sexta-feira, 13 de março de 2015

Nascia, afogava-se nos soluços da madrugada, lá fora, as palmeira da Baía, os barcos abraçados às cancelas da solidão,
Pai?
Filho?
Solidão, nascia, em cada minuto de esperança as cinco cintilações da estátua de sombra, o sal, o pôr-do-sol perdido na claridade inventada por Miguel
Narcisos enganchados no desassossego, literalmente
Filho?
E Miguel imaginava barcos na parede do quarto, alguns risco, palavras desconexas, mortas, assassinadas pela loucura,
Filho?
Solidão, pai...
O que é?
Pois, filho, olha um vez li um texto onde uma mulher era amada por três poetas e um pintor, o pintor esquecia-se da flor, e a tela sempre vazia, branca, dia
Solidão, pai...
Dia da Poesia Nacional, 14 de Janeiro, homenagem a AL Berto e aos seus sonhos,
(Telegrama)
Odeia-me, eu sei pai,
Mas... a solidão, a morte, o camuflado desejo de Morrer
Miguel?
Sim, pai... quero,
O dia mais “fodido” da minha vida,
à tua morte... e das abelhas decalcadas no xisto, a pele da beleza...



(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 13 de Março de 2015

Bilhete na alvorada


No trajecto da insónia
um ponto embrulhado nas coordenadas do silêncio
percebe-se pelo movimento lento
que a parábola incendeia o pequeno quadrado
lá dentro o medo
viver ele
enquanto desenho na ardósia tarde
o significado das imagens nocturnas do prazer
o corpo é um pesadelo sem porto onde aportar
viver ele
no mar
e cansa-se do rasurado veneno que o vento semeou

a carta regressa
endereço insuficiente
ausente
talvez morto
talvez contente...
no mar
o luar pincelado de andorinhas marés
e ele
sempre ele
viver ele
e cansa-se
não o devia fazer

fugir
sem...
sem deixar um bilhete sobre a secretária
ou
ou apenas um traço no espelho embaciado da casa de banho
eu percebia
ausentou-se
foi-se
nunca mais voltará aos livros...
nunca mais acordarão as vozes das sílabas embriagadas
nos sonhos
da alvorada.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 13 de Março de 2015