sábado, 14 de abril de 2012

O marinheiro ausente

Pedacinhos de mim
acordam na alvorada

(oiço a voz invisível da tempestade)

as minhas pétalas suspensas no tecto da solidão
quando todos os barcos dormem docente
nos lábios do marinheiro embriagado
no final da tarde
levantam-se as velas de cetim
e todas as luzes do abrigo se encerram como as portas da muralha

o marinheiro ausente
deita-se nas minhas mãos
como uma criança cansada
antes de adormecer

e desce a noite
e eu
e ele
enlouquecemos abraçados à maré


(escrito no Ubuntu)

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Abraço ao mar abraçado

Abraço
Ao mar abraçado
À noite cansada
No meu corpo deitado
Coitado
Eu… à procura da madrugada
Com tudo e sem nada
Finjo adormecer
Invento manhãs no meu jardim
Coitado
Com tudo e sem nada
Triste triste assim-assim…
Viver
Assim-assim
Encostado às árvores dormentes
Que mastigam nuvens de algodão
Sem dentes
Sem coração
Abraço
Sem braço
Ao mar abraçado
À noite cansada
Num barco embriagado
Abraço
Sem braço
Coitado
Com tudo e sem nada
Em círculos na calçada

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Não me conheço

Não me conheço
Debaixo destas árvores cansadas
Olho as pedras miseráveis da calçada
Sem destino a rua das amoreiras
Porque são as gaivotas roseiras
E as flores malvadas
E nas pálpebras um crucifixo adormecido
Não me conheço
E não pareço
Um cadáver apodrecido…
Não me conheço
Debaixo destas árvores cansadas
Coitadas
Parecem gaiatas brincando na seara adormecida
Perdida
Nas madrugadas

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Flores

Há flores que tombam no chão
Resistem à opressão
Flores que saltam os muros da prisão

Flores

Flores concavas e convexas
Com beijos na palma da mão
Flores de todas as cores
Flores de ambos os sexos
De mutos feitios
Flores são flores
Que galgam os montes bravios
Como os amores
Sobre o colchão
Flores
Escondidas em anexos
De prato vazio abraçadas a um cão
Flores que saltam os muros da prisão
Há flores que tombam no chão

E resistem à opressão

Morrer Quer dizer Não saber Viver

O que dizer
O que fazer

(quando a noite deixa de ser noite)

Morrer
Quer dizer
Não saber
Viver

O que dizer
O que fazer

Enquanto o país está a arder…

terça-feira, 10 de abril de 2012

A alegria

Pensava eu que a noite me trazia
Mas o dia
Levou-me a alegria

E o que a vida me deu?

O que a vida me tirou
A alegria
Sabendo eu o que sentia
Quando a noite me trazia
A fantasia
No rio que morreu

(Pensava eu que a noite me trazia
Mas o dia
Levou-me a alegria)

Mas o dia…
Quem diria
Levou-me a alegria

E a noite adormeceu
No rio que morreu
E eu
E eu não sabia.

Wordsong – AL Berto


“Com Worsong, a 101 Noites aventura-se numa nova coleção que pretende criar um diálogo entre a música e a poesia contemporânea.
AL Berto (1948-1997), uma das vozes mais singulares da poesia portuguesa do século XX, foi o poeta homenageado neste primeiro trabalho. Wordsong é um projeto da autoria de três músicos, Pedro d’Orey, Alexandre Cortez e Nuno Grácio, que procuraram criar um invólucro sonoro para os poemas de AL Berto. O resultado é uma série de canções em formato pop rock, onde a música se apropria da palavra escrita, dando-lhe uma outra liberdade cheia de novos sentidos e novas sensações. Wordsong é constituído por dois objetos que se complementam e interligam. Um livro de poemas com fotografias e ilustrações e um CD com quinze canções inéditas” 101 Noites

Excelente trabalho. Na segunda edição que possuo inclui participações de: João Peste, J.P. Simões e Sérgio Costa.
Mais informações em:

Fingertips - 2 Tour


O concerto da semana é em Aveiro dia 13 de Abril no Teatro Aveirense pelas 21:30h.O BANCO ALIMENTAR vai estar connosco a recolher os alimentos do Bilhete Social (7.50€ + 2 pacotes de alimentos). Estes alimentos são distribuídos a uma rede de instituições e famílias carenciadas.
BILHETES À VENDA NO TEATRO AVEIRENSE
Cada portador de um bilhete recebe na porta do espectáculo um voucher de desconto nas lojas Tiffosi no valor de 10€.

