dentro dos nossos livros

Folheio-os em buca da tua sombra

Uma personagem minha

“A Silvina”

Que por acaso era a minha avó…

Meu filho

Um dia

“Esqueci-te”

Nem os teus ossos

Nem os teus carinhos

Nada

Meu amor

Nada voando nas campestres avenidas do sexo

Hoje

Hoje sinto-me “o maior filho da puta do mundo”

Um dia

Sem ti

Meu amor

E repentinamente

Escrevo meu amor

E no computador aparece…

Mar…

Coisa estranha

Meu amor

Já devia estar embrulhado em mim

E não

Eu aqui a escrever parvoíces

O amor

Como se eu fosse Doutorado em “O Amor”

Nada

Doutorado não sou

Licenciado sou quase

Mas tu

Meu amor

És a poesia vibrante das tendas de circo

O sexo na ardósia do sexo

Dois homens beijam-se

Meu amor

Como o Tejo se beija

A cada regresso

Olhei-te

Corrias de livro na mão

E eu

Eu tive a sorte de encontrar uma das personagens

Não

Não era a minha avó

Era a “Deusa das Crenças Perdidas”

Ouvir-te sem sentido

Nenhum

Esta triste noite

Sinto-me triste

Meu amor

Esta semana

Parece um túnel sem fim

Nada

Não aconteceu nada

Mas…

Mas adivinho qualquer coisa

Ou o regresso de um grande amor…

… Ou a partida de um grande amado…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 21 de Abril de 2015