segunda-feira, 20 de abril de 2015

A prisioneira paixão


Sentíamos os alicerces da noite

Nos tormentosos desejos de luz

Que ao acordar

Nos abraçavam

O teu corpo

Era um ponto equidistante

No espaço silencioso

Sentia-te dentro de mim

Como se fosses um intruso vulto

Para me apunhalar

Não morri

Sabes disso

Ouvíamos as marés de granito

Contra os beijos de xisto

Beijar-te… o impossível marinheiro enforcado nos teus seios

Eras uma estátua de vidro

Que dançava em Cais do Sodré


Tu eu e ele

O triângulo da vaidade

Sobre a clarabóia dos desnudos corpos

Nossos

O eléctrico avançava

Éramos prisioneiros

Eu de ti

Tu de mim

E ele

Ele dele

À janela

As quatro paredes da infância

Fotografadas pelas nossas línguas

Entrelaçávamos os dedos de arame fino

E nunca soubeste o meu nome

Repartias a tua cama

Com o meu cadáver de veludo

Enferrujado

Sentias o peso da areia nos teus ombros

E descias o poço da saudade

A nossa cidade

Um perfume envenenado

Pela paixão das palavras

E nem tive tempo de perguntar-te

Se…

Se me amavas

Ou se a noite nos pertencia

Ou... ou nós é que pertencíamos à noite

Devagar

Beijava-te enquanto dormiam os nossos relógios

Que alimentava a nossa pele

Uma parede de insónia

Separava os nossos corpos

Luanda entrava na tua vagina

E tínhamos a Baía só para nós

As palmeiras

E os tristes rostos de alumínio

Esperando o regresso da tarde

Tinha medo de ti

Meu amor

Tinha medo do caderno onde escrevo

E via o meu corpo franzino

Soluçar nos teus braços

E hoje

Vejo o meu corpo de cinza

Soluçar nas tuas lágrimas de prata…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 20 de Abril de 2015

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