domingo, 13 de maio de 2012

o menino francisquinho

e zás
caiu o tecto da miséria
sobre a horta da saudade
e traz
o sangue na artéria
e vem de longe a felicidade

e zás
e traz

alimentos biológicos
pimentos
ventos
tomates analógicos
TV digital
e zás
e traz
um bebé prematuro
e traz
e zás
o menino francisquinho
coitadinho
poisado no quintal
barrigudo
pançudo
vem de longe a felicidade

e zás
e traz

a côdea na algibeira
o sangue na artéria
vai para longe a ribeira
e leva a miséria

freguês...
e zás
e traz

vai uma voltinha?
Duas por uma
não custa nada
burguês
dá cá uma notinha
(de cinco, de dez ou de vinte)
ai freguês...
e zás
e traz
o som na espingarda e PUMBA
o sémen de aço
no peito do pedinte

o coração estilhaçado
e o palhaço sem braço
sem pernas nem cansaço
caiu o tecto da miséria
o sangue na artéria

sobre a horta da saudade
um tomate ficou danificado
e um pimento
coitado
como o menino francisquinho
deitado
no ninho
ao vento
sem alimento
sem pensamento
em sofrimento
à espera que cesse a tempestade

Mulher de armas

prescindir

Podia prescindir
de viver com livros e literatura
de escrever
ler
mas não fumar cigarros
é como fingir
semear orgasmos
no meio da rua

os livros o medo todos os sonhos

travestis
putas
homens honestos
ruas em cidades
aldeias sem ruas
prédios sem janelas
e luas
nuas
sem portas de entrada
jardins floridos
fodidos
a literatura
os livros
o medo
todos os sonhos
na sepultura

sábado, 12 de maio de 2012

Vi o vento partir

vi o vento partir
da esplanada na tarde de Agosto
fingi sorrir
sorrir sem gosto,

vi barcos atracados nos muros da insónia
cabeças sem estrelas
línguas afiadas às paredes do inferno,

vi crianças sem pão
sem pátria sem memória
vi o vento partir,
ouvi o silêncio de uma nação
com história
a resistir,

a mentir,

(Vi o vento partir
da esplanada na tarde de Agosto
fingi sorrir
sorrir sem gosto),

a fugir
o povo mastigado
cansado
o povo a fingir
sossegado
a mentir
vi soldados
de punho cerrado
antes de acordar a alvorada
gargantas cortadas em pedaços
sem braços
a madrugada.

cansaços de amar

Os olhos
gotículas pétala flor
em cansaços de amar
nos olhos
o perfume de uma flor
quando a noite se suicida no mar

sexta-feira, 11 de maio de 2012

e é tão triste o inverno

Olho-te sem me olhar
nas paredes do inferno,

olho-te em sonhos de sonhar
quando os lençóis do mar
em beijos amar
adormecem sem acordar,

olho-te sem me olhar
nas paredes do inferno,

e é tão triste o inverno...