Os sonhos são uma (merda) segredava ele aos pincelados pingos de chuva da manhã,
Depois, sentava-se na
primeira sombra que encontrava e…
Esperava que o tempo se
escoasse sobre os ombros.
Do outro lado da rua,
junto à montra onde se passeavam espantalhos e pequenos monstros, um silêncio
de sono veio até ele, olho-o e
Tombou no seu peito.
Das sílabas da carne ao
desejo de fugir foi apenas um espasmo, ergueu-se da pedra onde tinha ficado
esquecido vários dias, porque ao que parece ninguém reclamou a sua falta, e
começou a correr em direcção aos rochedos de onde se podiam ver as primeiras
lágrimas da manhã.
Um sorriso iluminou-o,
Era o sorriso de sua mãe,
Que voava por aquelas
bandas, sem perceber porque razão o filho corria, corria apressadamente para
tais rochedos.
Chegado aos rochedos, recordou
a infância difícil, recordou todas as fotografias que já tinha rasgado e
posteriormente lançado à lareira os pedacinhos que se amontoavam sobre a
secretária, escreveu uma carta sem remetente, que tempos depois, alguém
descobriu no bolso de um velho casaco que tinha ficado esquecido num barco
aportado junto ao cais e em adiantado estado de decomposição,
O corpo morre, apodrece…
Pó, meu querido filho.
Brevemente serás pó.
E como tudo na vida,
apenas pó,
Os sonhos sonhados e os
sonhos não sonhados; poeira sobre um manto de lágrimas à espera do vento,
E quando acorda o vento,
O Santo Sepulcro da
infâmia acorda, senta-se junto à lareira e…
E dizem que ele estava
feliz.
Tão feliz, tão feliz…
Que lançou-se dos
rochedos e há quem acredite que ainda hoje voa sobre os plátanos e as acácias,
Lâminas do cansaço
Procuras-me dentro deste
pequeno cubo em vidro
Onde semeei as primeiras
letras do alfabeto,
Procuras-me junto aos
bares de uma Lisboa desencaixotada,
Triste memória,
Triste e ancorada,
Procuras-me enquanto o
sono
Desce do primeiro
silêncio em luar,
Olhas-me,
Olhas-me e acreditas que
estou vivo,
Mas olha que não,
Que não,
Que não tenho sonhos,
Barcos para brincar,
Procuras-me nas estantes…
Talvez penses que me
escondo dentro de um pequeno grande livro,
De poesia seria o
desejado,
Mas começo a odiar a
poesia,
As palavras,
E o dia…
Os sonhos são uma (merda)
segredava ele aos pincelados pingos de chuva da manhã,
Depois, sentava-se na
primeira sombra que encontrava e…
E o sono eterno
apoderava-se dele,
Como a miséria,
Como a reencarnação do
Diabo travestido de flor;
A mais bela flor do
Universo.
Alijó, 03/03/2023
Francisco Luís Fontinha
(ficção)
Sem comentários:
Enviar um comentário