quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Chocolates

 

Se me ofereceres chocolates

Eu ofereço-te um livro de poesia.

Se me ofereceres chocolates

Eu ofereço-te o luar embrulhado em rosas encarnadas.

 

Se me ofereceres chocolates

Eu ofereço-te o dia

E alegres madrugadas.

 

31/01/2024

Mentira

 

Minto

Quando te minto

Quando escrevo que não te amo loucamente.

 

Minto

Quando te minto

Quando escrevo que não te desejo loucamente.

 

Minto

Quando te minto

Quando minto fingindo que não te escrevo,

 

Te escrevendo.

Minto

Quando te minto

Quando escrevo que o teu cabelo não é o vento,

Te mentindo.

 

 

31/01/2024

Procurar

 

Procuro na madrugada

Os teus olhos de mar,

E se eu não os encontrar

Vou continuar a procurar,

Até que seja noite cerrada.

 

Procuro no luar

Os teus lábios de mel,

Que me inspiram a deixar neste papel

Os medos do senhor coronel,

Antes de o sol acordar.

 

 

Procuro na Primavera

As tuas mãos de afagar,

Quando a lua cresce, quando a lua é amar,

Quando a lua é procurar…

Dentro desta esfera.

 

 

31/01/2024

Poema

 


Se os teus lábios fossem uma laranja

Se os teus lábios fossem um poema

Se os teus lábios fossem a manhã

Se os teus lábios fossem um pedacinho de mel…

 

Eu queria ser,

O poeta dos teus lábios,

O teu poeta.

 

31/01/2024

terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Fingimento

 

Finjo que te ignoro

Finjo que és uma pedra

Ou um pau

Finjo que és qualquer coisa

 

Finjo que és uma sombra

Ou uma janela encerrada

Finjo que não és a lua

… Finjo que não és nada

 

Finjo que és uma parede

Uma parede com um crucifixo pendurado

Finjo que te ignoro

Fingindo não estar apaixonado

 

30/01/2024

Estrela-do-mar

 

Ficas tão linda

Quando entrelaças o teu cabelo nas lágrimas solares do amanhecer,

E os teus olhos são uma estrela-do-mar.

 

30/01/2024

Diamante

 

O teu corpo roda circularmente

Dança debaixo da manhã ao acordar

Parece a lua ou uma estrela brilhante

Parece o sol ou o luar

 

O teu corpo se ergue o teu corpo parece uma flor

Roda circularmente

Às vezes roda com dor

Às vezes parece um diamante

 

30/01/2024

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Tua


 

Tua

Deslumbrante rio

Do Ujo se vê a tua mão

A brincar com um fio

Quando a lua

É uma canção

 

Quando a lua é um pavio

Sobre o silêncio azeite

Tua

Deslumbrante rio

Tão branco como o leite

E tão belo como uma árvore em cio

 

 

29/01/2024


Melodias

 

São tão poucas

As alegrias

São tantas as bocas

São tanas as melodias

 

São tão poucas

As alegrias

São tantas loucas

São tantas as poesias

 

São tão poucas

As alegrias

São tantas as moucas

Que até provocam alergias

 

 

29/01/2024


 

A manhã

 

A manhã que vem

Que daqui a pouco vai

Uma pedra que cai

Na cabeça de alguém.

 

A manhã que vem

A manhã que se suicidou no amanhecer

É a manhã a quem posso escrever

Porque não tenho mais ninguém.

 

A manhã que é minha

Quando a manhã parece adormecer

Na vida que não tinha,

 

Da vida que nunca quis ter.

A manhã de ser

Na manhã de sofrer,

 

A manhã que vem

Na manhã de perceber

Que a manhã é sempre viver.

 

 

29/01/2024

Maresia

 

O café estava amargo

O cigarro sabe a estonteante maresia

O carro aos soluços

O meu corpo

Pendurado por uma corda

 

A minha cabeça

Estoira de silêncio

O mar que tenho nas mãos

Partiu durante a noite…

E estou só

 

O café estava uma merda

O cigarro sabe a incenso

A noite foi de completa insónia

Estou só

Completamente só

 

29/01/2024

domingo, 28 de janeiro de 2024

Ciúme

 

És a espada que escreve no meu peito o ciúme

Que se crava como uma sombra

Que é vento que é lume

E que às vezes não é nada

 

És a espada, és a conversa sobre o mar

Que me leva e me volta a trazer

És a espada do ciúme amar

Que não se cansa de escrever

 

És a espada, o alegre silenciar

És a madrugada, livre quando se veste de flor

És a espada sem luar

És a espada sobre o meu peito em dor

 

 

28/01/2024

Dá-me a tua mão

 

Dá-me a tua mão, nunca esqueças as palavras que te escrevi

Dá-me a tua mão

Até que a lua se despeça de tudo aquilo que sofri

Até que a lua não seja mais solidão.

