segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Poema em cio


Desesperadamente

as minhas palavras

coladas no vidro da morte

em pedacinhos amargos

a boca do poema

em cio

mergulha ele dentro do silêncio

no desejo dos barcos entre as estrelas de papel

e a noite de fingir

assisto ao fim da noite

quando das vaginais madrugadas

ouvem-se os uivos das acácias em flor

 

desesperadamente

as minhas palavras

nos meus pequenos desejos de silêncio amargo

caminhar dentro do mar

antes de acordar o pôr-do-sol

 

dos vidros da morte

as minhas mãos em crustáceos de glicerina

os cogumelos da vaidade em sombras sibilas

e a laranja do amor

aos poemas loucos

as migalhas do aço inoxidável

nos olhos do deus do cio

desesperadamente

 

(desesperadamente

as minhas palavras

coladas no vidro da morte)

 

e a morte vive no meu corpo

desde o dia que acordei poema em cio

e todas as janelas da poesia não tinham visibilidade para o mar

e todos os barcos

e todos os barcos ouviam-se dentro das estrelas de papel...

 

 

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 29 de Agosto de 2016

sábado, 27 de agosto de 2016

prisão


a tempestade cessou

nos meus braços de sonâmbulo, acorrentado

ao cais da saudade

imagino a madrugada adormecida, distante das pálpebras quebradas,

a tempestade cessou

no meu corpo escorregadio pelo suor da solidão,

vejo os tentáculos das palavras,

mortas,

ou quase mortas… em mim, em ti…

os velhos pilares de areia,

sinto a escuridão dos dias

quando tu não estás no meu círculo cinzento

que os barcos transportaram para o longínquo cemitério de pedra,

e antes da tempestade cessar,

antes de acordar em mim o sono,

tínhamos uma cama imaginária

que nos abraçava quando regressava o luar…

os lençóis em linho perfeito,

desenhos bordados pelas tuas mãos,

desenhos desenhados pelo meu olhar…

cansado olhar,

de te ver e ouvir,

quando cessou a tempestade,

e juntos…

e juntos ficamos presos ao mar.

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 27 de Agosto de 2016