Aos olhos
a paixão pigmentada do cansaço
o murmúrio das palavras
em sexo num vão de escada
gemidos descem do sótão
como crianças embriagadas no berço da tarde
aos olhos
dos olhos
a literatura com chá e torradas
e sumo de laranja
e palavras
e murmúrios
aos olhos
aos olhos
o silêncio da noite
dentro de uma caixa de sapatos
sem janelas
sem gatos
aos olhos
e palavras
e murmúrios
e conversa fiada.
segunda-feira, 30 de abril de 2012
Também sou humano
Também sou humano
tenho pernas e braços
e preciso de comer,
também sou humano
tenho pernas e braços
e preciso de viver,
também sou humano
tenho pernas e braços
e preciso de caminhar,
também sou humano
tenho pernas e braços
e preciso de trabalhar.
tenho pernas e braços
e preciso de comer,
também sou humano
tenho pernas e braços
e preciso de viver,
também sou humano
tenho pernas e braços
e preciso de caminhar,
também sou humano
tenho pernas e braços
e preciso de trabalhar.
domingo, 29 de abril de 2012
Com asas
Um cachimbo com asas
abraçado a uma pomba tricolor
uma fogueira sem brasas
que beija as pétalas de uma flor
um cachimbo com asas
mergulhado no oceano do cansaço
um cachimbo rasca
à rasca
na sombra de um abraço
sem brasas
o cachimbo adormece sobre um livro doente
o cachimbo é eterno e infinitamente mente
com asas
um cachimbo prateado
cansado
moribundo
coitado do “Edmundo” (e não conheço nenhum)
chega a casa e sente
os gemidos do cachimbo doente
que infinitamente mente
que infinitamente com asas
em brasas
os lábios da sua amante
prateado
coitado
coitadinho do cachimbo
no limbo
sem sorte
à espera pacientemente da morte
coitado
deitado
com asas.
abraçado a uma pomba tricolor
uma fogueira sem brasas
que beija as pétalas de uma flor
um cachimbo com asas
mergulhado no oceano do cansaço
um cachimbo rasca
à rasca
na sombra de um abraço
sem brasas
o cachimbo adormece sobre um livro doente
o cachimbo é eterno e infinitamente mente
com asas
um cachimbo prateado
cansado
moribundo
coitado do “Edmundo” (e não conheço nenhum)
chega a casa e sente
os gemidos do cachimbo doente
que infinitamente mente
que infinitamente com asas
em brasas
os lábios da sua amante
prateado
coitado
coitadinho do cachimbo
no limbo
sem sorte
à espera pacientemente da morte
coitado
deitado
com asas.
Vida sofrer
A esta miséria viver
a que chamam de vida sofrer
caminhar numa rua sem saída
a esta miséria viver
quando escrevo um poema sobre o mar
a que chamam de vida sofrer
a que chamam silêncio de amar.
a que chamam de vida sofrer
caminhar numa rua sem saída
a esta miséria viver
quando escrevo um poema sobre o mar
a que chamam de vida sofrer
a que chamam silêncio de amar.
sábado, 28 de abril de 2012
Sem nada
Nas paredes curvilíneas da memória
poiso os meus braços de prata
acaricio pacificamente
os meus lábios de incenso
e as pinceladas do meu rosto
vagueiam livremente no vidro transparente
de linho amanhecer
antes do pequeno-almoço
oiço a tua voz misturada
nas acácias do fim de tarde
oiço-te enquanto me olho nas paredes curvilíneas da memória
sem palavras sem estória
sem nada
poiso os meus braços de prata
acaricio pacificamente
os meus lábios de incenso
e nas pinceladas do meu rosto
acorda a madrugada
cresce uma rua sem saída
suspensa numa cidade imaginária
com muitas portas e janelas
e calçadas
e velhos que se esqueceram de acordar
e fingem orgasmos pulmonares
e constroem a felicidade
num vão de escada
sem nada
com barcos mergulhados
em oceanos testiculares
sem nada
de mão dada
às paredes curvilíneas da memória
os meus braços de prata
pacificamente acariciados
felizes
contentes
tal como os velhinhos
num vão de escada
sem nada...