 

Dá-me a tua mão, e sinto que a madrugada

Foi ver a nascente do rio

Subiu a montanha, ficou cansada

E sobre o azeite, o pavio

 

Que ilumina a casa. Pareço um pequeno pássaro sem voar

Pareço uma pedra suspensa nos teus lábios de mel

Ou uma serpente que quer devorar

 

A casa. Dá-me a tua mão, ilumina a sanzala

Dá-me a tua mão e escreve nesta folha de papel

O segredo desta bala.

 

 

28/01/2024

Pedra de sentar

 

Pedra de sentar, pedra no erguer

Pedra de atirar

Na pedra de ter

 

Pedra de sentar, pedra na insónia madrugada

Pedra do mar

Da pedra atirada

 

Pedra de sentar, pedra que não se cansa de sorrir…

Na pedra de atirar

Quando o sono vai partir

 

Pedra de sentar, pedra de amanhecer

Pedra ao levantar

Na pedra de ser.

 

 

28/01/2024

O menino

 

Vai a estrada sem destino, regressa à seara

O menino

Do trigo ao centeio

Na chuva miudinha

Com esplanadas viradas para o sol

 

Tão certinho

O menino

Ó razão de caminhar

Agarra-te à vida

Ao menino

Menino do mar

 

Vai a estrada sem destino, está na estrada

Um sorriso pequenino

Na maré que vem da madrugada

O café e a torrada

A lareira e o feiticeiro

Vai na estrada o menino

Vem da estrada a ribeira

E ao longe o engenheiro

 

O poeta sem palavras, vem da estrada o menino

Vai na estrada um barco de brincar

Ouve-se na estrada o sino

Que não se cansa de tocar

 

Vai a estrada sem destino, está na lua o menino

Há um buraco negro na estrada

Tão negro como o carvão

Tão puro como a água cristalina

Vai na estrada o menino, está na estrada a menina

Vai a estrada sem destino, está na estrada a tua mão

 

 

 

28/01/2024

Os teus olhos

 

Os teus olhos são as sanzalas da minha infância, são as palavras que se escondiam no silêncio capim,

Da minha infância.

 

Os teus olhos são os latidos dos mabecos, são a chuva que queimava a terra,

Na tarde que se despedia, e trazia

A noite.

 

Os teus olhos são o perfume da tua sombra, entre os parêntesis libertinos do sono, uma onda se abraça à lua, quando em ti, brinca uma estrela-do-mar.

 

Tão distante, a ausência

O lume,

Tão distante a distancia

O mar

Tão pequeno o sorriso da abelha

Tão pouco doce

O mel

A colmeia.

 

Tão lúcidos os teus olhos

Na página deste livro que se ergue sob o luar,

Triste maré nos teus olhos,

Pedindo paz,

Pedindo um abraço…

 

Os teus olhos são o cansaço.

 

 

28/01/2024

Terra prometida

 

As bocas em dia por fome

No livro que em despedida

Escreve na terra um nome

Escreve na terra prometida

 

E o dia por prometer

Uma mão ensanguentada

Sem saber se pode escrever

Nos olhos de sua amada

 

O poema é canção

É a palavra ao acordar

Quando o coração

 

É uma estrada envergonhada

O poema é filho do mar

E tem como mãe a madrugada

 

 

28/01/2024

sábado, 27 de janeiro de 2024

Arte

 

A arte de ser

Quando a arte é ter

É viver

Quando a arte é vencer

E escrever

Sem ter medo de ser

Arte

Sem ter medo de o ser

 

 

27/01/2024

Café

 

Esta neblina

Que nos abraça e contempla

O dia é um pequeno suspiro

Um café mal dormido

Um cigarro maldisposto

Na boca do mendigo

 

Esta neblina

Cacimbo da infância

Fogueira em teu olhar

E que o dia seja a paisagem junto ao mar

E seja poesia

E seja amar

 