Nota: Nesta digressão que se iniciou no dia 2 de Março já apoiámos várias instituições e conhecemos o valioso trabalho por elas desenvolvido ao longo do País.
Hoje o vosso contributo é sinónimo de ajudar quem mais precisa!
O Workshop "Bateria na Ponta dos Dedos com Marito Marques" decorre às 18:00h no Teatro Aveirense e as inscrições estão disponíveis em http://workshop.thefingertips.com
Fingertips - 2 Tour

Março
02- Lisboa | Cinema São Jorge – 21h30
03- Torres Novas | Teatro Vírginia – 21h30
09- Coimbra | Theatrix – 23h00
16- Maia | Forum da Maia – 21h30
17- Portalegre | Centro de Artes e Espectáculos – 21h30
23- Ponta Delgada | Coliseu Micaelense – 21h30
26- Viseu | Teatro Viriato – 21h30
27- Viseu | Teatro Viriato – 21h30
29- Covilhã | Auditório da Universidade da Beira Interior (UBI) – 21h30
30- Loulé | Cineteatro Louletano – 21h30
31- Leiria | Teatro José Lúcio da Silva – 21h30
Abril
06- Guimarães | C.A.E. São Mamede - 21h30
13- Aveiro | Teatro Aveirense - 21h30
26- Mirandela | Auditório Municipal - 21h30
27- Macedo de Cavaleiros | Centro Cultural - 21h30
28- Guarda | TMG - 21h30
30- Porto | Teatro Rivoli - 21h30
Maio
11- Figueira da Foz | Casino da Figueira - 23h00
12- Vila Real | Teatro de Vila Real - 21h30
19- Montijo | Cine-Teatro Joaquim de Almeida - 21h30
24- Évora | Teatro Garcia Resende - 21h30
25- Beja | Pax Julia - 21h30

Lo que hay que decir


Por qué guardo silencio, demasiado tiempo,
sobre lo que es manifiesto y se utilizaba
en juegos de guerra a cuyo final, supervivientes,
solo acabamos como notas a pie de página.
Es el supuesto derecho a un ataque preventivo
el que podría exterminar al pueblo iraní,
subyugado y conducido al júbilo organizado
por un fanfarrón,
porque en su jurisdicción se sospecha
la fabricación de una bomba atómica.
Pero ¿por qué me prohíbo nombrar
a ese otro país en el que
desde hace años —aunque mantenido en secreto—
se dispone de un creciente potencial nuclear,
fuera de control, ya que
es inaccesible a toda inspección?
El silencio general sobre ese hecho,
al que se ha sometido mi propio silencio,
lo siento como gravosa mentira
y coacción que amenaza castigar
en cuanto no se respeta;
“antisemitismo” se llama la condena.
Ahora, sin embargo, porque mi país,
alcanzado y llamado a capítulo una y otra vez
por crímenes muy propios
sin parangón alguno,
de nuevo y de forma rutinaria, aunque
enseguida calificada de reparación,
va a entregar a Israel otro submarino cuya especialidad
es dirigir ojivas aniquiladoras
hacia donde no se ha probado
la existencia de una sola bomba,
aunque se quiera aportar como prueba el temor...
digo lo que hay que decir.
¿Por qué he callado hasta ahora?
Porque creía que mi origen,
marcado por un estigma imborrable,
me prohibía atribuir ese hecho, como evidente,
al país de Israel, al que estoy unido
y quiero seguir estándolo.
¿Por qué solo ahora lo digo,
envejecido y con mi última tinta:
Israel, potencia nuclear, pone en peligro
una paz mundial ya de por sí quebradiza?
Porque hay que decir
lo que mañana podría ser demasiado tarde,
y porque —suficientemente incriminados como alemanes—
podríamos ser cómplices de un crimen
que es previsible, por lo que nuestra parte de culpa
no podría extinguirse
con ninguna de las excusas habituales.
Lo admito: no sigo callando
porque estoy harto
de la hipocresía de Occidente; cabe esperar además
que muchos se liberen del silencio, exijan
al causante de ese peligro visible que renuncie
al uso de la fuerza e insistan también
en que los gobiernos de ambos países permitan
el control permanente y sin trabas
por una instancia internacional
del potencial nuclear israelí
y de las instalaciones nucleares iraníes.
Solo así podremos ayudar a todos, israelíes y palestinos,
más aún, a todos los seres humanos que en esa región
ocupada por la demencia
viven enemistados codo con codo,
odiándose mutuamente,
y en definitiva también ayudarnos.

Gunter Grass

Fonte: EL PAÍS
(Foto – Livros de Francisco Luís Fontinha)