poiso os meus braços de prata
acaricio pacificamente
os meus lábios de incenso
e as pinceladas do meu rosto
vagueiam livremente no vidro transparente
de linho amanhecer
antes do pequeno-almoço
oiço a tua voz misturada
nas acácias do fim de tarde
oiço-te enquanto me olho nas paredes curvilíneas da memória
sem palavras sem estória
sem nada
poiso os meus braços de prata
acaricio pacificamente
os meus lábios de incenso
e nas pinceladas do meu rosto
acorda a madrugada
cresce uma rua sem saída
suspensa numa cidade imaginária
com muitas portas e janelas
e calçadas
e velhos que se esqueceram de acordar
e fingem orgasmos pulmonares
e constroem a felicidade
num vão de escada
sem nada
com barcos mergulhados
em oceanos testiculares
sem nada
de mão dada
às paredes curvilíneas da memória
os meus braços de prata
pacificamente acariciados
felizes
contentes
tal como os velhinhos
num vão de escada
sem nada...
Havia
Havia sorrisos nos livros que eu lia
havia palavras nos sorrisos
nos livros que eu lia
havia
manhãs em desespero
dias intermináveis
sem sonhos
sem poesia
havia
(um rio que se despedia
nos livros que eu lia)
havia sílabas
e vogais
e jornais
com palavras intermináveis
e desenhos de algodão
e outras coisas mais
havia
(um rio que se despedia
nos livros que eu lia)
e morreu
antes de nascer o dia...
havia palavras nos sorrisos
nos livros que eu lia
havia
manhãs em desespero
dias intermináveis
sem sonhos
sem poesia
havia
(um rio que se despedia
nos livros que eu lia)
havia sílabas
e vogais
e jornais
com palavras intermináveis
e desenhos de algodão
e outras coisas mais
havia
(um rio que se despedia
nos livros que eu lia)
e morreu
antes de nascer o dia...
sexta-feira, 27 de abril de 2012
Oceano testicular
De quem são os silêncios que habitam na minha cabeça, de quem são as árvores que fazem sombra no jardim invisível da tarde, e de quem são os barcos que adormecem no oceano testicular do desejo,
- não chove e lá fora um fio de medo atravessa as mãos silenciosas da noite, o medo, que o dia se transforme infinitamente grande, infinitamente azul, infinitamente ausente, dentro de mim
“o medo morreu em 1974” Alguém suspende numa janela um pedaço de cartão, o medo de ser feliz, o medo de amar livremente as flores, as árvores e as gaivotas,
- dentro de mim ausente a sinfonia do cansaço, sento-me sobre as acácias em flor, e oiço uma voz “ainda ele brincava no oceano testicular e já eu estava preso”, e tantas coisas que brincavam nos oceanos testiculares da insónia e hoje, e hoje o medo atravessa as mãos silenciosas da noite, antes do limite indefinido da memória, antes do circo ter aportado no cais da aldeia e uma trapezista zarolha de mini-saia e avental vermelho a impingir amêndoas e beijos cor de laranja, Não percebo digo-lhe eu, O que é que não percebe pergunta-me ela, não percebo nada de amêndoas e de beijos cor de laranja, Experimente diz-me ela, Não quero experimentar digo-lhe eu,
e eu confesso que tinha medo, tinha medo de entrar na escola e saber que dentro da gaveta da secretária carunchosa adormecia a menina dos três olhinhos, “E foda-se que doía como o caraças e a mão ficava dormente o resto da tarde”, e os meus pais tinham medo e pediam a deus que eu parasse de crescer e ficasse eternamente com oito anos, Maldita Guerra Ouvia-lhes às vezes na solidão da noite,
- e felizmente que eu não parei de crescer e felizmente que a Maldita Guerra terminou, e felizmente que eu deixei de ter medo, e felizmente que o medo morreu em 1974, e felizmente que a sinfonia do cansaço hoje não veio ter comigo, e felizmente
Maldita guerra e enquanto eu me sentava no portão da entrada a contar os carros em direcção ao Grafanil, homens morriam, jovens, muito jovens, morriam, enlouqueciam, e felizmente,
“o medo morreu em 1974”,
- e felizmente que eu cresci e não fui para a guerra, e felizmente que os silêncios que habitam na minha cabeça não têm dono, são da terra de ninguém, e felizmente que a minha terra ficou livre, e felizmente que o mar é de todos e a poesia é de todos, e a terra é de quem a trabalha e o fruto é de quem o colhe, Assim ficou escrito na cartolina sobre a horta embriagada do meu vizinho,
o medo morreu, o medo...
no oceano testicular da insónia.
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