O dia

Esta neblina que nos prende à lareira

Que traz livros e poemas e alegria

Que o amor esteja nos nossos corações

Que os pássaros sejam a melodia

Da neblina que nos abraça

 

 

27/01/2024

sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Tarde

 

A tarde, despe-se

Aos poucos, regressa a noite

Meia envergonhada

Ensonada

Ainda,

 

Senta-se junto à lareira

Puxa de um cigarro

Abre um livro

E lê,

 

Lê e escreve

Que a noite já se instalou

Que traz o vento

Para afugentar a neblina

E que amanhã é sábado,

 

Que as lágrimas agora são estrelas

Que os cortinados das janelas são coloridos

Quando eram panos pretos,

 

Que a noite é um jardim de desejo

Com flores

Com árvores e pássaros…

E às vezes, a chuva veste-se de sol,

 

E a tarde, já foi

Deixou de o ser

Mesmo assim,

A tarde é sempre um poema

Uma lareira nos teus lábios.

 

 

26/01/2024

O mar dos teus olhos

 

Pergunto ao mar dos teus olhos

Se os barcos do poema

São de papel,

 

Pergunto aos teus olhos

Se os barcos do poema

São pigmentos de mel,

 

Se o mar dos teus olhos

São apenas poemas

O que faz no mar dos teus olhos

A sombra de um pincel,

 

Pergunto ao mar dos teus olhos

Se o dia é uma flor…

Os teus olhos respondem-me que não…

E escrevem na minha mão

Que o dia é poesia

E às vezes é dor.

 

 

26/01/2024

quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Falso poeta

 


Tenho escrito muito, mãe

Tenho lido muito, muito mesmo, aproximadamente oitocentas páginas por semana

Reconheço que é dispendioso

Ao preço a que está o combustível

É uma alta média

Olha

Tu é que estás bem

Nem te apercebes de como está o custo de vida

Um exagero

 

Tenho escrito muito, mãe

Tenho corrido com os falsos amigos

Leio muito, mãe

 

Não, mãe

Não estou só

Agora tenho outra família

E amam-me

 

Mas tenho escrito muito, mãe

E lido muito, mãe

Sim, mãe

Os falsos amigos

As falsas palavras

As falsas janelas

E os falsos mares

 

E já agora, os falsos poetas

Como eu, mãe

Como eu

 

Tenho escrito muito, mãe

Estou quase a terminar o Prima Contradição de Júlio Pomar

Já tinha lido umas coisas dele

E gosto muito

 

Tenho escrito muito, mãe

Tenho pincelado os lábios da Cristina com estrelas de papel

Quase, mãe

Quase como os papagaios que me construías

Em luanda

Só que os teus papagaios voavam

E as minhas estrelas

São sonhos

Sonhos, mãe

 

Tenho escrito muito, mãe

Como chocolates como a piquena do poema A Tabacaria

Do senhor Álvaro de Campos

E fumado muito, mãe

Como o Esteves da Tabacaria

 

Tenho lido muito, mãe

Tenho escrito muito, mãe

E enquanto leio

A lareira abraça-me na neblina cacimbo da saudade

Sim, mãe

O cacimbo sobre um penhasco

 O velho à procura dos cigarros

O avô Domingos a puxar os machimbombos pelas ruas de Luanda

E eu

Leio

E escrevo

 

E o senhor Álvaro de Campos

Fuma

E vai à janela

 

 

25/01/2024

Ribeira

 


Trazes-me as palavras de escrever

Trazes-me os versos de desenhar

Trazes-me a vontade de ser

Um braço de mar.

 

Trazes-me o peixe de olhar

Trazes-me o vento

Trazes-me o luar

Quando a noite é um tormento.

 

Trazes-me o viver

Quando o trigo poisa na eira

Trazes-me o amanhecer

E o nome desta ribeira.

 

Trazes-me a fome

Trazes-me o dia

Escondes o meu nome

E o meu corpo na poesia.

 

 

25/01/2024


Abraço

 

Aos amigos (as)

 

Fumo enquanto escrevo

Não tenho por hábito fumar

Enquanto escrevo

Mas às vezes,

Faço-o.

 

Não consigo escrever

Nas noites de luar

Mas vezes,

Faço-o.

Desenhar enquanto fumo enquanto escrevo enquanto o faço.

 

Não fumar.

Fumo enquanto escrevo

E escrevo enquanto o faço

Fumar,

Fumar um abraço.

 

 

25/01/2024