Nunca percebi o que eles queriam, mas nunca mais a
nossa vida pacata foi a mesma, nunca mais tivemos noites com
estrelas, e nunca mais vimos a lua
Com olhos de papel e boca de jasmim quando os
últimos pedaços de tarde sobem a calçada e da Calçada galgam os
muros vestidos de amarelo, pareciam moscardos complexos nas mãos de
homens apaixonados, eles e eles, e elas e elas com eles,
E nunca mais vimos a lua transparente nas paredes
indomáveis dos desejos escondidos
O que quero ser quando for grande?
Gostava de ser uma abelha sem colmeia, ou, ou uma
roda dentada sem veios de aço ou correias transmissíveis, livre,
voando como as nuvens quando o vento as leva para lá da janela do
sótão e das traseiras do velhíssimo edifício de arame as escadas
que levitam como os corpos das almas depois de despregadas dos
telhados de vidro, às vezes, gostava
Dos desejos escondidos nas flores de areia que tu
guardavas nas algibeiras de tecido aos quadradinhos como as grades
das prisões, ou como as calças de um pescador quando saboreia
docemente o seu cachimbo de algodão, e outras vezes
Gostava
Que as árvores carrancudas, sisudas, e de poucas
falas, brincassem comigo, conversassem comigo, e no entanto,
abraço-me a elas, e elas
E outras vezes, gostava, que o jantar fosse uma
pintura numa tela com muitos beijos de acrílico e bocas de pastel e
lábios de chocolate pincelados ao de leve com o bâton vendido pelo
cigano da rua do Alecrim Doirado, gostava, e elas acreditavam que do
céu vinham as notas de vinte euros que eu lhes dava ( )
(texto de ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó