sábado, 9 de março de 2019

Sábado


Hoje, Sábado, eu, não fiz nada,

Rigorosamente, nada.

Hoje, eu, Sábado, levantei-me às seis e trinta minutos,

Dei a injecção à minha mãe, depois, fumei dois cigarros virgens,

Completamente, virgens,

E, deitei-me.

Dormi.

Tomei banho. Fui tomar café, buscar as compras…, ir ao cemitério,

Hoje, eu, Sábado, não fiz nada,

Rigorosamente nada.

Almocei, tomei café, e voltei a adormecer…

Acordei, lanchei…

E escrevo estas palavras,

Hoje, eu, Sábado, não fiz nada,

Rigorosamente, nada.

Hoje, eu, Sábado, sinto na boca as palavras salgadas, tristes, distantes,

E, rigorosamente, nada.

Hoje, eu, Sábado, não fiz nada.

Os pássaros, os teus pássaros, todos estacionados nas tuas mãos de areia fina,

Branca, como a do Mussulo,

E, regressa a noite.

Pinta-se o dia de tristeza, não me ouve, ele, como sempre,

Rigorosamente, nada.

Nada.

Sábado, eu, hoje, acordei cedo, deitar-me-ei tarde e acordarei cedo,

Amanhã, Domingo, a voz enrouquecida pela tempestade,

E sinto o mar, dentro de casa, só, só, como eu,

Hoje.

Rigorosamente nada.

Ao final da tarde,

As palavras que há pouco experimentei, salgadas, tristes e sós…

Rigorosamente, nada,

Hoje.

Sábado.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 9/03/2019

sexta-feira, 8 de março de 2019


A frieza com que inventas os pássaros do meu jardim, contente por te ver e teres desenhado um sorriso na vidraça do fim de tarde,

Talvez, amanhã, depois de amanhã, eu regresse às tuas mãos de seda,

As árvores,

Porquê, Francisco?

As árvores recheadas de medo, como eu, que partas brevemente, talvez amanhã, eu regresse aos teus lábios de amêndoa doirada, mas hoje, minha filha, hoje, não.

Sabes?

Diz,

Quando nasci, num Domingo de Janeiro, congelaram-me o cérebro e ainda hoje está suspenso nos Céus de Luanda,

Geladinha…

Então rapaz, essa CuCa?

Vai já, patrão, vai já,

A frieza com que inventas palavras que eu escrevo na boca, os alicerces da solidão nas tuas coxas de veleiro em papel, os pincéis despedidos por mim, ontem, o mar estava revoltado, ontem, eu estava revoltado, mas hoje,

Então essa CuCa, rapaz?

Vai já, patrão, vai já…

E, esse fatídico Domingo de Janeiro morreu ao Pôr-do-Sol…

Porquê, Francisco?

As árvores recheadas de medo, como eu.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

08-03-2019

quinta-feira, 7 de março de 2019


Batem à porta. Pelo som melódico, sinto que é a tristeza, hesito, não vou abrir. Betem à porta, sinto o perfume das amendoeiras em flor suspensas no teu cabelo cor de geada, tão fino, tão pouco, e belo…

Amanhã saberei!

O que é a tristeza?

Amanhã saberei o que a noite me quer, disfarçada de tristeza, lá longe, oiço o rio entrelaçado aos socalcos do medo,

O que é a tristeza, mãe?

É o medo, meu filho, é o medo…

 

 

Francisco Luís Fontinha

07/03/2019