terça-feira, 2 de julho de 2013

e corações com o marcador encarnado

foto: A&M ART and Photos

Vivíamos não percebendo que das marés de Inverno
habitava em nós o tédio
construíam-se-nos alicerces envenenados por doces lábios de incenso
como Primaveras desenhadas num papel esquecido em ti
eu
de esquadro e régua
tu
deitada sobre o estirador do desejo
delineava-te em curvas com sombras de trapézios
e dos poucos ângulos que sobejavam em ti
davam para alimentar-me quando chovia nos lençóis da espuma infância
e sorrias como os milímetros de noite inertes entre pilares de granito e luzes ancoradas pelo suicídio,

Vou deixar de escrever
(confesso-o apenas a ti)
porque tudo tenho perdido com as palavras
hoje
(confesso-o apenas a ti)
olhei-me no espelho do meu guarda-fato (que te garanto, nada guarda)
e vi os meu olhos em pedaços de lume
como a lareira de Carvalhais
(lembras-te do Inverno?),

Sorrir para quê?
Se todas as minhas fotografias são tristes
inexpressivas e doentes
até parecem (disseram-me um dia)
cadáveres voando sobre os Oceanos onde mergulhavas em busca de cardumes inexistentes
de peixes
e lobos descendo a Serra
aldeias perdidas em ti
como eu
(disseram-me um dia, que as madrugadas não eram todas iguais)
apelidei-te de PARVALHONA e hoje percebo que errei
(peço-te desculpa)
porque nenhuma madrugada consegue ser decalcada no estirador onde habitas
digamos que (onde ainda consigo ver o teu corpo no esquisso),

Abro a janela
(para quase todos eles, já é noite)
para mim (para mim acorda agora o dia)
começam as brincadeiras dos meninos enquanto mães desassossegadas
habitam como tu no estirador semi-nu das estrelas de plátano adormecido,

(confesso-o apenas a ti, tenho fome)
fome daquela que estávamos habituados a saciar
coisa que conseguíamos resolver com dois ou três livros
alguns beijos
e corações com o marcador encarnado
deixando no teu peito uma rosa
um silêncio
sem queixumes
saudades
ou pieguices...
abro a janela
e deixaste de descer a Serra
como os lobos
(quando ouviam a velha máquina de costura Singer),

Hoje
Que dia é hoje, (se posso apelidar-te de amor)?
Não sabes ou não queres responder...
deixei de perceber se é Sábado
Terça-feira
não o sei porque não o desejo saber
(Vivíamos não percebendo que das marés de Inverno
habitava em nós o tédio
construíam-se-nos alicerces envenenados por doces lábios de incenso
como Primaveras desenhadas num papel esquecido em ti
eu
de esquadro e régua
tu
deitada sobre o estirador do desejo)
porque se o soubesse
perceberia o quanto feliz eu era sem as malditas palavras...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

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