foto: A&M ART and Photos
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Sob o tecto da tua vaidade, porque te mata esse odor
a rosas de argamassa recheada com melodias de pássaros, os melros da
manhã quando se despedem e assobiam publicamente como cartazes de
vozes inseguras e medrosas, abaixo, dizem eles, as árvores
apodrecidas e com sabor a riqueza, obviamente estamos a falar dos
morcegos que em plena noite visitam os cadáveres vivos que em casas
de cartão esperam pela chegada do sangue, milimetricamente,
ouvem-se-lhes o tilintar de dentes e queixadas cobertas de aço e
trabalhadas como o rebelde marfim, estátuas, palhaços, veados e os
malditos pássaros, são as manhãs de um desempregado
(publicamente demito-me das funções de
desempregado, o drogado e o embriagado, o doente e o senhor lá ao
fundo da sala – Eu? - sim, o senhor que se queixa do dente superior
esquerdo, terceiro andar, número vinte e três, da rua dos arrozais,
vivos, comem os pardais e a liberdade como antes de existirem a
insónia e a solidão, tínhamos as drageias de pedra com pequenas
rugas de sabor a limão, perfume havia em ti como os relógios do
pulso do senhor – Eu? - sim, o senhor, o deleitado senhor das
orelhas moucas, dos olhos ensanguentados e brilhante, como faróis
nocturnos depois de partir a tempestade)
São as manhãs de um coitado,
(das orelhas em flor, com a boca entreaberta,
persianas descaídas um pouca à direita, e finíssimos pontos de luz
entravam e sentavam-se na cadeira junto ao esófago, e chegar ao
estômago era um instante quase mínimo, e quando lhe perguntávamos
– O senhor fuma? - respondia-nos que não, - Não senhor, senhor
doutor! - e continuava que já tinha fumado toda a “merda” que
havia para fumar... mas devidos às circunstâncias – Quais
circunstâncias, senhor António? - não responde, o arguido
recusa-se a responder, e assim ia andando o dia até chegar o
cortinado da noite, e a linda e bela Joana – E peço desculpa...
mas tinha de encontrar um nome! - e a linda e bela Joana carregava no
interruptor dos sonhos, e uma máquina poisada sobre a cristaleira
começa a vomitar sons melódicos, e conseguia misturar sons musicais
com palavras travestidos de poema...)
A Querida Rainha,
Oiço-os dentro da máquina com feições de caixa e
qualquer coisa com perfume a Planeta 3, e encostas a cabeça ao
cadeirão e quando me apercebo, não estás entre mim, algures
voaste, como as poucas palavras que trocaste comigo, Rainha, minha
Eterna Rainha,
(meu amado senhor)
Que dizeis vós do meu destino?
(amar, desamado, não amando, abandonado, sonhando,
não sonhado, amar, amar os veleiros com rosa purpura no peito das
esquinas da cidade do sofrimento, lento, minto, quando de dentro, do
corpo, o alimento, e o fermento das raízes que seguram os edifícios
à terra laminada, fatiada, como o queijo e a marmelada, sem o
sossego do vento, invento coisas, coisas e coisas que tu, que eu,
nunca soubemos quem eram. és, tu, sou eu, e não encontro as
palavras certas para te definir, nunca percebi se era uma equação
matemática, nunca percebi se eras um poema ou um texto, ou ambos,
ambas, disfarçados e disfarçadas, de Primavera, sonâmbulas manhãs
sem madrugada, amar, desamado, empregado,desempregado, filho, filha,
enteado, e no entanto, estou aqui, agora, sentado...)
“Sob o tecto da tua vaidade, porque te mata esse
odor a rosas de argamassa recheada com melodias de pássaros, os
melros da manhã quando se despedem e assobiam publicamente como
cartazes de vozes inseguras e medrosas, abaixo, dizem eles, as
árvores apodrecidas e com sabor a riqueza, obviamente estamos a
falar dos morcegos que em plena noite visitam os cadáveres vivos que
em casas de cartão esperam pela chegada do sangue, milimetricamente”
- Olá, eu sou a Joana! - e mesmo não sabendo, desconhecendo,
dizendo, digo-o, o prazer é todo meu, Menina Joana, que como já
tive a oportunidade de salientar..., precisava de um nome, uma
morada, uma rua e de um número, se possível, par, e tive o azar de
escolher um número ímpar, envelhecido, e um nome que de lindo ser,
ninguém conheço com esse apelido, digamos, tenho intimidade
suficiente para dizer e escrever que
(sinto muito, Minha adorada Rainha – Não, não
conheço ninguém que se apelide de Joana – e quando me perco nas
ruas, pergunto-me na passagem pelas coisas e objectos estranhos –
Proibida a entrada a pessoas estranhas ao serviço... - e não
entrei, e recusei-me a admitir que existia uma íntima probabilidade
de a primeira mulher com quem me cruzava na rua se chamar Joana)
Que aqui o Zé ninguém, não conhece, nunca
conheceu, nenhuma Joana – E é tudo? - SIM, MINHA ADORADA RAINHA, É
TUDO.
(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
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