Foto de: A&M ART and Photos
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O silêncio, vestido, o silêncio das palavras
mergulhadas nas ínfimas gotículas de insónia, um olhar, uma cena
construída nas cavernas da montanha adormecida, o poema redefine-se,
vive, e parte em direcção ao mar..., os olhos fixam-se na parede
húmida da escuridão, o silêncio absorve a musicalidade de um piano
de cauda, as mãos finas e longas, entrelaçam-se e distribuem-se no
teclado negro com sorrisos brancos, a pianista sorri, e tem nos olhos
a alvorada das notas musicais, a pianista é como um livro na mão do
poeta, manuseada, folheada... e acariciada, a pianista em lágrimas
de desejo, voa sobre o palco inventado com um pequeno banco em
madeira, há aplausos, há beijos nos lábios da pianista, e o poeta
sussurra-lhe ao ouvido
Desejo-te como és, de mãos finas e longas perdidas
nas manhãs de Primavera,
Ao ouvido (Amo-te?) amará o poeta a pianista
misteriosa? Estará o poeta louco? E a pianista... será uma árvore
com olhos verdes? Azuis? Descoloridos? Emagrecidos...
Como? Como serão os olhos da pianista?
Desejo-te (Amo-te) sussurra-lhe o poeta em
duodécimos sons das palavras com sabor a gotículas de suor, o corpo
permanece sentado e o piano, e o piano toca-se e masturba-se nas mãos
da pianista, há um espelho, há pássaros, há...
Mendigos pássaros, loucos, loucos silêncios,
vestidos, os silêncios das palavras mergulhadas em ti, nas ínfimas
gotículas de insónia, não dormes, sonhas? Pensas num corpo sobre o
teu, imune, vagueando como mórbidas Sereias no fundo do mar,
sentindo, tu, entre o piano e o cortinado de fumo, os cigarros
movem-se como carnívoras plantas em vasos de porcelana, desejas o
desejo e tens medo de desejar,
Há,
Há pássaros em ti, voando, brincando, há pássaros
nos teus cabelos de ébano cristalino, a tua boca, a tua doce boca,
silencia-se na minha, permanece imóvel, ausente... e dorme, dorme
como uma criança depois do almoço, da tua doce boca os lábios
peregrinos começando as desvairadas lâmpadas de néon...,
Há
Medo de desejares, medo de amares, há uma janela
com vidros de pólen estacionada junto ao teu piano, ama-lo? Pareces
cansada, triste, desiludida..., como eu, o poeta prisioneiro nas mãos
da pianista, como eu, o poeta estátua, imóvel, nu, tu, numa cama
embrulhada em livros e discos de vinil, uma cama camuflada no
sofrimento da cidade, há
Como mórbidas Sereias no fundo do mar, sentindo,
tu, entre o piano e o cortinado de fumo, os cigarros movem-se como
carnívoras plantas em vasos de porcelana, desejas o desejo e tens
medo de desejar, há em ti de mim... coisas desconhecidas, palavras
não ditas, por escrever, doidas, doidas como os sons que das tuas
mãos vomitam melodias de madrugada menina, vaidosa, alegre, como tu,
menina, menina dos mimos, menina...
Há,
Há pássaros e pianos, há árvores e gaivotas, há
poetas e livros,
Diz-me tu, o que escolherias?
Diz-me tu, como são os teus lábios quando sentes o
invisível desejo do piano vagabundo descer a calçada em direcção
ao rio,
Diz-me, diz-me tu..., menina do piano com graníticas
pautas de oiro...
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
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