domingo, 21 de janeiro de 2018

Jangada de nylon


Os poemas morrem na tristeza do teu olhar.

Como sofre o dia nos teus ombros,

Enquanto lá fora, ainda noite, uma jangada de nylon gagueja em frente ao mar,

As lágrimas no teu rosto,

O silêncio das tuas mãos quando afagam o meu rosto…

Distante maré no meu corpo abalroado nas insignificantes janelas de vidro,

Os tentáculos de seda, todas as coisas impossíveis, nas tuas mãos,

Quando regressa a madrugada.

Choras.

Escreves nos meus braços as palavras invisíveis da tempestade,

Os barcos ancorados aos teus dedos…

E sofres.

E morres de mim.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 21 de Janeiro de 2018

domingo, 14 de janeiro de 2018

Cabeça de xisto


Lívido sacrifício das noites indomáveis,

Os livros da despedida esquecidos no espaço,

Viagem sem regresso,

Habito neste pobre musseque,

Que deambula pela madrugada do meu sono,

Os esqueletos teus no vidro meu,

Uma cabeça de xisto suspensa na alvorada,

E as dores que assolam o teu corpo, e as dores que dormem na tua cabeça…

Despedidas madrugadas sem dormir,

Pensando em ti,

Como uma jangada livremente sobre as nuvens…

Tenho em mim o sono da morte,

E o desejo do abismo,

Os cartazes escondidos no meu quarto,

Caras, rostos desfocados, simplesmente abandonados,

E deixo na tua mão o silêncio do rio,

Que entre montanhas,

Corre nas tuas veias…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 14 de Janeiro de 2018

domingo, 7 de janeiro de 2018

Cartas


Recebo cartas de amigos que não as leio,

Não me apetece ler cartas,

Desgraças,

Ambientes fumegantes nas ruas desertas do meu corpo,

Recebo cartas,

Lembranças,

Livros,

Papéis e velharias,

Cartas,

Cartas de amigos sonolentos,

Recebo cartas de amigos que não as leio,

Esqueletos de prata,

Póstumo o meu nome na tua mão,

As palavras que ardem na lareira,

Como todas as cartas,

Como todos os nomes da minha infância,

Recordações,

Recordações das cartas que recebo…

E não leio…

Não,

Não me apetece ler cartas,

Por favor…

Não me enviem cartas.

Cartas, não.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 7 de Janeiro de 2018