segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Inverno das madrugadas em geada

foto de: A&M ART and Photos

Sou um pássaro sem gaiola de aço
um rio sem pontes
sou um barco sem leme sem velas sem vento...
sou uma árvore dentro dos finos abraços
escondido nos montes
saboreando o sofrimento,

Sou uma nuvem envergonhada
correndo os corredores da dor
sou uma rua esquecida na cidade
sou uma sombra desenhada
do jardim em flor...
sou... sou um homem construído pela saudade,

Sou um pássaro sem poiso um pássaro fingindo amar
sou um esqueleto invisível caminhando junto aos rochedos do amor
sou... um pássaro conversando com pequenos livros de porcelana
sou uma janela virada para o mar
esperando a morte vestida com cor
esquecendo a vida em noite escura que a toda a hora me proclama,

Sou o Inverno das madrugadas em geada
o patamar dos vadios pés revestidos a azulejo
sou um pássaro voando nos sonhos inventados
uma ribeira gelada
sou... sou um pássaro em desejo
comendo corações apaixonados.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 24 de Fevereiro de 2014

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Uma rua dentro de ti, meu amor.

foto de: A&M ART and Photos

Há uma rua dentro de ti, meu amor, que sente o medo da solidão,
há nos teus cabelos de folha caduca nuvens de maré adormecida,
veias em combustão,
transeuntes insignificantes com mãos de porcelana,
rios, mares, e barcos de aço apodrecido,
há uma rua dentro de ti, meu amor,
deserta, húmida... uma rua sem nome, idade, como uma criança que brinca,
como um pedestal que espera pelo meu corpo de silêncio,
há palavras de ti, meu amor, palavras com fotografia para a montanha,
o medo,
o medo que em ti se entranha,
e te absorve,

submerges-te nas cavernas dos prisioneiros marinheiros embriagados,
há uma rua dentro de ti, meu amor, uma rua esquecida na madrugada,
uma rua sem maldade,
como tu, como eu... duas ruas de costas voltadas para o luar,

há uma rua dentro de ti, meu amor, com ranhuras, com palheiros recheados de desejo,
corpos misturados em pedaços de papel,
há em ti o beijo,
uma carícia disfarçada de amanhecer,
há uma rua, meu amor, uma rua que não dorme, uma rua que tem lágrimas, uma rua nua, deserta, uma rua revestida de pedra,
há uma rua, meu amor, uma rua como os teus olhos sem cor,
como as tuas pálpebras em flor,
há em ti, meu amor, a paixão, o inferno, a tristeza... e há em ti o poema em construção,
as palavras mortas, as palavras perdidas no rio dos arbustos empalhados,
há uma rua, meu amor, uma rua com homens falhados, como eu, como eu...
um homem falhado filho da rua, como eu... como eu, um homem em forma de rua,
mas... quem, mas quem és tu, meu amor? Existes? Vives e choras? Sofres?... como eu, como eu...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 23 de Fevereiro de 2014

Do dia... suicidado

foto de: A&M ART and Photos

O dia termina inventando sonhos para a noite que se avizinha
o livro de poesia fecha-se dentro da gaveta do armário
o dia já era
foi
partiu... partiu sem saber o significado da palavra AMOR
não sabe que a saudade habita no edifício da insónia
um triste quinto andar sem janelas
mas... mas pelo olfacto dir-te-ei que temos perto de nós o mar
e as marés de Inverno
e as amarras do inferno...
dentro do dia terminado
do dia... suicidado.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 23 de Fevereiro de 2014