foto de: A&M ART and Photos
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O comboio sonolento deserta e foge dos carris
lençóis de água que embrulham as mãos das locomotivas
embriagadas, algumas tombadas como crianças depois de descer a
tempestade sobre os telhados de vidro que cobrem os cobertores da
inocência,
Farto-me de mim, farto-me deles, delas, farto-me das
palavras e dos pequenos grandes voos de areia sobre as árvores
invisíveis,
Farto-me do silêncio disfarçado de sofrimento,
farto-me deste (sofrimento) quando se veste de insónia e rompe noite
adentro, deita-se sobre mim, como se eu fosse um corpo prostituto,
camuflado, como se eu fosse uma personagem sem nome, idade
desconhecida, uma personagem sofrida, comestível, comiam-me se eu
deixasse..., e os palhaços de porcelana sombreados na janela das
estações com paragem obrigatória, bebíamos vodka pensando que
eram melódicas palavras abraçadas a poéticos lábios de sémen,
O comestível comboio com rodas de algodão...
Nascia o poema, o amor, a paixão, nascia o corpo, o
teu corpo vagão carruagem correndo léguas de searas com espantalhos
vestidos de palheiro solitário, choravas, choravam, gritavam,
gritavas, gemias, gemiam... e acabavam sempre por regressar ao Tejo,
rio acima, comíamos a ponte de aço, fumávamos os cigarros com
sabor a dunas de areia esbranquiçada, alimentávamos-nos de suor e
carícias desenhadas pelas mãos calejadas dos homens e das mulheres
filhas e filhos, dos socalcos, olhando, brincando, sei lá... o rio
que só termina na cidade com pronúncia do norte,
O comestível comboio com rodas de algodão..., e
silêncios de medo,
E
Amanhã não saberás o meu nome, levantar-te-ás,
vais à janela e vais perceber que o rio, o rio sou eu..., eu, e
Lágrimas?
E os barcos, sim, também sou os barcos, de papel,
de esferovite... os barcos em madeira, eu, levantar-te-ás... olharás
os meus olhos
E
(não te conheço)
E lágrimas, e nada, e escuridão dentro das
algibeiras dos anzóis comestíveis... e eu? Eu, eu e lágrimas, e
tréguas, de silêncios, de medos, de janelas encerradas e de
esplanadas como vodka derramada sobre o teu corpo de amêndoa,
Amar-me-ás?
(não te conheço)
Não,
Não sei se...
E
Amanhã não saberás o meu nome, levantar-te-ás,
vais à janela e vais perceber que o rio, o rio sou eu..., eu, e
Lágrimas?
Navegáveis mãos as milhas nos teus seios de
madrugada, cabelos embebidos no vento da paixão, zangado, eu?
Navegáveis mãos, preciosos palheiros guardando as sementes do teu
púbis que o triste pôr-do-sol inventa nas tuas coxas, e
Quem és, tu, mulher de tecido marinho?
E
(não te conheço)
Amar-me-ás? Nunca o saberei..., (como se eu fosse
uma personagem sem nome, idade desconhecida, uma personagem sofrida,
comestível, comiam-me se eu deixasse..., e os palhaços de porcelana
sombreados na janela das estações com paragem obrigatória,
bebíamos vodka pensando que eram melódicas palavras abraçadas a
poéticos lábios de sémen),
E apenas sou um barco, e apenas sou um rio... um rio
sem nome, idade... com paragem obrigatória, bebíamos vodka pensando
que eram melódicas palavras abraçadas a poéticos lábios de sémen,
Amanhã não saberás o meu nome, levantar-te-ás, vais à janela e
vais perceber que o rio, o rio sou eu..., eu, e
Lágrimas?
(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha
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