Melódica a cor das tuas mãos, poética, poética
do silêncio das tuas palavras, e hoje, tudo parece arder na fogueira
da vida, invento-te, hoje, invento-te a partir da poeira insónia da
noite passada, invento-te da música que escorre pelos vidros das
janelas e aqui e ali, acolá, um rosto de porcelana acorda das
lilases bocas que a chuva deixa ficar sobre os telhados de zinco,
Vêm dos poisados cansados versos do teu amor os
primeiros desejos que a noite esconde dentro de um cinzeiro de vidro,
o falso vidro, a falsa palavra, o falso amor, do beijo, falsificados
todos os beijos que o poeta lança sobre a terra agreste dos corpos
húmidos sobre as arestas finíssimas que as ranhuras de um coração
de diamante traça na espuma do mar depois dos sexos se cruzarem nos
infinitos carris paralelos até que a morte os separe, os falsos
lemes das enguias e dos patos bravos, as falsas velas agarrando os
mastros em verdejantes carícias que um cego lança contra os
rochedos e pacientemente aguarda a passagem do vermelho a verde para
atravessar a passadeira sombria das mágoas despenhadas entre os
candeeiros a petróleo e as nuvens de seda morta, as palavras, as
falsas palavras que oiço da tua boca
Que a chuva deixa ficar sobre os telhados de zinco,
Dizias-me que amanhã entrariam de mãos dadas, a
esperança e o acreditar, e os “cabrões” nunca chegaram, e os
“filhos da puta” ignoraram-me, ausentaram-se, fugiram,
escondem-se tomara eu saber onde, que a chuva
Palavras que oiço da tua alegre boca que eu
desenhei nas madrugadas enquanto dormias sem perceberes que nas
minhas mãos de cor melódica ardiam cigarros velozmente como os
carros de corrida numa pista de brincar construída por uma criança,
retirava todos os objectos que viviam na mesa da sala de jantar, de
troço em troço, as curvaturas, as rectas, todo o circuito ia
tomando forma tal como as árvores à medida que vão crescendo,
colocava as pilhas numa caixinha de plástico, e ligava o
interruptor, os carros a principio pareciam ter sono, mas aos poucos
rodopiavam em voltas de caracol até parecerem adultos à procura de
clientes nos jardins de Belém
Vai uma voltinha “filho”?
( )
(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó
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